quinta-feira em júpiter – todos
os dias da semana tem a sua energia. o seu misticismo. o seu legado histórico.
e até as suas lendas – no calendário romano a quinta-feira pertence a júpiter. com
a sua preponderância positiva nos negócios. na fortuna. na bem-aventurança. e
na felicidade – mas para mim. o que dou como certo. já que com o astro nunca vi
fortuna. é que depois de uma quarta-feira. aparece sempre a quinta-feira. e
depois da quinta-feira chegamos sempre a uma sexta-feira – é esta regularidade
dos dias da semana que me deixa aturdido. os cristais dos ouvidos baralham-se. fico
tonto e em desequilíbrio. brutalizo-me. e pergunto: porque não posso eu
escolher o dia em que quero viver. digo melhor. ou resistir à morte – bem sei
que não posso mudar este ritmo caquético dos dias da semana. só me resta aceitar
esta inevitabilidade babilónica. romanizada – enquanto não chega a sexta-feira interrogo-me:
qual o melhor dia da semana para morrer? e qual a melhor idade? pensei logo nos
cem anos. um número redondo. bonito. com cem anos podemos morrer em qualquer
dia da semana. encaixamos sempre bem. o pessoal já está farto de nos mudar a
fralda e a algália – já ontem era tarde – na igreja o luto é feito de
conformismo. e ouve-se dizer: tinha que ir um dia – ninguém fica cá para
semente – sorte já teve ele. viveu até a junta da colaça do coração partir a
meio – o fígado mais parecia um mata-borrão. já não distinguia água do vinho –
os rins… uns passadores. cheios de calcário – e os pulmões… rangiam como portas
desengonçadas – o que tinha de bom era a dentadura. era nova. e como já não conseguia roer carne
vermelha. está impecável. bem a podem por no OLX – a outra alternativa é morrer
novo. e acredito que o melhor dia seja ao domingo. está todo mundo sem fazer
nada. na sorna. podem-se espantar durante mais tempo: sabes quem morreu? sabes?
o desgraçado bateu a caçoleta. foi na sua vez – coitadinho. esticou o pernil –
sabes quem já está a fazer tijolo? nem vais acreditar em quem foi para o
caralho. que neste acaso não é ninguém que tenha ido para a pequena cesta no
alto dos mastros – e aí. percebemos que o luto é mesmo dorido e carregado de um
negro absoluto. com a igreja mergulhada em palmas e raminhos de despedida. lavada
em lágrimas. pesarosos. doridos. alguns arrasados com a tragédia dizem:
coitado. ainda tinha tanto para dar ao mundo. deixa a mulher tão nova. o que
vale é que os filhos já se governam – ele não tinha bom feitio. mas era filho
de deus – quando mordia era um pitbull. raios – tinha o coração na boca. não
ficava nada por dizer – não era mau homem. tinha-se que saber lidar com ele – mas
como ainda estou vivo. o que vos digo. é que mais vale morrer à procura de
glória. do que morrer em piedade – mas que se lixe. saibam todos que a minha
morte será anunciada no dia em que deixar de escrever. e para sossego dos
amigos. já que com os inimigos não conto. aviso já que não haverá funeral nem
missa do sétimo dia – em boa verdade vos digo. vale muito mais um defunto rico
e com saúde. do que um defunto pobrezinho e doente – e com esta máxima me
despeço até que o óbito se confirme
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