.................................................................................não tirem o vento às gaivotas

07/11/2017

aflição com o verbo perder






bem howe





não olheis vós para o que faço mas sim para o que sarrabisco – o que enxergais em mim é uma ilusão para me despegar do que escrevo – com a chegada da noite amarro-me aos sonhos e vagueio pelas madrugadas tal-qualmente um cigarro se incinera: brasa instável. cor impulsiva. rolante. metodicamente vagaroso a contrair para o fim da combustão – e assim. em contagem decrescente. me vou diluindo em cada pedaço de fumo que sobe ao céu – perco-me. perco-me na noite pelo que penso e também me perco quando me recuso a pensar – perco-me. perco-me na noite em sonhos e também me perco quando me recuso a divagar – perco-me. perco-me na noite dentro de mim e também me perco quando não estou em mim – um homem perdido só está bem aonde não pode estar – a insustentável leveza do meu ser claudicou. quebrou. faleceu com o corpo ainda a reclamar mais vida – e o fumo proibido a chegar à casa dos deuses como chegam os balões das romarias. perdidos. sem rumo. num vento incerto. sem tino e em desatino – e a enormidade do que sou a deixar de o ser numa terra em apartheid – segreguei-me – devagar devagarinho subo às bem-aventuranças. como se fosse o último fumo. como se fosse vento. como se fosse catraio e me quisesse perder num paraíso iluminado por uma luz arrependida do fundo da gaveta – por isso te digo: perde-te com um laço. aperta-o à volta do inferno e faz-te passado – perde-te de raiva e cospe para o chão que nunca te deu de comer – perde-te de coragem e amarra a ponta da corda à barbatana de um tubarão e deixa-te cair no fundo das palavras – absolve-te num parêntesis e não deixes que um ponto interrogação te faça [re]acreditar –  morre mesmo pois já não tens mais tempo para te [re]perder –  perde-te antes que percas a vontade de escrever




Sem comentários:

Enviar um comentário