bem howe
não olheis vós para o que
faço mas sim para o que sarrabisco – o que enxergais em mim é uma ilusão para
me despegar do que escrevo – com a chegada da noite amarro-me aos sonhos e
vagueio pelas madrugadas tal-qualmente um cigarro se incinera: brasa instável.
cor impulsiva. rolante. metodicamente vagaroso a contrair para o fim da
combustão – e assim. em contagem decrescente. me vou diluindo em cada pedaço de
fumo que sobe ao céu – perco-me. perco-me na noite pelo que penso e também me
perco quando me recuso a pensar – perco-me. perco-me na noite em sonhos e
também me perco quando me recuso a divagar – perco-me. perco-me na noite dentro
de mim e também me perco quando não estou em mim – um homem perdido só está bem aonde não pode estar – a insustentável leveza do meu ser claudicou. quebrou.
faleceu com o corpo ainda a reclamar mais vida – e o fumo proibido a chegar à
casa dos deuses como chegam os balões das romarias. perdidos. sem rumo. num
vento incerto. sem tino e em desatino – e a enormidade do que sou a deixar de o
ser numa terra em apartheid – segreguei-me – devagar devagarinho subo às
bem-aventuranças. como se fosse o último fumo. como se fosse vento. como se
fosse catraio e me quisesse perder num paraíso iluminado por uma luz
arrependida do fundo da gaveta – por isso te digo: perde-te com um laço.
aperta-o à volta do inferno e faz-te passado – perde-te de raiva e cospe para o
chão que nunca te deu de comer – perde-te de coragem e amarra a ponta da corda
à barbatana de um tubarão e deixa-te cair no fundo das palavras – absolve-te
num parêntesis e não deixes que um ponto interrogação te faça [re]acreditar
– morre mesmo pois já não tens mais
tempo para te [re]perder – perde-te
antes que percas a vontade de escrever
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