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leio a biografia
de ernest hemingway e resisto à sua dor numa contemplação silenciosa e serena –
interrogo-me. como seria eu se tivesse nascido em mil novecentos e sessenta e
um? e se tivesse nascido na américa? e se trocasse a minha coca cola zero e me
afundasse em álcool? e se a guerra infindável da minha escrita começasse a
perguntar por quem os sinos dobram? não sei o que seria. em boa verdade nada
sei. acreditem. nem sei muito o que é que me leva a escrever este texto meio
maluco. afinidades. creio – hoje. com o hemingway por perto. estou convencido
de que se fosse possível cavar um buraco a partir da minha terra este iria dar
à américa. chegado lá. só teria que comprar uma arma para matar as palavras.
não as que escrevo. porque essas já nascem mortas. as que me vivem na cabeça e
que me enganam com esperança – estamos em dois mil e dezoito. março. às portas
da primavera e do inferno e eu num ato de contrição: por minha culpa. máxima
culpa vos escrevo não o que tenho na cabeça mas o que me falta nas mãos – sossego.
afinal nunca saí de onde estou. sou desta terra de portas abertas e que tudo vê
por um canudo. finjo-me morto e entrego-me ao pensamento até que uma voz me
resgate para o barulho do mundo – morrer não é uma chatice é um desígnio que compramos
e nos permite nascer. só não nos dizem o dia em que partimos. iludem-nos com
tempo. como se o tempo fosse uma equação simples de calcular. não é. nem sempre
viver cem anos é melhor do que cinquenta – viver é conduzir numa autoestrada em
hora de ponta a duzentos quilómetros por hora. fazer dois piões. entrar por uma
galgueira. andar em duas rodas. evitar trinta e três acidentes enquanto falamos
ao telemóvel e sorrimos para o retrovisor com desdém porque o que fica para
trás já não nos serve para nada – ninguém quer saber o que fizeste. só o
presente faz futuro – quando damos conta chegamos ao destino meia hora mais
cedo com a sensação de que o mundo está todo atrasado – estamos no nosso velório.
louvado seja o senhor
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