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1.
a
tenda está montada – as colunas de som anunciam mais um grande espetáculo numa
noite toda ela investida pelo rigor dos trajes – começa o desfile dos decotes e
dos entretenimentos – o espaço é todo ele glamour. um desafio ao infinito da mente humana. ao deslumbramento. ao
encantamento. ao sonho – a cair do
céu. lustres envoltos em brilhos. projetam cores de um arco-íris que. na sua extremidade. esconde o santo graal das mil e uma
noites – tudo leve. tudo alma. tudo transparência. tudo sensualidade. enquanto a música toca charme em decibéis que são melodia de
acasalamento – e todo mundo sabe conversar.
sabe manear o corpo num tempo perfeito de insinuações – e as luzes acendem e
apagam. e agora uma vermelha. logo outra azul. e mais uma amarela. e em
cada intervalo de luz o belo protegido por sombras intermitentes – cai dos
altifalantes um encosta-te a mim.
cai gesto. cai charme. cai um beijo dos lábios e
os sorrisos desfazem-se de boca para boca – as palavras são agora notas de concordância numa clave de sol
perfeita – o ar quente sobe. os
vestidos também. o astral. o charme. os sapatos de plataforma.
os soutiens push-up. tudo a subir sem
parar. o deleite. a volúpia e a loucura também – a descer só mesmo os decotes atracados
aos olhos cobiçosos dos cavalheiros que.
silenciosamente. deslizam para o seu
interior numa gula luxuriosa e delirante – preso em jeans. o cio. rompe dos corpos num rugido
de guerra silencioso. mostrando ao
corpo que não há luxúria sem imaginação – o que é da noite. na noite em segredo fica para sempre – e entra a “elegantérrima”. logo em seguida a excitadíssima e a estranhíssima. e num toque de magia rola o sumiço da
sensatez – explode a insinuação – e a boca do lobo mau na face de cada macho. perseguem o gozo perdidos em ereções
azuis. robustas e vigorosas – homem que é homem bebe whisky. tresanda a tabaco. brota cabelo do sovaco e promete à mulher o orgasmo de todos os
orgasmos – o delírio masculino retratado pela fábula do sapo e do escorpião: é a sua natureza – o bom senso. aos poucos. é corroído em goladas curtas e obstinadas – e o desfile dos
corpos cada vez mais entrelaçado com o pecado – entra na vitrina a mal casada. seguindo-se a oferecida.
e mais uma que não se dá por nome nenhum – o vazio da tenda começa a desaparecer. enquanto em sentido inverso emerge a provocação
quente e sensual – as fantasias avolumam-se e a espectativa agiganta-se num
espaço cada vez mais comprimido –
finalmente homens e mulheres em igualde na sua plenitude – e o barman. numa ligeireza absoluta. esgueira-se em sorrisos pelo meio de roucos
e desesperados apelos gorjais. e a
cada súplica. grunhe em simpatia uma
jura de que a culpa é de vénus – ele é apenas um simples mortal enviado para
matar a secura das bocas. sabe que
mais tarde ou mais cedo a desvirtude tomará conta do seu corpo – a festa também
é dele – o álcool não protege a moral dos bons costumes – rompe pelo balcão
mais uma caipirinha que. não vinda do
brasil. traz no seu interior as
batidas sensuais do samba. a ousadia. prometendo fazer rolar bundas num
ritmo da excitação raivosa. enquanto
os másculos. em uníssono. reclamam mais tesão para o salão – os RP`s.
com mais de mil amigos facebookianos.
recebem todo mundo numa aflição galopante –
-- boa noite. sejam bem-vindos
ao nosso espaço – multiplicam-se os meneios íntimos. amontoam gestos. dobram
simpatia. descobrem sorrisos. inventam adaptabilidade e prometem a
cada cliente uma noite para mais tarde recordar – para estes colaboradores cada
palavra gasta é um empurrão de afetos para a confusão – e as apresentações
repetidas até ao esgotamento – o barulho das vozes e dos gestos é agora infernal
num bar atulhado em súplicas de prazer
– e mais um red bull com vodka para ali.
e um bulldog com frutos às cores para a amante do cavalheiro de negro – os
corpos encontram-se. tocam-se. beijam-se e insinuam-se em danças que
já são de pré copulação – e a tenda repleta de gente. repleta de glamour. repleta
de encantos. de ilusão. de desejo sexual primitivo – a noite a
explode – os decibéis da música deslaçam finalmente a timidez da cinquentona que. promete tudo o que tem num corpo XS. enquanto a da alta sociedade. ao lado da de nariz-empinado. faz brilhar num triple XL o valor de
cada lantejoula – o ambiente na tenda enlouquece. as paredes tremem. e a
batida house faz pular a olívia que não é palito. deixando a multidão a dizer:
que borrachito. que borrachito. e o povo em suspiros diz em voz de
surdina: quero dançar com ela. quero dançar com ela – e quem não
pula não tem tesão – loucura loucura.
diz a turma em voz viril enquanto a mulata mostra o rabo até à exaustão – e
elas. perdidas em lascivas agitações. derretem-se em sorrisos vaginais – toca
uma quizomba do anselmo. não me toca. lenta. muito lenta. e tudo
aos pares. perfeitos. protegidos pela magia do encantamento
que só se quebrará com o orgasmo.
enlaça as almas pecaminosas em gemidos que não são de sofrimento – os corpos
entrelaçam-se. colam-se. os traseiros contorcem-se numa dor
que vem da falta de pudor. e os
joelhos para ali. e as ancas para o
outro lado. enquanto as mãos se
perdem em desejos desesperados – e o
pecado a dizer ao ouvido: mais. mais. não pares agora. e um
arrepio. e uma mão na cabeça a dizer
vais ser minha. e a outra para cima
e para baixo. e o desejo promiscuo amarrado
a um beijo que fica para o resto da noite a latejar – e tudo que era mulher
séria é agora mulher excêntrica.
adultera. pervertida. tudo que era cavalheiro virtuoso é
agora cavalheiro adúltero. gigolô. atulhado num tesão escorado numa
robustez eriçada pelos químicos – e a música a acelerar a decomposição dos
corpos num protocolo assexuado – a noite não para de surpreender. os corpos não desistem da excitação. os rostos pedem mais aperto enquanto
as nádegas saltitantes gemem entaladas em rendas que já não são mais elástico –
todo o XL é um ESSE justo que não se cansa de dizer: sou a mais bela gaja do universo e de cima dos meus sapatos luís
onofre sei falar como ninguém – sou toda etiqueta. sou alta costura e não estou aqui para qualquer um – olhai olhai. no que é meu não tocais a não ser que
digam que sou a mais gostosona do reino –
sou rainha. ninfomaníaca. louca e sinto-me toda molhada –
enquanto a mal casada. num sorriso
que é passadeira diz: cheguei meus
amores. estou linda de morrer e é
bem-vindo quem vier por bem – a repinhas.
cada vez mais mal-amanhada. para não
ficar atrás. abre o decote e diz em
espanhol que não é de espanha: “estoy
muy caliente y soy una chica guapíssima.
mui respetada
y apreciada” enquanto o marido. de vigores
estrogénicos. vai abanando a cabeça
numa anuência predadora – para este chico a arte de caçar é igual à praticada
pelo homem da pré-história. uma
selvajaria sem regras disfarçada numa simpatia saloia – nada lhe escapa – e os
copos a baloiçar entre a cerveja e o blue lagoon. entre uma kizomba e um movimento de olhos que anuncia a qualquer
momento sexo em doses ilimitadas – e tudo é boca. sorriso. e tudo honoris
causa. saber. arte produzida de encomenda.
costurada corpo a corpo. mente a
mente – em cada cérebro o ímpeto tosco de uma exclusividade suportada por um
ego só suplantado pelo divino – e quem nasce macho. macho morre – é a hora do zé triste – encostado ao balcão. de copo na mão. ginga o corpo num enredo de cautela aristocrática – fidalgo. exclusivo e elitista arfa arrogância
em ritmo de nobreza real e em cada golada a fantasia de um orgasmo imperial – vai imitando o camaleão com desdém: um olho para as gajas e o outro na
sua garina que. em hábitos curtos e
maliciosos. mostra aos homens o
arrojo carnal de quem sabe que o seu clímax será sempre cerebral – estamos no epicentro da noite. a música é agora aglutinadora. tudo salta. tudo canta. e tudo é
dito em delírio pela françesa: “oui. je me sent une fou” – e o suor a
emanar cheiro que é sinal de desvario – na pele a explosão de hormonas canibalescas
fazem cintilar os corpos de desejo agâmico – e elas dissimétricas da razão
contorcem-se. tudo já é padecimento. aspiração. desespero. aflição. e entre o corrimento fértil de uma
vida a certeza de que finalmente estão emancipadas do mundo das normas – sexo por sexo precisa-se e exige-se – e os
machos sem saberem o que fazer a tanta profanação do bom senso. perdem-se em galanteios desnecessário – desdobram-se em ereções inúteis que terminam
em ejaculações precoces – o mundo
masculino lida mal com o que lhe é oferecido por prazer – há uma nova liberdade. um novo pulsar da vida no relógio
biológico humano – e todo o mundo se interroga: será que sou louco? não. não. e não
2.
e a divina comédia de dante
reformulada numa viagem renovadora ao mundo da libertinagem – já não há mais
inferno para quem quer ser feliz. a
pureza da alma constrói-se com a simplicidade do amor – a felicidade só pode
ser alcançada na sua plenitude a partir da
verdade e da lealdade que cada um tem com o seu próprio corpo. o seu autoconhecimento
de um eu genuíno – só a mentira mata o afeto. mata a autoestima. a autoconfiança. a autoaceitação positiva – o
purgatório está agora desabitado para sempre enquanto satanás devora o manual do
pecado capital – já não mais serão sete – o paraíso é feito na terra e só está ao
alcance daqueles que amam a justeza – quando nos aceitamos na totalidade aceitamos
tudo o resto como um complemento positivo à nossa vida – a manhã traz um novo
sol para dentro dos corpos. e em paz. regressamos ao lar em perfeita consonância
com as leis universais do amor – há uma harmonia com a natureza das coisas que
não se explica – os corpos são devolvidos a outra realidade numa mesmíssima
alma – a explosão da afeição. da ternura. da estima. do companheirismo e da cumplicidade acontece com a chegada ao lar
– tudo por aqui é perfeito – o mundo é redondo. e cada um de nós habita-o numa milésima partícula de terra.
única. como uma impressão digital – o nosso ninho espiritual que ninguém sabe
onde fica a não ser o próprio – um ponto imaginário para quem nos marca pela
indiferença. um ponto real para os que nos abraçam com a
bondade de um universo tendencialmente fraterno – o meu está aqui. mesmo à frente do vosso sentir –
basta acreditar