fico com
a ideia de que às vezes há uma comunicação desatenta com as palavras. pouco
trabalhada. pouco cuidada. às vezes em pânico. que nos
chega emparelhada. mesmo que de forma ténue. a sobreviver à custa
da original. encriptada de aliviação. parasita. mas também
um género de bálsamo anestesiante para as dores da alma. um relaxador de
medo. um perdoa-me do comunicador. e que diz mais ao menos assim:
caros ativos deste país. pagadores de impostos. gente que usa
as autoestradas. gente que faz filas de trânsito. gente que leva
filhos aos infantários. gente que corre atrás de uma bola. gente
que faz o mundo andar à velocidade dos aviões. gente que compra moda.
que compra excentricidades e coisas que não servem para coisa nenhuma. gente
que faz política e ainda outros que se encaixam em perfeição no liberalismo
selvagem. gente do lucro. das grandes cadeias mundiais de produção.
das ações de wall street. da distribuição de dividendos. dos ricos
cada vez mais ricos. e daqueles que são escandalosamente menos ricos.
humildes. modestos sem saberem o porquê. talvez por causa do
alimento. da sobrevivência. da dignidade do nome. da descendência.
e do rir. do fingir para esquecer… e viramos as costas ao
que tem mais gula do que olhos. e planeamos tudo para uma eternidade feliz
e absoluta. que nunca teremos – relaxem… só morre malta
acima dos oitenta anos. malta sem velocidade. malta das cadeiras
de rodas. que não corre. que não paga impostos. não leva
filhos aos infantários. só os vão buscar quando os pais não podem.
malta estranha. velhos do restelo. estão sempre contra tudo e
todos. só sabem ver telenovelas para não falar nas fraldas – descontraiam.
isto é doença para quem arrasta os pés. nós temos é que trabalhar.
temos que fazer o país andar. quem é que paga as contas no fim do mês
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