foto google
em
contramão. uma dama rebuliça e enérgica
dirige-se para mim – acerto-lhe com os olhos e interrogo-me: será que vou
ter problemas. a esta velocidade vai-se-me enfaixar no pescoço – cabelo loiro
oxigenado. levantado à frente. face redonda e rosada. não
sei se é cor natural ou está apenas afogueada da velocidade que imprime ao
andamento. uma pochete louis vitton contrafacionada num bairro chinês de
pequim. acompanha o movimento das pernas numa desordem perigosa. ainda
vai dar com o adereço na cabeça de algum transeunte – botas douradas. furadas
com estilização. sobem-lhe pela perna com ganas de chegar o mais longe
possível – dois dedos acima de uma rótula rombuda e três abaixo da cintura uma
pequena mini saia branca vestida com desprezo. a fazer sobressair uma
cicatriz mal-arrumada no umbigo. mascarada de importância com piercings-diamante
falso de quinze quilates – confesso que fiquei com a ideia de que a saia era
apenas um adorno para desviar as atenções do umbigo – olhos redondos. claros.
a contrastar com uma pintura excêntrica. um negro que não era
luto. balançava o corpo numa agitação perigosa para os dois enormes
seios amarrotados pela licra preta de uma camisola de alças – confesso que por
momentos entrei em pânico. a aproximação apresentava-se desatenta.
descuidada e desnorteada e decididamente em excesso de velocidade – tinha que
evitar a todo custo o embate – já não tenho condições para choques com viaturas
de transporte de matérias perigosas – cerrei os dentes e preparei-me para a
fusão dos corpos – quando pensei que o embate era inevitável a dama num
movimento de toureio atira com as ancas para um lado e sai com o tronco pelo
outro – foi tudo tão rápido que comecei à procura da bandarilha espetada no
corpo – felizmente tudo não passou de excitação – olhei para trás e ainda não
recuperado percebi que a minha alucinação se deveu a uma mini saia comprada nas
galerias lafayette de paris. encandeou-me. cegou-me. roubou-me o
norte e mesmo numa excitante desordem mental. percebi rapidamente que me
tinha perdido nos adereços. a testosterona invadiu-me os neurónios. começou
a descer-me pelas vértebras. comecei a suar em bica e quando dei conta
estava com a dama em pecado. em pensamento. mesmo à minha frente –
era muita mulher para mim. era muita curva e contracurva. era um
pecado quase mortal. deus e a minha companheira nunca me perdoariam um
pecado com esta dimensão – desorientado. fiquei sem saber se seria
melhor atirar-me para uma valeta ou aceitar o embate como inevitável e
preparar-me para as consequências – era impossível ficar indiferente às
propriedades naturais [penso eu] desta excêntrica dama – deitei os olhos ao
chão. arrependi-me. voltei a olhar. deitei novamente os
olhos ao chão. voltei a arrepender-me. voltei com os olhos para o
chão. e é quando surpreendentemente a dama dirige-me a palavra:
estás a olhar para onde – surpreendido. envergonhado e embaraçado
respondi: estava a olhar para a celulite. isso não está nada bem e
não condiz com a mini saia – e assim. numa manhã de quarta-feira nos
cruzamos numa eternidade de tempo: eu tão cedo não vou esquecer esta
dama e a dama vai comprar todas os cremes anti celulite que existirem no
planeta e arredores – ninguém se transforma naquilo que não é…
Sem comentários:
Enviar um comentário