.................................................................................não tirem o vento às gaivotas

07/11/2019

teatro









[dedicado a júlio saraiva poeta e jornalista já falecido]



sou teatro…
parei agora para pensar um pouco
sossegar-me destas aflições
vocês compreendem…
não é fácil representar toda a vida.

nesta pausa
posso ser quem sou
inclino-me,
seguro a cabeça com as mãos
fecho os olhos
e vestido a preceito desde a última cena
viajo até à nascente,
lá… onde vivem as fadas.

neste encontro,
não preciso do ponto
nem do contraponto
e nas luzes da ribalta
surgem sonhos infrangíveis
neste pensar, encontro-me
em palcos dourados,
tribunas,
plateias,
camarotes,
frisas e palmas

é o teatro gigante
e eu tão pequeno
tudo esgotado,
tudo de pé
chamam-me os aplausos
em coro,
acenam cachoeiras de flores
que eclodem aos meus pés.
é a primavera
pensava eu.
                                                                                                                                  
mas os olhos ainda raíam
deste descer à verdade.
rompem as pancadas de molière
o contrarregra vai subir o pano
também eu subo à vida

acabou o teatro.


no dia em que postei o teatro no luso poemas. agosto de 2009. recebi uma mensagem privada do poeta e jornalista júlio saraiva que. amavelmente. fez questão de me dizer que tinha apreciado imensamente o poema e. na sua simplicidade. pediu-me autorização para o levar para o seu blogue – nem queria acreditar que o júlio saraiva se tinha dado ao trabalho de me escrever. que me elogiasse e quisesse divulgar o poema na sua página – é a primeira vez que torno público este episódio. confesso que fiquei um pouco envergonhado e pensei: e agora o que vai ser de mim. como vou manter o nível. que dirá o júlio quando ler o meu próximo poema – admito que nunca me senti nem confortável. nem feliz com a poesia. só a prosa me enredava o tempo com alegria – entrei em pânico e achei que o melhor para a minha poesia seria silenciar-me. quanto menos pessoas soubessem deste episódio melhor – não sei se alguma vez o postou. confesso que não sou muito bom a tomar conta da vida dos outros. mas também não é importante. valorizo mais o impulso. valorizo mais a verdade do momento. e esta é sempre mais apreciada quando emerge na espontaneidade – uns tempos depois faleceu e nunca tive oportunidade de lhe agradecer aquele gesto. principalmente. nunca tive oportunidade de lhe dizer como aquela mensagem. naquele momento. me ajudou a renovar a vontade de escrever – o luso era um espaço pequeno para tanto ego gigante. sobrava a vaidade. a arrogância. a falta de humildade e. principalmente. o bom senso e a tolerância – reconheço que havia colegas intragáveis. com mau carácter. monstrinhos egocêntricos que projetavam uma grandeza que em boa verdade não tinham – ser grande entre os pequenos não os tornavam especiais – não era fácil lidar com esse lado negro dos poetas –   mas bem lá no fundo confesso que aprendi muito com os meus camaradas do luso e a todos estou agradecido – depois. tal como os mágicos fazem magia. o júlio também fez acontecer um momento excecional para mim – durante um tempo esqueci tudo o que era mau – a modéstia chega sempre mais depressa por quem não precisa de se por em bicos de pés para ganhar altura. já são grandes e ponto – que nunca lhe falte nada esteja ele onde estiver. mas se faltar. que não seja papel. lápis e… amigos. para que. em companhia. beba o seu “choupinho”



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