[dedicado a júlio saraiva poeta e
jornalista já falecido]
sou teatro…
parei agora para pensar um pouco
sossegar-me destas aflições
vocês compreendem…
não é fácil representar toda a vida.
nesta pausa
posso ser quem sou
inclino-me,
seguro a cabeça com as mãos
fecho os olhos
e vestido a preceito desde a última
cena
viajo até à nascente,
lá… onde vivem as fadas.
neste encontro,
não preciso do ponto
nem do contraponto
e nas luzes da ribalta
surgem sonhos infrangíveis
neste pensar, encontro-me
em palcos dourados,
tribunas,
plateias,
camarotes,
frisas e palmas
é o teatro gigante
e eu tão pequeno
tudo esgotado,
tudo de pé
chamam-me os aplausos
em coro,
acenam cachoeiras de flores
que eclodem aos meus pés.
é a primavera
pensava eu.
…
mas os olhos ainda raíam
deste descer à verdade.
rompem as pancadas de molière
o contrarregra vai subir o pano
também eu subo à vida
acabou o teatro.
no dia em que postei o teatro no luso
poemas. agosto de 2009. recebi uma mensagem privada do poeta e
jornalista júlio saraiva que. amavelmente. fez questão de me
dizer que tinha apreciado imensamente o poema e. na sua simplicidade.
pediu-me autorização para o levar para o seu blogue – nem queria acreditar que o
júlio saraiva se tinha dado ao trabalho de me escrever. que me elogiasse
e quisesse divulgar o poema na sua página – é a primeira vez que torno público
este episódio. confesso que fiquei um pouco envergonhado e pensei:
e agora o que vai ser de mim. como vou manter o nível. que dirá o
júlio quando ler o meu próximo poema – admito que nunca me senti nem confortável.
nem feliz com a poesia. só a prosa me enredava o tempo com alegria – entrei
em pânico e achei que o melhor para a minha poesia seria silenciar-me.
quanto menos pessoas soubessem deste episódio melhor – não sei se alguma vez o
postou. confesso que não sou muito bom a tomar conta da vida dos outros.
mas também não é importante. valorizo mais o impulso. valorizo
mais a verdade do momento. e esta é sempre mais apreciada quando emerge na
espontaneidade – uns tempos depois faleceu e nunca tive oportunidade de lhe
agradecer aquele gesto. principalmente. nunca tive oportunidade
de lhe dizer como aquela mensagem. naquele momento. me ajudou a
renovar a vontade de escrever – o luso era um espaço pequeno para tanto ego
gigante. sobrava a vaidade. a arrogância. a falta de
humildade e. principalmente. o bom senso e a tolerância – reconheço
que havia colegas intragáveis. com mau carácter. monstrinhos egocêntricos
que projetavam uma grandeza que em boa verdade não tinham – ser grande entre os
pequenos não os tornavam especiais – não era fácil lidar com esse lado negro
dos poetas – mas bem lá no fundo confesso que aprendi muito
com os meus camaradas do luso e a todos estou agradecido – depois. tal como os
mágicos fazem magia. o júlio também fez acontecer um momento excecional
para mim – durante um tempo esqueci tudo o que era mau – a modéstia chega sempre
mais depressa por quem não precisa de se por em bicos de pés para ganhar altura.
já são grandes e ponto – que nunca lhe falte nada esteja ele onde estiver. mas
se faltar. que não seja papel. lápis e… amigos. para que.
em companhia. beba o seu “choupinho”
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