.................................................................................não tirem o vento às gaivotas

24/12/2012

sou natal




ceia de natal - carl larsson




que saudades do natal do meu pai. que saudades do meu pai. não há natal sem pai - há um lugar por ocupar na nossa mesa. para sempre - sou pai. sou natal. amo os meus filhos. a minha companheira. a minha mãe. a família. os meus amigos. não há natal sem sentimento. sem a mesa estar completa - hoje fecho o círculo. sou pai. sou natal - obrigado pai




te




joão guimarães




chamei-te princesa e o mundo ficou pequenino dentro do teu sorriso 





20/12/2012

os cometas caem sempre no mar




van gogh





um dia. há muito tempo. corria um catraio – os calções cortavam-lhe as pernas pela metade que não parava de crescer. queria ser enorme. crescer até que as árvores lhe dessem pelos joelhos e os pássaros lhe descansassem nos dedos das mãos. já cansados de correrem o mundo – gosto de pássaros. gosto de os ouvir cantar em liberdade. gosto de os sentir nos dias que crescem. gosto de os ver à espera do fim do mundo – gosto de pássaros. não consigo imaginar as árvores sem pássaros. ruy belo escreveu que as árvores dão pássaros. eu acredito. com a idade passei a acreditar em tanta coisa: na intuição. no cheiro. no olhar casual. nos abraços das palavras. nos poetas. nos homens tímidos que não sabem falar – eu não sei falar. nunca soube. esta maldição de não saber dizer o que penso mata-me. só as árvores me mantêm de pé. as árvores prenhas de flores. às cores – cor esperança. cor tempo. cor saudade. cor de gente que não morre. de gente que anda por aqui. entre nós. como diz o antónio lobo antunes – sei que o meu pai anda por aí. tenho a certeza que anda com o tio joão. devem andar a falar de pássaros. de árvores. de flores. das coisas boas do mundo deles. do meu mundo. do nosso mundo – e o sol sempre às voltas e as sombras sempre a desaparecer. e tudo o que gosto cada vez mais dentro de mim. num silêncio que dói – gosto das flores amarelas. são da cor do sol – o tempo caminha. ordenado por leis que deconheço. e tudo o que é agora é passado. e o futuro são sonhos e sonhos são sempre sonhos. e o medo a trabalhar como um relógio. e os segundos contam horas e dias e anos e a memória a esquecer-se que tudo não passa de uma linha recta. e o princípio está cada vez mais distante do que sou: um triciclo. uma voz doce. uma babete suja. um avião com luzes que acendiam e apagavam num terraço feito de cimento. e a roupa a secar. e a bola a saltar no pé. e um beijo na boca. um abraço. um pedaço de terra a cair das mãos. e flores. árvores. pássaros e o fim já ali e as rectas afinal têm princípio e fim – o passado é sempre tão distante. velho. engelhado. amarrotado. só a juventude é especialmente ingénua. bela. pura. amarela como o sol. como as flores. como as árvores –  somos vida. eu e os pássaros. somos primavera. o fruto nasce sempre depois da flor – depois. chega abril. e os meses começam a correr. os dias grandes multiplicam-se. e os frutos ganham cor. forma. são cada vez uns mais iguais a outros. e as laranjas são laranjas. e as maçãs são maçãs. e os morangos são morangos. e cada árvore com o seu pedaço de terra. e em cada pedaço de terra mais primaveras que se fizeram saudade – é o tempo do que tem princípio e fim. tudo às cores. e branco. e  azul. e amarelo. e vermelho. e todas juntas são quadros de van gogh. flores feitas à medida para cada tela imaginada. e tudo sem vento. sem chuva. sem sorrisos que se possam ver – o sol cai. e tudo parado. tudo menos os calções. cobriram as pernas. o corpo. as cicatrizes. e os olhos à procura do quadro feito de flores às cores que nunca existiram – só eu sou dono das cores que vi. toda a terra que dá fruto é sagrada. terra de terra. ventre –  mãe. mãe natureza. eu sei que tudo o que nasce morre – estar vivo é aguentar – aguento um cansaço que ninguém compreende. um cansaço dor – e o tempo sempre com no mesmo compasso – gosto de pássaros. de árvores. de flores. gosto de palavras que matam silêncios – perdi tanta gente que gostava. perdi dias. perdi fé. perdi amigos. perdi confiança. perdi quase tudo o que um homem de verdade não perde – sou agora cada vez mais mortal – resta-me escrever com o corpo. nas mãos os pássaros continuam a descansar. um dia partem