sacudi a noite
pela primeira
janela da manhã
restos de sonhos
suspensos
no pretérito
as orvalhadas já se
fazem sentir
e as noites
outrora lúdicas e
quentes
são agora
fatigosas e frias
sacudi a noite
pela primeira
janela da manhã
restos de sonhos
suspensos
no pretérito
as orvalhadas já se
fazem sentir
e as noites
outrora lúdicas e
quentes
são agora
fatigosas e frias
a chuva apronta a faina sobre a
terra
escala ao sol
em cada raio solar
uma gotícula. uma refrega
às nuvens:
o inverno adestra o rigor
e
tudo tão longe. tão afastado
destas folhas de papel - não há tristeza nas palavras que gastamos a falar um com
o outro - e depois. tudo é dentro do corpo. tudo é feito de abraços e cada
palavra veste a alma com uma cruz bordada de primavera - e somos assim. falamos
ao ouvido para enganar a distância - somos feitos de vento. gaivotas com uma
caneta na mão
resposta a um
comentaria da vânia ao meu texto – sinto.abril
há noites
em que o escuro é feito unicamente de sons – ouço o coração. ouço o corpo a definhar.
ouço vozes que trazem saudade e outras que não consigo esquecer – ouço o medo. ouço os pés no soalho gasto e gargalhadas
de pânico também – ouço – ouço o
terror. ouço as pernas presas ao
destino e os pulmões imploram um último cigarro – ouço as mãos a pedir papel. ouço o negrume do tinteiro e os dedos
a bater palavras sem sentido – ouço – ouço
a brisa. ouço o tempo que faz na rua
e também ouço o tempo que vive dentro de mim – ouço aflição. ouço as montanhas a parir um rato e ouço o sino a bater quartos
como se fossem horas de partir – ouço – ouço os cantos à casa. ouço o corpo a virar de lado para
lado e ouço o que não mereço ouvir – ouço o outono. ouço os sorrisos das corujas e ouço pássaros que não sabem que existo
– ouço – ouço as marés. ouço as
gaivotas no mar e também ouço gaivotas que não sabem voar – ouço saudade. ouço fantasmas que não conheço e outros
que ajudei a criar – ouço – ouço a viagem.
ouço um futuro que não pisarei e ouço sapatos que não são meus – ouço o mundo
com estes ouvidos que me nasceram no peito e que se abrem como cravos pregados
a uma cruz que não profetiza remissão – fui condenado a ouvir os meus próprios
ouvidos – aqui estou. com o que me
resta da audição a suplicar aos deuses que me façam humano e me tapem os
ouvidos com a cera de ícaro – prometo que não voltarei a voar na direção do
sol