28/02/2018
deambulações noturnas XXV
14/02/2018
vai. mas será que vais?
não desistas corpo notívago. vai atrás do que é teu. vai. corre muito. corre como
correm clarões em noites de tempestade – vai. vai por esse mundo imaginário e
inventa-te em marte. por lá. tenho a certeza de que há lugar para ti ainda que
te tomem por extraterrestre – não te zangues. verás que um dia serás mais do
que a tua imaginação. mais do que intuição. mais do que aquilo que escreves nas
entrelinhas. serás das ruas com gente a correr de um lado para o outro. dos carros
a apitar movimento. dos maus a fugir dos bons. das sirenes a zumbir cuidados. e
dos tolos. meu deus. cada vez mais tolos a fugir dos que ainda não são tolos – o
mundo esticado ao centímetro quadrado. o corpo esticado ao centímetro quadrado.
a alma esticada ao centímetro quadrado. a fé esticada ao centímetro quadrado e
a incerteza parada em cada centímetro. e o quadrado enfeitado de malmequeres brancos
desenha uma janela que grita: há mais mundo para além do teu medo – sou tanto. tanto
para dar e tanto por fazer – mas vai. vai por esse mundo fora. corre. corre
muito porque marte é longe e o teu coração já não é novo. vai. vai que a fé já
foi à tua frente e a vida está pela hora da morte. dobra-te na tua cruz e ora
ao teu deus que por ser teu é o deus de todos os deuses. vai. vai em sinal da
cruz porque só na janela há esperança. a morte é negrura. às vezes solução. mas
sempre solidão – um dia. os néons deixarão de piscar possibilidades que não te
cabem nos olhos. os bons nunca mais fugirão dos maus. as ruas correrão atrás
das pessoas e os tolos distribuirão malmequeres pelos não tolos – ó meu deus.
porque será que quando vou nunca saio de onde estou? talvez o mundo seja maior
do que uma viagem a marte. talvez não consiga voar no espaço como voam as gaivotas
no mar. talvez seja quase do tamanho do nada. e tudo que é nada nunca deixará
de ser nada. talvez os pés sejam minúsculos e lentos a caminhar. as mãos
atrofiadas. o corpo mirrado. corcunda. feio. tão feio que ninguém me quer olhar.
nem deus – talvez seja tudo. ou apenas só eu – mas vai. parte com coragem.
faz-te ao tempo interstelar. inventa ventos meteóricos. queima a rosa dos
ventos e rasga todos os azimutes convergentes com a desgraça. abre a janela ao espaço
sideral e grita o teu nome. grita como um selvagem. grita como se o grito fosse
a tua história de vida. grita como canta a cigarra em noite de cio. grita como
geme a corda saudosa na guitarra do fadista – vai. vai e despe a raiva para
trás das costas e atira-te ao espaço em silêncio e luta. luta por ti e por
aqueles que te deram vida e se morreres. morre de sorriso na boca porque o que
não tem remédio remediado está – afinal és apenas um mortal numa galáxia empanturrada
de desejos – vai. vai vertical pela noite. vai. rasteja pelo dia. mas vai. vai
para onde te possas encontrar