.................................................................................não tirem o vento às gaivotas

27/05/2020

provérbios em tempos de pandemia



imagem google




resolvi adaptar alguns provérbios portugueses ao triste momento que estamos a viver

 

·         há covid19 a ir e há covid19 a voltar

·         enquanto o covid19 vai e vem. a pandemia folga as costas

·         amigos. amigos. covid19 à parte

·         um olho no desconfinamento. outro na covid19

·         deus tem mais para dar. do que a covid19 para levar

·         a covid19 morreu de velha

·         quem não quer ser covid19. não lhe vista a pele

·         em terra de covid19 quem tem olho é rei

·         um dia da covid19. outro do vacinado

·         não adianta chorar pela a covid19 derramada

·         covid19 passada não move moinho

·         o pior cego é aquele que não quer ver a covid19

·         apressado come covid19

·         covid19 criada. trabalhos dobrados

·         à noite. todas as covid19 são pardas

·         depois da covid19. aparecem os valentes

·         em briga de marido e covid19. ninguém meta a colher

·         de boa covid19 está o inferno cheio

·         em casa de covid19 a espeto é de pau

·         se a covid19 trouxesse sorte. burro não puxava carroça

·         covid19 que nasce torta. tarde ou nunca se endireita

·         não há má covid19. se a puserem no seu lugar


18/05/2020

olga tokarczuk



foto - google



no meu aniversário os meus filhos ofereceram-me um livro da olga tokarczuk. prémio nobel da literatura 2018 – alguma coisa vai mal no reino nobel quando se trata de quem escreve. estou nas primeiras cento e vinte páginas do livro “conduz o teu arado sobre os ossos dos mortos” e não consigo perceber como é que o nosso antónio lobo antunes ainda não mereceu essa distinção – não digo que a senhora não escreve bem. seria o mínimo a esperar de quem recebeu o prémio literário mais prestigiado do mundo. mas de quem recebe esta distinção espera-se infinitamente mais – não posso negar que a trama narrativa teve um começo auspicioso e levar-me-á. com toda a certeza. até à última página – não quero ser injusto. não conheço a sua obra. nunca lhe segui uma única linha. mas meu deus. o nosso antónio não se limita a escrever. o nosso antónio cria. permite-nos extrair mundos de dentro dos seus livros:  tal como o mágico tira coelhos da cartola – o nosso antónio em cem páginas já me tinha arrepiado outras tantas vezes com descrições. denotativas ou conotativas. metáforas. humor. personagens. sei lá. o antónio é muito mais do que um escritor. é um mestre. um génio. e destes espera-se tudo. sem exceções – nos livros do sr. antónio. como gosta de ser tratado. cada leitor inventa e carrega consigo um livro que guarda para sempre – este livro da olga é apenas um livro. nada que fique – nasceu e morrerá no dia em que o fechar

 

e como não sou crítico literário. não me senti confortável com o meu juízo crítico sobre a escolha de olga tokarczuk para nobel da literatura. e fui à procura de quem corroborasse a minha opinião – nem precisei de procurar muito:

https://www.sabado.pt/vida/detalhe/a-sua-escolha-prova-que-o-nobel-da-literatura-nao-e-para-levar-a-serio


15/05/2020

corre




corre. corre corpo. corre e resiste aos íncubos da noite. e mesmo que o amanhecer não chegue a prometer. corre sem olhar. corre sem parar. corre porque vais chegar

 

corre. corre corpo. corre com essa besta sombria. e se o medo ruminar o instante. corre como um avião. corre como um falcão. corre por afeição

 

corre. corre corpo. corre e reluta o outono que ouves perecer. e mesmo que encontres campos com amargor. corre sem gemer. corre sem estremecer. corre porque um dia o sol vai aparecer

 

corre. corre corpo. corre pelos que saram sem temer. e mesmo que a terra murmure repouso. corre com amor. corre com louvor. corre porque o nome o mundo vai compor

 

corre. corre corpo. corre como nos dias absolutos. e mesmo que o sol não abrase. corre sem fraquejar. corre sem desalentar. corre porque o frio vai acabar

 

corre. corre corpo. corre porque do abril se faz maio. e mesmo que o inverno te prometa repouso. corre de soslaio. corre como um raio. corre como um catraio

 

corre. corre corpo. corre e não serás saudade. e mesmo que as ninfas vozeiem folguedo. corre sem alucinar. corre sem desvariar. corre sempre sem vacilar

 

corre. corre corpo. corre. corre corpo


14/05/2020

a caminhada da resistência humana



foto - sampaio rego



não merecíamos este vírus tresloucado. desprovido de escrúpulos e irracional. tão estúpido que. com a sua maldade. acaba por extinguir a sua própria existência juntamente com a do hospedeiro – revela. portanto. na minha opinião. um distúrbio mental perigoso e autodestrutivo – para além destas anomalias perigosamente malfazentes. que o fazem descontrolar-se e nos magoar – dizem os estudiosos desta maleita. que os vírus ruins padecem todos de uma anomalia: conduta autolesiva e simultaneamente criminosa. leva à morte o seu hospedeiro – essa é a sua condição psicológica megalómana – este vírus ainda é mais cínico.  acredita-se. de acordo com as últimas pesquisas. que o seu aparecimento assenta numa fantasia delirante de que. um dia.  também lhe será possível viver e caminhar de forma vertical – dito por outras palavras. a covid19. enquanto dormia de dia e voava de noite. sugava um pouco de sangue aqui. outra acolá. tudo corria na perfeição. para ela e para nós – tínhamos mundos separados. ela nos morcegos. e nós no nosso modo pacato de viver – um dia. num acesso de fúria excêntrica. decidiu que era tempo de abandonar o anonimato: queria caminhar em quatro patas – cansado de viver em cavernas e. sobretudo. de dormir de cabeça para baixo – nada melhor do que um inofensivo pangolim para verticalizar a sua existência vampírica – e assim desceu dos céus ao solo – não satisfeito. farto de terra e de insetos. achou por bem dar mais um passo em frente. queria crescer para as estrelas sem tirar os pés da terra. atirou-se sobre um pobre comerciante chinês – estragou tudo. os humanos não têm a paciência dos morcegos e muito menos a dos pangolins. a partir do instante que interferiu com a nossa forma de vida percebemos rapidamente que teríamos de lhe dar um fim à sua existência – não sei o que vai acontecer noutros países. mas nós. os lusos. temos uma longa tradição de expulsar quem nos incomoda: d. afonso henriques expulsou os mouros à espada; a padeira de aljubarrota. de pá na mão. enfrentou e derrotou os castelhanos para o reino de castela; o marquês de pombal expulsou os jesuítas sem cerimónias; e em mil novecentos e setenta e quatro os militares de abril acabaram com os fascistas de cravo ao peito – saiba a senhora covid19 que. mais cedo ou mais tarde. acabará também por ter que dar à soleta. bater com os joelhos um no outro – dito isto. reafirmo. este vírus é um traste. fez-se de convidado e hospedou-se nos nossos alvéolos pulmonares. colocando a raça humana numa situação muito complicada e perigosa – ainda se a tratante. em vez de atacar idosos. atacasse os mais jovens. gente capaz de a enfrentar corpo a corpo. mas não. num ato de covardia. escolheu os mais vulneráveis – traz consigo uma outra faceta sombria: a insensibilidade. talvez por ser nova. afinal nasceu em 2019 e ainda não foi capaz de compreender todos os sacrifícios que a humanidade teve de superar para conseguir chegar ao século XXI – pois bem. talvez seja esta a melhor altura para lhe mostrar tudo o que fomos obrigados a ultrapassar. e avisá-la que será. também ela. relegada aos compêndios da memória. mais cedo ou mais tarde não passará de um resfriado – lembremos-lhe a nossa caminhada:

 

·           tivemos peste negra. gripe espanhola. tifo e varíola

·           temos cólera. tuberculose. febre amarela. sarampo. malária. diabetes. gripe A. sida. dengue. sars. gripe aviária. gripe suína. mers. ébola e cancro

·           temos nevascas. furacões. sismos. dilúvios. tsunamis. vulcões e incêndios

·           temos fome. desemprego. miséria. pobreza. mendigos. analfabetismo e desigualdades

·           temos ditaduras. ditadores. políticos desavergonhados. políticos incompetentes e políticos corruptos

·           temos partidos da direita. esquerda. do centro. da extrema esquerda. da extrema direita e outros que não servem para coisa alguma

·           temos pena de morte. tortura. assassinatos. prostituição. exploração infantil. escravatura

·           temos máfia. quadrilhas. gangues. criminosos. violadores. proxenetas e pedófilos

·           temos acidentes de viação. acidentes de trabalho e acidentes nucleares

·           temos guerras. órfãos de guerra. terrorismo. armas nucleares. perseguições étnicas. religiosas. racismo. xenofobia. antissemitismo e intolerância de género

·           temos alterações climáticas. buraco do ozono. emissões de carbono. degelo. subida do nível da água do mar. escassez de água potável. escassez de alimentos e desflorestação

·           temos inveja. ódio. rancor. cobiça. ciúme. ganância. rivalidade

·           temos religiões africanas. indígenas. judaísmo. espiritismo. juche. sikhismo. budismo. chinesa. hinduísmo. ateísmo. agnóstico. islamismo. cristianismo

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tivemos. e ainda temos todos estes males e todos combatemos. alguns já eliminamos. outros. serão a seu tempo – e o que não for de eliminar. resolvemos com diálogo e consensos: o extremismo nunca será solução – voltaremos todos a viver sem a covid19. o homem é incrivelmente forte e resistente – é isso que fazemos há milénios: resistir

 

09/05/2020

correspondência violada - IV


imagem -google


apanhaste-me de surpresa. de costas para a vida. contar os dias que deixei para trás. os dias em que nada pude vencer – sinto saudades das pessoas de quem gosto. de dar um abracinho. de contar histórias. mesmo que não tenham fim. mesmo que seja com pressa. mesmo que o tempo insista em correr. e esta vontade de fechar os olhos me deixe distante de tudo o que não quero – apareceste tu. vens quase de todo lado aonde nunca fui. apetece-me ler-te. mesmo que tudo seja distante – como se o mundo por um instante fosse apenas tu. mesmo distante. tu e eu distantes. envoltos num abraço que nos une num mundo que ninguém entende


mensagem pessoal para a vânia lopez em 21 de agosto de 2018