sou. absoluto
numa circunferência concêntrica
sem saber o que tange o raio
sem saber...
o que vale a sorte
no destino do ventre:
nove meses para parir
um atalho para a morte
talvez apenas peso
uma arroba. ou coisa que o valha
aos ombros
o nome estendido até ao fim dos
olhos
a balançar. a perguntar:
o que fica mais perto
o céu ou a vergonha?
entre o deserto e o nada
o que sobra em peso?
uma grama
ou uma alcateia de lobos?
faço contas
é da balança ou de mim
esta fome de sangrar?
e eu
a olhar-me
nas entranhas do absoluto
com as pernas entre
as duas margens de um rio
que nunca me levou ao infinito
a dor em fuga
a correr
as palavras. mortas
a escamar
e o ultimogénito sem pele
sem defesa
e o pensamento a cortar. lâmina
o fígado. num frasco
mergulhado em formol
a medrar de medo
os olhos por fora
sem saberem o que veem
sem saber a verdade:
sou formol
ou o meu destino estava no fígado?
e a escada. degraus contados
semelhanças ocultas
nós sentados no alguidar
absoluto
com os pés na terra
sem perceber
nada:
nem como tudo se fez
nem como me fiz
se em mim o vazio
ainda não é esquecimento
é raiva
espelhos estilhaçados
de cada rosto que não conheço
que será de mim
e de vós. por obrigação
se tudo for esquecido?
que culpa me condena?
que absoluto me sobra
sem o teu nome?
que absoluto teu ocupa o meu corpo?
se sou
cada traço do teu mundo
cavado em ti. e em mim
e agora:
quem é dono do cosmos
se tudo
o que era nosso
estava no alguidar?
e os pés. a caminhar
num absoluto luto
a dor da perda
a marcar o pino do sol
e a luz absoluta
a pedir uma virgem maria
um milagre...
também absoluto
para uma família absoluta
numa escolha ferida
manter a vida
é morder o ventre da morte
só morre
aquele que conta os dias
e esquece os nomes do alguidar
se me tocassem por dentro
ver-nos-iam gravados
nos ossos
saberiam: nasci em ti
por ti
mas morrerei por minha vontade
num cansaço absoluto
irremediavelmente ferido
nesta luta de ter um nome
onde o teu já não tem lugar
para que serve o meu
se vives em mim sem nome?
por que quer o padre
a minha assinatura
se o nada é só meu?
nenhum papel arde em branco
na cruz em que existo
respiro voz absoluta
carrego rugas absolutas:
iguais às tuas
às nossas
que um dia
talvez depois do dia seguinte
serão descobertas
não nasci pitbull
talvez poeta. sonhador
não apontei caminhos
os atalhos estavam numerados
por ti. para mim
procuro-te
nas sombras que restam de ti
nem que morra da procura absoluta
e se tiver que renunciar
ao que sou
que seja no vale dos judeus
morto
como um pulha
e se a honra se prostituir
que zé pelintra me proteja
pois eu te encontrarei
o teu nome será sempre meu:
com pecado ou sem ele
sou escorbuto das noites ímpias
escrevendo-te páginas absolutas
desesperadamente absolutas
ressuscito-te nas palavras
e nos livros que um dia escreverei
minguarei o meu amor
em cada minúscula
para que cresças
e se fores sombra de eufémia
não ligues
ela pariu um poema do pessoa
nunca esteve grávida
eu. pelo contrário
estou grávido de nós
do nosso nome
falo divino
barro do verbo
moldado a punho
escrevo-te
procuro o quanto te quero:
assim
como sempre foste
bom
absolutamente bom
que mais pode um nome ter?
tu és o meu socorro
é em ti que me aceito
e quando te represento
sou o sol
e sempre que há sol
há um retrato teu na parede
e séculos a arder
porque um dia louvaste
a vida
e se a vida não bastar
que nome nos salva do silêncio?
dedicado à família:
para quem me deu o nome
tu [pais]
que me fizeste ser
mesmo na ausência
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