.................................................................................não tirem o vento às gaivotas

12/07/2025

lições silenciosas de um pai e de um filho

 




tinha eu os meus 18 anos. mais coisa. menos coisa. quando conheci o meu amigo josé luís medeiros – na altura. começava a aproximar-se da irmã de um amigo… mas isso já é noutra história – esse amigo acabou por tornar-se meu cunhado. mas foi ele quem me abriu as portas daquela família – com o zé luís veio também a sua gente: irmãs. irmãos. e os pais – eram uma família de gente boa. respeitada. o pai. um verdadeiro cavalheiro. e a mãe. de uma simpatia desarmante – sempre me receberam muitíssimo bem. com calor humano. respeitando sempre a minha juventude. e a falta de saber – árvore boa não dá fruto mau. é isso mesmo. só que na altura eu acreditava que todas as árvores davam gente honrada e digna. o tempo trouxe as desilusões – o que vos quero contar ficou comigo para sempre. está na minha gaveta de ensinamentos. foi algo que me ajudou a ser o que sou hoje – o sr. medeiros. de vez em enquanto. convidava os filhos para tomar um café. eu como amigo também os acompanhava. e lá íamos no seu carro de seis lugares. um ford taunus 15M de cor vermelha. todos como se fôssemos para uma festa – nós éramos a festa. a juventude tem destas coisas. sem preocupações e sem medo do dia de amanhã – o problema. é que o sr. medeiros. nos últimos anos. talvez com a reforma. abusava um pouco da bebida. um homem quando perde o relógio biológico fica à deriva no tempo. às vezes é o trabalho que nos completa – fomos então todos para o bom jesus. ao comando do volante o sr. medeiros. seguia um pouco aos esses. por vezes demasiado mesmo. naquele tempo o julgamento popular era suave. o álcool era aceite. era uma droga boa. a polícia era pouca. e que eu me lembre. não havia bafômetro. o que pediam era a carta de condução e o livrete – quando estávamos a chegar ao santuário do bom jesus. já de noite. não distinguiu bem a estrada e entrou por um atalho em terra que quase nos fazia cair numa estrada mais abaixo – o filho em pânico gritou trava. cuidado. para. e o sr. medeiros. meteu os pés a tempo do desastre – e é aqui que começa verdadeiramente a história. quando se esperava um ralhete do seu filho. ou até que se sentisse envergonhado pelos seus amigos. não. tratou o pai com uma meiguice. com um carinho. não o reprendeu. nem lhe disse nada que o magoasse. pelo contrário. acalmou-o. à saída do carro ficou ao seu pé. e fomos então tomar o nosso café – os filhos não foram capazes de lhe dizer nada. trataram-no como se deve tratar um pai com fragilidades. afinal. com todos os seus defeitos. ou problemas. o álcool é muitas vezes uma doença. foi ele que lhes deu vida – foi talvez um dos gestos mais bonitos que a vida me ofereceu. e logo de um amigo – fiquei para sempre grato por esse dia. o zé luís ainda hoje é um homem de bem. e eu não acredito que homens assim apareçam por acaso. é preciso ter por detrás uma família também excelente. sem esse suporte ninguém envelhece a sorrir – gosto de escrever memórias. mas esta crónica não é só passado. é também presente. é gratificação por ter estado no lado certo no meu crescimento. estar bem rodeado é fundamental para envelhecer com esperança. e é também uma forma de mostrar aos meus filhos que o critério para se guardar os amigos não pode ser só festas e sorrisos – a nossa vida seguiu caminhos diferentes. mas o rasto da gente boa nunca se apagou e hoje. já envelhecido por fora. percebo que são estes bons exemplos que nos fazem crescer mais perto do bem. do céu se existir. ou do universo – também me faz lembrar o meu pai. era também ele um homem bom. o melhor que conheci na minha vida. e sei hoje que os meus filhos são também especiais. são homens bons. amáveis. carinhosos. preocupados sempre com os seus pais – apesar de todas as amarguras que a vida me trouxe. continuo a esperançar para o que vem amanhã


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