.................................................................................não tirem o vento às gaivotas

31/07/2011

cadáver





lucian freud





quando escrevo fico assim: sem alma. sem sorriso. sem olhar. sem saliva. só tenho ouvidos para  johann sebastian bach [orchestral suite no. 3]. a música antecipa a morte das palavras – sei que palavras morrem quando as separo do corpo que as guarda – escrevo como andorinhas fazem ninhos. uma palhinha daqui. uma folhinha dali. uma gotinha. um pedacinho de chuvinha. uma varanda protegida do vento norte e por fim o verão a dizer que tudo terminará com o outono – partem como palavras ao encontro de calor. de tempo. que se repete num outro lugar. uma outra varanda. um novo abrigo – a mesma forma de voar – na terra o mesmo jornaleiro. cava-a sem saber se planta uma semente ou a morte – encontrar palavras é dor – descobrir a palavra que é mais palavra deixa a boca sem ar. os dedos envelhecem. suspiram. suam. gritam. pedem clemência [não sou escritor]. agonizam. vomitam. depois caem as unhas. de seguida o cabelo. os olhos. a carne  e por fim surge um esqueleto que não conheço – sou eu nu. complemente nu e vocês a verem tudo em mim – eu sou como palavras mortas –



25/07/2011

doença mental e a cura pela palavra




                                                              a extração da pedra da loucura
                                                                               hieronymus bosch


arte – arte de escrever. escrever arte – com a minha arte de escrever quero dizer: estou cansado da arte que não é feita por homens que comigo partilham todas as palavras. estou farto. [ilustre casa de ramires] – a minha arte só precisa de papel. é minha. nasce da vida que vivi e do que colhi de quem passou por mim – escrever é. no fundo. dizer coisas. algumas dessas coisas encontro dentro do corpo. mas. em pânico. deixo-as cair em papel – confesso que não sou dono desta vontade de escrever. vem de dentro para fora. sem controle. sem filtros e sem limites – escrever é uma purgação. a minha forma de evitar o suicídio coletivo dos dedos. dos ouvidos. dos olhos. dos aromas. e até da boca. possuída pela força do vómito. que fala sem que ninguém a entenda – escrever é um estado maníaco-depressivo. faz sobreviver. dá sentido às palavras esquizofrénicas de um corpo são com uma mente louca – escrevo para me salvar. então parto como os cruzados no tempo das cruzadas. também quero conquistar o paraíso. mas sei. mesmo com pouca lucidez. que nunca terei setenta e duas virgens à espera no fim do texto - escrevo porque preciso de escrever. estou doente. diariamente injeto palavras libertadas de mim. daquilo que sobrevive em mim. na revolta. na amargura. na dor. na vontade. na expiação dos demónios que criei – escrevo palavras desprendidas. não das mãos. mas do meu inferno. uma vontade de expiação que incendeia as mãos. e quando o mundo arde. eu fico em paz – mas a cabeça já não está igual. sinto-me esburacado. desfigurado. amargurado. e os amigos perguntam: ele escreve o quê?  mas para os corvos. eu sou apenas alguém que sabe juntar as letras do abecedário. e gargalham – bem queria saber escrever arte. mas o que sinto dentro desta cabeça é confusão. o sujeito em luta com o predicado – saudável. penso nos momentos em que sou capaz de dizer: não escrevas mais – mas não adianta. este cancro cresce. não consigo estripá-lo. talvez um dia me mate. ou talvez me espere um colete de forças. paredes brancas. e seringas a baloiçar. entre cair e não cair. e a salvação venha de um homem vestido de branco a dizer: tome tudo de uma golada. ou corte o fio de uma seringa. e nunca mais reconhecerá as letras. nem a vida. nem os amigos – no fim. restará apenas a esperança de morrer voltado para o mar. olhando uma gaivota cinzenta a cortar o vento de norte para sul – sou louco por palavras que significam tudo e nada ao mesmo tempo. talvez esteja doente. talvez maníaco-depressivo. mas nos textos encontro a única salvação possível: um mundo onde a arte de escrever me salva do meu próprio silêncio – não quero parar de escrever. quanto mais textos escrevo. mais me liberto. menos pessoas sabem que. no interior desta doença. sobrevive o egoísmo – escrevo por mim. para mim. escrevo para ser feliz. para estar longe dos outros e da arte vazia dos que me dizem: bom dia. como se isso bastasse para curar a alma – quero raiva para dizer tudo o que me faz doente. quero raiva para sobreviver ao pesadelo de uma morte que se repete diariamente dentro de mim. do funeral das palavras. da sua cremação. e das cinzas lançadas ao mar no meio de gargalhadas – escrevo. não como vosso escravo. nem vosso dono. escrevo porque estou no abismo. e sempre que estou no abismo. sou feliz. não há nada para pensar nos abismos. a não ser escrever o que escorre nas mãos – todos os que gostam de escrever sabem que só no silêncio se é feliz. não há palavras. há ideias silenciosas. não há pessoas. há apenas luar e estrelas – e um dia. o homem da barca chegará. e eu. com os meus escritos na boca. farei embarcar uma parte de mim. a outra ficará aqui. a falar com as palavras – talvez hoje eu esteja lúcido. e as palavras não morram de loucura  


23/07/2011

josé saramago e pilar del rio



                                                                       josé saramago 


tal como saramago não tenho medo da morte - tenho medo do que deixo por fazer. do que não fui capaz de escrever. e das folhas que deixei em branco - tal como ele. quero ainda mais tempo. mais vida - quero falar o que não sei escrever. ou escrever o que não sei falar 

 

* josé e pilar - os dias de josé saramago e pilar del rio num filme de josé gonçalves mendes

 

18/07/2011

morto por o complemento direto e indireto



                                                           foto do euleuterio ramos


tenho vontade de matar complementos diretos e indiretos. atrapalham o andar pelo tamanho que ocupam – no bolso uma vida agarrada a palavras que nunca usei – palavras que não servem para nada. nem como pedras que se podem arremessar – o embaraço é o de não saber desenvencilhar-me dos complementos. entulham-me os bolsos. sem utilidade. nunca encontram uma preposição: a ou ao. ficam sempre no eu – mas a vida não para – mascarados de probabilidade tornam-se complementos relevantes. influenciam a forma como equilibro a serenidade do que antevejo como negativo. e do sentimento que produz em mim por antecipação – fico aborrecido. impertinente. irritado. obrigado a fazer uso de um juízo que produzo cada vez menos. mas que ainda preservo. permitindo controlar os impulsos irracionais – mas a vida está cheia de complementos que não complementam nada – ah! complementos que não complementam. ninguém escreve uma expressão destas num texto que quer falar de complementos diretos e indiretos. que existem sem valor literário para quem ouve. mas. infelizmente. gritam dentro de mim. às vezes dentro das palavras. como sinos a tocar a defunto. até fazer sangrar mãos e ouvidos. de quem como eu conhece a dor de não ser ouvido – não tenho coragem para dizer o quê? ou quem? mesmo que os verbos assim o exijam – o que sei. é que ainda escrevo há muito pouco tempo. e a gramática é tão extensa e confusa. por mais livros que leia. há sempre mais um complemento oblíquo. um modificador verbal. e quando damos por ele. temos o sujeito e o predicado à luta. cada um com a sua razão. a vozeirar e gesticular que cada um deles é mais importante. é então que o vocativo entra: ó. meus amigos! são os dois importantes. basta que se dirijam à pessoa certa. basta alterar o modificador moral. e dizerem: somos dois tolos. lutamos hoje. mas não o voltaremos a fazer – quando crescemos mudamos a voz. fica mais grave. mais indiferente ao sentimento. eu não mudei de voz. mudei de ouvidos. é assim que cresço – quero ouvir-me na boca dos outros – muitas vezes não é fácil entender a construção gramatical. talvez seja defeito meu. burro velho não aprende línguas. mas que posso fazer? é penalizador sentir as palavras na boca sem energia. e nos lábios o medo. deixámo-las partir como se atirassem de um precipício. e esperamos pelo som do impacto – às vezes morremos com as palavras e pensamos: não escrevo mais – todas as palavras querem a sonoridade correta. o sentido certo. e também orgulho e honra no que transmitem – não podem ser estranhas aos ouvidos de quem as ouve – sou um estranho aos ouvidos de quem ouve. as palavras. sem arte e trabalho. mais cedo ou mais tarde. ficam em silêncio para sempre – começo a tentar acreditar que estes complementos talvez façam parte de mim. talvez tenham crescido com as pernas. com os bolsos dos calções com suspensórios. talvez por não acreditar na vida depois da morte. e saber que só a escrita me perpetuará – mas se não for capaz de entender a arte de escrever. talvez a solução seja cortar-me pela cintura. deixar as pernas levar os bolsos e com eles todas as palavras que guardei no seu interior – o tronco. mãos e cabeça descansariam então em forma de busto. cinzelado em granito preto. pousado num prado verde. em paz e com a inscrição gravada: aqui jaz um homem que queria ser escritor e foi morto pelo complemento direto e indireto – paz à sua alma – os bustos não falam e também não têm bolsos 



11/07/2011

o peso do mar e da memória






1.

sem forças. preso ao destino. conto o tempo. o cheiro a mar envolve-me do lado direito. e à esquerda. na montanha. as casas caem em cascata – nascem as primeiras luzes. dentro das janelas a solidão desvanece com o nascer do dia. e as suas gentes olham para o mar. interrogando-se porque que razão é tão grande se eles são tão pequenos – também o meu pensamento cria memórias em cascata. a diferença é que não estão viradas para o mar. mas para mim – dentro do corpo. a realidade persiste. é dentro dele que confio a minha sanidade mental. enquanto pertencer ao que lá guardo. existo – quando pego no sono. a consciência fala-me ao ouvido: sampaio. o mar está no olhar. tal como as memórias que guardaste – hoje. abro memórias tão grandes quanto o mar que se vê das casas. não em extensão. mas em ausência. carregadas de saudade – o dia levanta-se e a noite cai. eu levanto-me pela manhã. e caio pela noite. e pergunto-me no escuro: onde tenho as mãos? porque não sou capaz de abraçar o que vejo às escuras? tenho imenso nestas mãos. até os dias que me trouxeram até ao dia de hoje. que é como quem diz: só existo porque os outros me fizeram existir. mas no mar sou pequeno. insignificante. e o que valho para além de mim? só a vontade de escrever. escrever o que se fez saudade. o que te faz cair na dor sempre que escurece – só as palavras saberão dizer o tamanho da dor que guardo nos olhos – o mar em mim representa tudo: a família. os amigos. o medo. a dor. a saudade. até as palavras que gostaria de escrever e não saem de dentro de mim. talvez seja pelas casas caírem em cascata. talvez porque nasci assim e não posso ser outra coisa – nos dias de calmaria. fico com medo. tudo em mim é confusão. as mãos no ar. a cabeça também. e até as palavras são folhas de outono. caem sem destino certo. entregues ao vento. levadas para onde já não as posso encontrar – silêncio em terra. tempestade no meu interior. foi assim que me acostumei a viver – mas hoje. eu caio por mim como as casas caem em cascata. estou rodeado de um silêncio que é mesmo silêncio. e quando o silêncio se esconde dentro de si. eu sou obrigado a escrever todas as palavras que nasceram de beijos e abraços. e também aquelas que me obrigavam a dizer: gosto de ti – nasci sem boca. estas mãos que me caem contra o papel não foram feitas para escrever – mas insistem – repito tantas vezes: sampaio. os dedos são grossos. e os lápis são sempre tão frágeis. porque insistes? para sobreviver ao silêncio das noites – malditos lápis. partem-se sempre que procuro uma outra palavra mais difícil. ou apenas para alguém especial. e que não sei dizer com a boca que tenho – que vergonha nascer sem boca. que vergonha não ter forma de pronunciar palavras que bem podiam ser abraços – quando quero falar. choro. e quando choro. quero esconder-me dentro do mar. que penso ser meu por usucapião – nunca saberemos viver um sem o outro

 

2.

aqui estou. parado. a olhar para os anos nos olhos de quem me gosta. e gostam há tantos anos – como é possível gostar de alguém como eu durante tanto tempo? dizem que é amor. dizem que gostam de mim com um amor incondicional. e eu fico a olhar o mar e as casas com luzes. com gente dentro que nunca vi – saio de dentro das luzes e fico apenas com o belo: o meu mar – olho apenas com os olhos: quase redondos. quase castanhos. quase transparentes. quase pêndulos num corpo que não cai. nem no mar. nem dentro do que sou – estes olhos são um castigo de deus. nunca estão em silêncio. engolem o futuro. dobram-me o corpo em dor para um tempo que ainda não chegou. tornam o futuro presente – silêncio. eu e o mar. anulamos o barulho um do outro. as bocas fechadas guardam as últimas palavras. apenas os olhos falam. é preciso enganar o tempo.  enganar as pálpebras. enganar as noites que ainda faltam chegar. hoje é o dia perfeito para se ouvir tudo. até o silêncio do mar – ouço o meu primeiro choro. a primeira palavra. o primeiro passo. o primeiro medo. a primeira oração. a primeira reprimenda. a primeira bênção. e o tempo sempre a ir e a vir com mais memórias. tal como as marés – dentro deste ir e vir do tempo nada do que está feito pode ser refeito. nada do que foi dito pode ser silenciado. nada do que me trouxe aqui desaparecerá no mar para voltar a nascer – sou feito de água. sal e esperança – um dia. estes meus olhos castanhos. hão de encontrar sossego. uma ilha rodeada de certezas – tal como um corsário do passado. roubo lugares para procurar tesouros que nunca encontrei – balanço dentro de mim. e interrogo-me: caio para que lado? não sei. talvez para os dois lados. para me equilibrar – estou completamente perdido dentro de tudo o que os olhos veem – e eu aqui. preso a um corpo que não para de crescer. sem parar de querer o que nunca vai ter – sou o que abril me deu

 

3.

amarro as mãos e sinto o coração a bater. e eu ali a olhar para os anos. anos que gostei. anos de orgulho. e eu ali. apenas filho. de mão dada. a equilibrar-me para não cair. como se estivesse a dar os primeiros passos – mergulho ainda mais fundo no tempo. o passado acontece como se sobrevivesse apenas para aquele instante – ao lado. sentado. o meu pai sorri. só lhe faltam as palavras. está ali. tudo o que gostava dele está ali. a tombar para o meu lado. só o braço deixou de acenar. aquela maleita quase te levou. e até o sorriso continua perfeito. pendurado no bigode que mais não é do que uma linha que separa a boca do corpo magoado – apetece-me ficar aqui para sempre. tenho aqui tudo. até o que pensava ter perdido – não souberam que o tempo também se acaba – tudo acaba. agora sei que tudo acaba. e o meu momento vai acabar – aperto as mãos com força. as mesmas que me acarinharam nos primeiros dias da vida – um dia acordei e não as vi mais. tinham fugido para sempre. e eu sem saber parti também com elas – nasci para não ser quase nada. apenas mais um menino que falava sem querer ser ouvido. demasiado novo. e para te zangar não queria dizer: sou teu filho porque fiz isto. a minha obra vai para além do que os teus olhos alcançam – mentira. não tinha nada para mostrar. nada para dizer que te orgulhasses. só tinha o teu sorriso guardado em mim. invisível para os outros – sabes. mãe. tu que me viste ficar sem pai. este nosso coração está sempre a doer – dói pela perda do pai. noutro dia dói porque preciso de lembrar que eu sou carne da vossa carne. e não suportaria perder esta dor – há ainda outros dias em que dói pelos teus netos. agora também pelos bisnetos. é a nossa família mãe. somos nós – perdoa-me mãe. mas não sou capaz. não fui capaz de aprender o que tu aprendeste. o que tu fizeste. o que tu sempre me tentaste ensinar. nasci diferente. ando por aqui ainda sem saber como ser filho. bem sei que para ti não é importante. sempre irás encontrar uma razão para dizeres: é meu filho e eu gosto dele assim – mas mãe. há os meus filhos. e estes precisam de saber que o teu filho não soube levar-te à boca tudo o que tu merecias. precisam de saber que os avós são a única razão para hoje terem o vosso nome – prometo-te que um dia saberão dizer: chamo-me assim porque os meus avós se chamavam assim. e os pais dos meus avós também se chamavam assim. e nós nos chamamos assim porque somos uma família – mas a tua carne já não resiste como antigamente. já não é igual. está cansada pelo tempo. está ali apenas para te proteger os ossos que já não são ossos. são raízes amarradas ao ar que respiramos – não quero que descubras que o tempo se faz das batidas do coração. quero sentir as tuas mãos. quero amarrar-te para sempre dentro destas mãos que estiveram tanto tempo sozinhas. quero afagar a tua pele que é também a minha. e ver no teu olhar que as dores que dizem que estás a envelhecer não existem quando as minhas mãos amarram-se às tuas – não desistas mãe. não expulses o tempo. ainda quero dizer-te tantas coisas. coisas que ainda não consegui dizer. preciso de envelhecer um pouco mais. ficar mais sábio. mais tranquilo. e entre tanto. tu também ficas mais bonita – não compreendo. parece que um filho só aprende a falar quando o coração deixa de bater – encosto a cabeça no teu ombro e ouço o nosso sangue a correr como se houvesse festa. e ouço: deixa cá ver um beijo meu filho – ainda tens tempo para me ensinares a dizer todas as palavras que mereces – foram tantos anos mãe e eu sempre imaginei que os corpos não partiam. e as palavras não faltariam. e o tempo resistiria. mas é tudo mentira minha mãe. a vida mentiu-me. eu também estou a envelhecer. e eu. desesperado. com medo de não chegar a tempo – e foi assim que disseste: quando deus me levar. quando estiver de partida para o céu. vou pensar que estou a voar. a andar de avião – eu também minha mãe 




04/07/2011

eugénio de andrade : poema à mãe



                                                                   eugénio de andrade



No mais fundo de ti
Eu sei que te traí, mãe.

Tudo porque já não sou
O menino adormecido
No fundo dos teus olhos.

Tudo porque ignoras
Que há leitos onde o frio não se demora
E noites rumorosas de águas matinais.

Por isso, às vezes, as palavras que te digo
São duras, mãe,
E o nosso amor é infeliz.

Tudo porque perdi as rosas brancas
Que apertava junto ao coração
No retrato da moldura.

Se soubesses como ainda amo as rosas,
Talvez não enchesses as horas de pesadelos.

Mas tu esqueceste muita coisa;
Esqueceste que as minhas pernas cresceram,
Que todo o meu corpo cresceu,
E até o meu coração
Ficou enorme, mãe!

Olha - queres ouvir-me? -
Às vezes ainda sou o menino
Que adormeceu nos teus olhos;

Ainda aperto contra o coração
Rosas tão brancas
Como as que tens na moldura;

Ainda oiço a tua voz:
Era uma vez uma princesa
No meio do laranjal...

Mas - tu sabes - a noite é enorme,
E todo o meu corpo cresceu.
Eu saí da moldura,
Dei às aves os meus olhos a beber.

Não me esqueci de nada, mãe.
Guardo a tua voz dentro de mim.
E deixo as rosas.

Boa noite. Eu vou com as aves.