.................................................................................não tirem o vento às gaivotas

12/01/2023

quinta-feira em júpiter









quinta-feira em júpitertodos os dias da semana tem a sua energia. o seu misticismo. o seu legado histórico. e até as suas lendas – no calendário romano a quinta-feira pertence a júpiter. com a sua preponderância positiva nos negócios. na fortuna. na bem-aventurança. e na felicidade – mas para mim. o que dou como certo. já que com o astro nunca vi fortuna. é que depois de uma quarta-feira. aparece sempre a quinta-feira. e depois da quinta-feira chegamos sempre a uma sexta-feira – é esta regularidade dos dias da semana que me deixa aturdido. os cristais dos ouvidos baralham-se. fico tonto e em desequilíbrio. brutalizo-me. e pergunto: porque não posso eu escolher o dia em que quero viver. digo melhor. ou resistir à morte – bem sei que não posso mudar este ritmo caquético dos dias da semana. só me resta aceitar esta inevitabilidade babilónica. romanizada – enquanto não chega a sexta-feira interrogo-me: qual o melhor dia da semana para morrer? e qual a melhor idade? pensei logo nos cem anos. um número redondo. bonito. com cem anos podemos morrer em qualquer dia da semana. encaixamos sempre bem. o pessoal já está farto de nos mudar a fralda e a algália – já ontem era tarde – na igreja o luto é feito de conformismo. e ouve-se dizer: tinha que ir um dia – ninguém fica cá para semente – sorte já teve ele. viveu até a junta da colaça do coração partir a meio – o fígado mais parecia um mata-borrão. já não distinguia água do vinho – os rins… uns passadores. cheios de calcário – e os pulmões… rangiam como portas desengonçadas – o que tinha de bom era a dentadura.  era nova. e como já não conseguia roer carne vermelha. está impecável. bem a podem por no OLX – a outra alternativa é morrer novo. e acredito que o melhor dia seja ao domingo. está todo mundo sem fazer nada. na sorna. podem-se espantar durante mais tempo: sabes quem morreu? sabes? o desgraçado bateu a caçoleta. foi na sua vez – coitadinho. esticou o pernil – sabes quem já está a fazer tijolo? nem vais acreditar em quem foi para o caralho. que neste acaso não é ninguém que tenha ido para a pequena cesta no alto dos mastros – e aí. percebemos que o luto é mesmo dorido e carregado de um negro absoluto. com a igreja mergulhada em palmas e raminhos de despedida. lavada em lágrimas. pesarosos. doridos. alguns arrasados com a tragédia dizem: coitado. ainda tinha tanto para dar ao mundo. deixa a mulher tão nova. o que vale é que os filhos já se governam – ele não tinha bom feitio. mas era filho de deus – quando mordia era um pitbull. raios – tinha o coração na boca. não ficava nada por dizer – não era mau homem. tinha-se que saber lidar com ele – mas como ainda estou vivo. o que vos digo. é que mais vale morrer à procura de glória. do que morrer em piedade – mas que se lixe. saibam todos que a minha morte será anunciada no dia em que deixar de escrever. e para sossego dos amigos. já que com os inimigos não conto. aviso já que não haverá funeral nem missa do sétimo dia – em boa verdade vos digo. vale muito mais um defunto rico e com saúde. do que um defunto pobrezinho e doente – e com esta máxima me despeço até que o óbito se confirme 


 

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