.................................................................................não tirem o vento às gaivotas

27/06/2025

não fiques parado

 




não fiques parado

se não souberes correr

caminha

se não souberes caminhar

rasteja

se não souberes rastejar

sonha

mas não pares

ainda que não saibas como

segue inteiro

grava-te no tempo

escreve-te no mundo

sonha

 

vai

vai sem partires

e volta sem chegares

 

não fiques parado

se o medo te sufocar

ou a timidez te silenciar

lembra-te:

um dia o corpo falecerá

o teu nome será pó

e os sonhos esquecidos

por isso vive

caminha. erra. sonha

o resto nasce de ti

 

vai

vai sem partires

e volta sem chegares

 

confronta-te por dentro

remexe-te

enraivece-te

enfrenta-te com coragem

e quem sabe

um dia

os medos cedem

as pernas aprendem a correr

os sonhos começam a voar

 

vai

vai sem partires

e volta sem chegares

 

e tu. humano nobre

alma livre

serás lembrado

não pelo erro

não pela glória

mas por viveres sem temor

 

vai

vai. mesmo sem partires

volta. mesmo sem chegares

vai

 


09/06/2025

um único dia certo

 



tal como simone de beauvoir. a impressão que tenho é de não ter envelhecido. mas ao contrário dela. eu ainda não me instalei na velhice. apenas envelheci. por fora. talvez um pouco. mas por dentro estou parado num dia. no dia em que ainda vivo – às vezes. quando estou mais ousado. viajo ao verão de um único dia quente da juventude. e paro. e também me interrogo: o que trouxe desse dia para o presente? e a resposta é: este único dia que me habita – pelo meio. nada. nada porque estou lembrando o agora. porque o agora é o único momento que reconheço como real. e nele sou jovem. por dentro. e no espelho apenas a verdade de tudo o que passei para chegar ao único dia em que me dou como vivo. este em que escrevo. e continuo jovem. porque sei que em mim reside a soma de todos os momentos. sou o resultado do que construí e ninguém viu. sou a família que formei. e também as minhas contradições. os amigos que conquistei. e os que perdi. o que aprendi. e o que deixei de aprender por não ter tido tempo. ou por leviandade – não se pode aprender muito num dia de vida. é tudo tão difícil. somar é apenas juntar. e o que sou com esta soma? sou este dia em que vivo. e também cultura. isto que vos escrevo é cultura. e é vasta. por ser feita inteiramente num dia – sou também um vazio que por ser isso mesmo. ainda nenhum dia conseguiu preencher. nada se vê do que guardei em mim. por isso é que os que ainda não fizeram as contas do tempo. acham que envelheci. mas não. eu apenas vivi o que somei para dentro de mim. eu nunca envelheci – ainda me movo com a leveza de outrora. só que hoje. tudo acontece num único dia. e se no passado sonhava dia e noite. agora sonho só quando tenho a certeza de que nenhum sonho se prolongará para amanhã – por fora sou apenas o que ninguém vê. tentam ler-me por sinais que não compreendem. e medem os meus dias a partir do dia em que vivo eu apenas sei que este momento que estou a viver é o único que dou como certo. vivo. tudo o resto. não sei. às vezes foi um sonho. outras um pesadelo. e a única prova de que vivi. é este instante que é meu – está quase noite. e vou ter que fechar os olhos. e por certo tenho as estrelas. mesmo que não as veja. estarão num lugar onde nunca fui. tal como o dia de amanhã. também nunca lá foi. mas se para as estrelas sorrio e aceno. para amanhã. aplaudo e agradeço. porque se lá chegar. será o único dia certo. aquele que me pertenceu por inteiro. porque o futuro. está na minha pele. nas rugas e nas cicatrizes. mas dentro eu sei que a qualquer instante o dia seguinte se perderá. e eu ficarei para sempre num único dia. onde vivi e deixei de acrescentar os que os outros me dão. recolher-me-ei entre sombras. e nesse descanso. serei para sempre inteiro em mim. e tudo o que alcancei ficará ali. naquele fim. e acredito. por ser um humano do universo. que será naquele microssegundo que fundirei a alma com a liberdade para sempre – e foi este mundo que construí. e nele deixei tudo o que era meu de verdade. almas minhas que como eu nunca envelhecerão. o que vem de nós não envelhece. nunca as libertei por mais que voassem para longe. ninguém consegue desligar-se de parte de si sem se magoar. ou perder-se em procuras desencontradas – se um dia me instalar na velhice. o que não creio aos meus olhos. em mim tudo será ausência do que sou. porque pela noite. as estrelas por lá continuarão. e eu. se não souber voar. sonharei. e cubro-me com a certeza do dia que vai chegar – sou apenas este dia. não tenho idade. tenho um único dia para me afirmar vivo. e um homem vivo respira. voa – e assim fiz-me gaivota. e o vento fez-se em mim poesia. tudo o resto perde-se no tempo. e todos. mesmo aqueles que ainda não somaram o tempo. vivem um único dia. aquele que estão a viver – tal como comecei esta crónica. termino também com um pensamento de simone beauvoir: a pessoa não é nada além do que faz de si mesma

 

ps – dedico esta crónica aos amigos que me aceitam tal e qual como sou – sei que às vezes não é fácil – mas é precisamente por isso que vos agradeço: os amigos são as peças do puzzle que. peça a peça. completam o que sou


28/05/2025

deambulações noturnas LXVIII




vicent van gogh


depressão lenta. tão lenta que já não é depressão. é apenas repressão violenta para que o sol não nasça


 

24/05/2025

 

 

1. código invisível

sei que cheguei ao dia de hoje. mas. na verdade. não sei se chegarei ao amanhã. a vida é uma tômbola. com prémios valiosos e ingratos. e fico a pensar: somos nós que escolhemos o prémio. ou será o prémio que nos escolhe? às vezes quero acreditar que o nosso destino já vem acertado com a hora de nascimento: nascemos. e na primeira golfada de ar recebemos um número em código de barras. como se. naquele instante. o percurso ficasse definido. e nos marcasse para sempre – a partir daquele momento já não podemos fazer mais nada. as virtudes e os defeitos estão inscritos no DNA do código – não há livre arbítrio. somos o que somos. e por mais que tentemos ser diferentes. não mais será possível – noutras ocasiões. acredito que somos nós a escolher o caminho. não todos. mas aqueles que já vêm associados aos nossos pais. afinal nós somos o somatório dos dois. por vezes somamos o melhor deles e acabamos por nos acrescentar. somos um pouco melhor do que a soma das partes. outras. somamos as partes piores e acabamos por apanhar uma ruela em vez de uma avenida. e os pais dizem: não sei a quem sai este miúdo – claro que para isso vai contribuir muito as opções que fazemos durante a vida. o meu lema é sempre este: faz o que está certo no momento certo. mais cedo ou mais tarde serás recompensado – é verdade que há quem faça asneiras a vida inteira e nada lhes aconteça. é o tal fator que não controlamos. às vezes é sorte. outras é um acaso cruel – ter o tempo a nosso favor nos momentos certos é muitas vezes a razão de estarmos vivos. vamos ao dentista por causa de uma cárie. e ele descobre um cancro ainda numa fase inicial. seis meses mais tarde estaríamos irremediavelmente mortos – a sorte é o pêndulo que faz com que o nosso coração bata certo mais tempo – mas muitas vezes interrogo-me. por que raio é que quem realmente merece viver parte sempre primeiro. enquanto os trastes ficam? nos dias em que estou no melhor de mim. como canta a marisa. acredito que é apenas por terem menos sorte. outras vezes. prefiro acreditar que essa gente menor consegue ludibriar o azar. e até passá-lo aos melhores. ladrões de sorte. que se alimentam da dos outros – lembro-me perfeitamente do meu tio joão. cinquenta anos. uma alma boa. inteligentíssimo. com uma paciência de santo para me aturar. tinha eu os meus vinte e poucos anos. revestido de sabedoria. vaidoso. arrogante. dono do mundo. e ele. sentado num sofá. sustentava toda a minha soberba com o seu shot de whisky. e gole a gole. lá me ia ouvindo no meio do meu ruído. aturando-me. como se já soubesse que a parvalhice da juventude passa com o tempo – e. de um dia para o outro. partiu. sem uma palavra. ficámos sem saber o que fazer. sem perguntas. sem respostas. só ficou o silêncio – gostamos sempre de dizer que deus o quis levar para junto de si. como se ele lhe desse atenção. era um homem livre. da esquerda marxista. e os afazeres de deus não eram coisa que o preocupasse – não sei se foi ter com ele. mas a família perdeu-o e eu senti a sua falta – depois. não haveria forma de escrever esta crónica sem o mencionar. o meu pai. um homem generoso. bondoso. digo. verdadeiramente bom. com uma capacidade única de empatia com quem quer que fosse. sempre com uma palavra gentil para oferecer. genuinamente preocupado com a sua família. com os seus colaboradores. honestíssimo. mesmo quando lhe custava caro. nunca se desviava do que era justo. presente para os mais vulneráveis. com uma ligação natural para compreender os mais novos. especialmente o seu filho. a seu lado não havia tristeza. ele era paz. era luz. morreu já com alguma idade. porque ninguém é novo aos setenta e três anos. mas para nós. já se despedira quatro anos antes. e nesses quatro anos. foi submetido ao impensável. agonizou até deixar de ser ele. e passou a ser apenas dor – foi muito difícil acompanhá-lo nesse período. confesso-vos. muitas vezes quis pôr fim àquela dor – não merecia – a doença foi tão cruel que nunca mais envelheci com elegância. envelheço com medo – mas há pouquíssimo dias uma pessoa que conheci recentemente. não posso dizer que era chegado. mas já tínhamos jantado juntos na companhia de amigos. com cinquenta anos. deitou-se e o coração pregou-lhe uma partida. parou – não fumava. não bebia. atleta. elegante. praticava desporto. tinha um comportamento exemplar. e por comportamento exemplar quero dizer: viver segundo as regras de uma vida saudável – só não sabia que precisava de ter mais cuidado com a própria sorte. talvez mais análises. mais exames. daquelas que os que prevaricam fazem sem que os justos saibam. e assim. talvez. ganhar mais tempo – ninguém merece morrer com cinquenta anos. principalmente quando um homem deixa uma filha menor. não há justiça. como se deixa uma mãe sozinha para acompanhar o crescimento de uma filha? quem lhe vai segurar a mão quando ela subir ao altar? quem a vai ver crescer? quem a vai proteger? nunca poderá ser o pai. nunca mais poderá dar um conselho. receber um último beijo. ou ouvir um 'gosto de ti'. não terá direito a uma despedida. nem mesmo a um 'até já' – neste mundo não basta fazer tudo certo. às vezes desperdiça-se o valor silencioso de cada dia. e os mais sensatos. por vezes. não têm tempo de perceber que algo não está certo

 

2. carolina e as ausências

eu não sou um homem crente. às vezes tento. mas não consigo. porque haveria deus de me dar atenção? porque haveria de eu ser diferente dos outros? se por cá ando é apenas por uma questão de sorte. ou pelo código de barras. ou talvez o meu lugar no nível seguinte ainda me esteja barrado. não ganhei os anéis douradas necessários. não sou o famoso ouriço azul. o sonic. ou não terminei a minha missão. algo que ainda falta cumprir. não sei. nem quero saber. não tenho a mala feita. ainda quero dar mais alguns abraços. cumprir a minha prova de vida com a minha família. com a minha nova neta carolina. nome de minha mãe. levar-lhe a minha voz. a pele. mostrar-lhe o sorriso. falar-lhe dos bisavós. de nós. do sentido da nossa família. mostrar-lhe o meu mundo. os lugares onde fui. e os que me faltaram ir por falta de tempo. trepar a uma amendoeira em flor e apontar-lhe as estrelas. uma é dela. gravei-a com um S grande. S de sorte. de saber. de sentido de responsabilidade. de sensibilidade. de sacrifício pelo que é certo. um S grande de sol. luz. porque todo o caminho tem de ser trilhado com luz – por isso não entendo porque leva deus as almas justas mais cedo. se deus nos ama. se nos perdoa tudo. se aos seus olhos nenhum vale mais do que outro. então qual será a razão para nos fazer sofrer tanto. porque deixa órfãos. filhos condenados a viver para sempre com a ausência inesperada dos seus protetores – crente ou não. o que peço é que a carolina cresça sempre resguardada e amparada pelos seus pais. que sejam o seu farol. iluminando-lhes o caminho com saber e ternura. e que assim a ajudem a tornar-se numa mulher adulta. feliz e realizada


 3. a flor que deixamos

e aqui cheguei. hoje. perdido em interrogações. cansado de procurar respostas em sítios onde só crescem dúvidas. mas há momentos. principalmente nos dias em que sou um bocadinho crente. quero acreditar que a nossa vida é um jogo. tipo o sonic. e que durante a vida vamos apanhando anéis. e quando atingimos uma certa quantidade. passamos para outro nível. é como se. ao nascer. entrássemos noutra etapa de existência. isto é. quando tivermos cumprido o percurso com distinção: ética firme. moral íntegra. fomos justos nas escolhas. generosos nos gestos. leais nas intenções. e amámos com verdade. com entrega. com tudo o que sabíamos dar. então. deus. ou o universo. ou no que acreditarmos. chama-nos para uma outra etapa – e partimos. ficamos saudade. fazemo-nos fotografia para sempre. calamos os gestos. os sorrisos. os abraços. e se tivermos vivido com inteireza. em certos momentos. voltamos à vida nas lágrimas – a recordação é a única lápide que não se apaga – depois. fico a pensar. mas há exceções. como a teresa de calcutá. mahatma gandhi ou chico xavier. e interrogo-me... por que razão permanecem essas pessoas mais tempo entre nós? não sei. ninguém sabe ao certo. mas quero acreditar que essas almas são… um tipo de pastores. que conduzem as ovelhas pelos prados. dão-lhe um propósito. protegem-nas dos perigos. e juntam-nas para que. unidas. se tornem mais fortes. que não se tresmalhem. que não se percam por caminhos erráticos – são estes guias de bondade na terra que nos conduzem. sem nos forçar ao lado certo das coisas – são eles que nos ajudam a encontrar a sorte mais facilmente. a corrigir caminhos. e muitas vezes. são também eles que nos ajudam a encontrar os companheiros certos para a nossa jornada de evolução na terra – sem as pessoas certas nunca seríamos quem somos. nunca deixaríamos saudades. ninguém sentiria a nossa falta na hora da despedida. ninguém choraria por nós – nós chegamos a este mundo como semente. e semente deixámos. o que levamos connosco é o sentimento profundo de que um dia fizemos uma flor sorrir. às vezes um jardim – nada mais

 


16/05/2025

a inveja é um visa vencido

 

 


um invejoso nasce amargurado. cresce frustrado. e envelhece depressivo. para mais fácil compreensão. como li há uns dias numa publicação do facebook. diria que é um transocial: nasceu com alma de rico num corpo de pobre – haverá mal pior do que estar encarcerado num corpo sem um cartão visa? para o invejoso esse castigo é a mãe de todos os castigos – resta-lhe a mentira. a desculpa repetida. o azar constante. o casamento trágico. e mais uns quantos dissabores. com amigos. vizinhos e colegas de trabalho – o mundo é uma treta. sobeja apenas energia para não fazer nada. para encontrar um duende que não resolva a vontade de prosperar. mas a fuga para o futuro num sofá – felizes daqueles que nascem pobres num corpo igualmente pobre. como a maior parte dos humanos – este pobre. frequentemente ignorado e incompreendido. tem apenas um cartão de débito. e o hábito de ver o saldo todos os dias. não vá um vírus roubar-lhe a dignidade para o mês – com a barba por fazer. pelos crescidos e ensarilhados. tal como os dias. pele desbotada. pálpebras caídas. cabelo esgadelhado e a pedir chuva. resiste com a sua cruz – sorriso apagado em meia dúzia de dentes soltos ao único céu que conhece. falta de colgate? pouco importa. já não encontra necessidade de sorrir. a vida é apenas temor – calças esfarrapadas. mas na moda. sapatos cambados a fazer pandã com uma camisola tingida num amarelo desmaiado. como a sua pele. e um número estampado à frente: 176-671. parecida com aquelas que usavam os irmãos metralha nos antigos almanaques da disney – afirmaria com toda a amplitude da palavra: um homem amarrotado. por dentro e por fora – desanimado com a existência miserável que o cartão de plástico lhe oferece. quase sempre sem saldo mesmo trabalhando sol a sol. por onde passa o alarme ecoa sempre. como uma sirene a anunciar perigo. e quem se cruza com o pobre amarrotado. rapidamente deita a mão aos haveres. não vá o desgraçado sofrer do mal da mãozinha leve – bem podia ser um foragido da cadeia de vale de judeus. e nada ficaria a dever a uma noite de halloween. tudo nele é terror e medo – mas não. é apenas um dos muitos homens que trabalham duro. para poderem dar apenas mais um pouco aos filhos do que os seus pais foram capazes de lhe dar – mais um escravo da industrialização. da economia global. e agora da IA – o seu maior defeito é não ser invejoso. se fosse. possivelmente. já teria um visa dourado na mão – nada como ser invejoso. esta espécie sobrevive à custa do desenrasque.  da aldrabice. e da chico-espertice – um invejoso vive em permanente desassossego. numa raiva constante. e ao fim do dia descansa no inferno ao lado de satanás – se o amigo ou vizinho faz aviõezinhos de papel. é porque quer ser astronauta; se joga o euromilhões. é porque quer comprar o iate do abramovich e estacioná-lo na rotunda mais próxima; se assopra preservativos. é porque quer ser balonista; se abre os braços. é porque quer ser gaivota – um invejoso é uma alma extraviada. doente. vê nos outros o que realmente medra dentro de si – na vida de um invejoso só há ambição desmedida. doentia e perigosa – a cobiça medíocre de um invejoso nasce da sua vaidade – temam os invejosos. mas não se deixem desumanizar. é preciso viver. acreditar na solução da raça humana. e nos entretantos. proteger os bons do mau-olhado. um dente de alho pendurado ao pescoço e rezas ao zé pelintra – porque enquanto houver quem resista. haverá sempre um futuro possível

 


11/05/2025

deambulações noturnas LXVI



pintura - google

 

o escritor é um comunicador silencioso. um hermafrodita grávido de si no tempo – escrevo para que não desista de ser feliz. mas mais do que ser feliz. escrevo para existir além do tempo – só as palavras o encontrarão no futuro 

 


30/04/2025

nome absoluto





sou. absoluto

numa circunferência concêntrica

sem saber o que tange o raio

sem saber...

o que vale a sorte

no destino do ventre:

nove meses para parir

um atalho para a morte

talvez apenas peso

uma arroba. ou coisa que o valha

aos ombros

o nome estendido até ao fim dos olhos

a balançar. a perguntar:

o que fica mais perto

o céu ou a vergonha?

 

entre o deserto e o nada

o que sobra em peso?

uma grama

ou uma alcateia de lobos?

 

faço contas

é da balança ou de mim

esta fome de sangrar?

 

e eu

a olhar-me

nas entranhas do absoluto

com as pernas entre

as duas margens de um rio

que nunca me levou ao infinito

 

a dor em fuga

a correr

as palavras. mortas

a escamar

e o ultimogénito sem pele

sem defesa

e o pensamento a cortar. lâmina

 

o fígado. num frasco

mergulhado em formol

a medrar de medo

os olhos por fora

sem saberem o que veem

sem saber a verdade:

sou formol

ou o meu destino estava no fígado?

 

e a escada. degraus contados

semelhanças ocultas

nós sentados no alguidar

absoluto

com os pés na terra

sem perceber

nada:

nem como tudo se fez

nem como me fiz

 

se em mim o vazio

ainda não é esquecimento

é raiva

espelhos estilhaçados

de cada rosto que não conheço

 

que será de mim

e de vós. por obrigação

se tudo for esquecido?

que culpa me condena?

que absoluto me sobra

sem o teu nome?

que absoluto teu ocupa o meu corpo?

 

se sou

cada traço do teu mundo

cavado em ti. e em mim

 

e agora:

quem é dono do cosmos

se tudo

o que era nosso

estava no alguidar?

e os pés. a caminhar

num absoluto luto

a dor da perda

a marcar o pino do sol

e a luz absoluta

a pedir uma virgem maria

um milagre...

também absoluto

 

para uma família absoluta

numa escolha ferida

manter a vida

é morder o ventre da morte

só morre

aquele que conta os dias

e esquece os nomes do alguidar

 

se me tocassem por dentro

ver-nos-iam gravados

nos ossos

saberiam: nasci em ti

por ti

mas morrerei por minha vontade

num cansaço absoluto

irremediavelmente ferido

nesta luta de ter um nome

onde o teu já não tem lugar

 

para que serve o meu

se vives em mim sem nome?

 

por que quer o padre

a minha assinatura

se o nada é só meu?

nenhum papel arde em branco

na cruz em que existo

 

respiro voz absoluta

carrego rugas absolutas:

iguais às tuas

às nossas

que um dia

talvez depois do dia seguinte

serão descobertas

 

não nasci pitbull

talvez poeta. sonhador

não apontei caminhos

os atalhos estavam numerados

por ti. para mim

 

procuro-te

nas sombras que restam de ti

nem que morra da procura absoluta

 

e se tiver que renunciar

ao que sou

que seja no vale dos judeus

morto

como um pulha

 

e se a honra se prostituir

que zé pelintra me proteja

pois eu te encontrarei

 

o teu nome será sempre meu:

com pecado ou sem ele

 

sou escorbuto das noites ímpias

escrevendo-te páginas absolutas

desesperadamente absolutas

 

ressuscito-te nas palavras

e nos livros que um dia escreverei

 

minguarei o meu amor

em cada minúscula

para que cresças

 

e se fores sombra de eufémia

não ligues

ela pariu um poema do pessoa

nunca esteve grávida

 

eu. pelo contrário

estou grávido de nós

do nosso nome

 

falo divino

barro do verbo

moldado a punho

 

escrevo-te

procuro o quanto te quero:

assim

como sempre foste

bom

absolutamente bom

 

que mais pode um nome ter?

tu és o meu socorro

é em ti que me aceito

e quando te represento

sou o sol

 

e sempre que há sol

há um retrato teu na parede

e séculos a arder

porque um dia louvaste

a vida

e se a vida não bastar

que nome nos salva do silêncio?

 


dedicado à família:

para quem me deu o nome

tu [pais]  

que me fizeste ser

mesmo na ausência

                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                              

21/04/2025

parabéns. mas pouco – um desabafo contra o calendário

 


nota introdutória

não gosto de aniversários. nunca gostei. esta é apenas uma tentativa [ou desabafo] de entender o motivo — ou talvez de justificar. é um texto pessoal. escrito com liberdade e sem filtros. entre memórias. exageros. ironias e verdades mais ou semi-reveladas. uma viagem que começa no dia em que nasci e que ainda não acabou. não é para comover. nem para entreter. mas se alguém se reconhecer aqui. então talvez não esteja sozinho


nunca gostei de fazer anos. uns dias antes da data já começo a sentir-me inquieto. quero fugir do mundo. principalmente de quem sou. fazer como a avestruz. enfiar a cabeça na areia e fingir que estou hibernado para a verdade: como se não envelhecesse mais – também já me ocorreu fugir para mercúrio. não para a lua ou marte. estes ficam ao pé de casa. digo mercúrio porque está mais próximo do sol. sinto-me mais enxuto. com pensamentos mais aconchegados a mim. e aos outros também. e quando tiver saudades da minha casa. basta olhar para a viagem e talvez me consiga ver por um binóculo – mercúrio para mim não é um planeta. é um SPA celestial. onde vou a banhos. atiro-me para dentro da banheira granítica e cubro-me de água até o corpo tomá-la como sua. transformo-me numa tartaruga gigante de galápagos e passo a viver sem urgência – alcançar o melhor de mim é agora uma questão de tempo – já cheguei acreditar que era o planeta onde era possível lavar as feridas com mercurocromo. e que. com alguns dias de tratamento. regressava ao corpo purgado de todas as feridas do ano que deixava para trás – apenas desejei um aniversário. o da maior idade. nesse dia em que me tornei dono de mim. mesmo vivendo à custa do meu pai. prostrei-me inteirinho à porta da escola de condução serra. tirar a carta de condução seria o meu maior feito. grande não sei. mas tão desejado tenho a certeza – o meu pai já me tinha comprado um carro em segunda mão. um NSU TT. branco. pronto para competir comigo o tempo. tinha-o guardado na nossa casa da aldeia. só esperava pelo selo oficial do instituto da mobilidade e dos transportes. IMT que chegou no final de agosto – quem é que tinha um pai assim? ninguém. o meu pai vivia a minha juventude como se fosse a dele. talvez por não a ter tido. talvez por não ter envelhecido amargurado com a vida e a aceitar tal e qual como aconteceu – viver e sorrir era para ele mais do que suficiente – foi pena não ter envelhecido um pouquinho mais depressa. talvez ainda fosse a tempo de lhe dizer que era um pai excecional. o melhor. e que faria de tudo para ser o mais parecido com ele – depois desse aniversário não me lembro de mais nenhum que me fizesse tão feliz – em memória do trigésimo terceiro aniversário. e no meio da nostalgia pensei: cristo morreu com esta idade. é melhor pôr-me de soslaio. pode haver para aí um judas. sei que não valho trinta moedas. mas da forma como está a vida. vendem-me por tuta e meia a um qualquer herodes. e sem saber como. apareço pregado numa cruz. nem precisam de um carpinteiro para a fazer. já carrego a minha de nascença. só precisam de passar pelo leroy merlin para comprar uns pregos – que sejam ao menos de inox para não enferrujar. tenho pavor do tétano – mas não pensem que nunca tive um aniversário feliz. tive um. sim. sei que não foi coisa de monta. mas deixou-me momentaneamente feliz. um instante precioso no meio da minha história amarga com os aniversários – não sei com que idade aconteceu ao certo. mas vamos imaginar. eu gosto muito de imaginar coisas. e nesse gesto solene de soprar as velas. encontrei um contentamento improvável. eu explico: acreditava. na minha modéstia interior. que estava a comemorar a entrada nos quarenta e oito anos. e claro. triste. em agonia absoluta. sei apenas que tinha somado mais um ano. e foi nesse momento trágico de soprar as velas que se deu o contentamento. eu explico: acreditava. na minha modéstia interior. que estava a comemorar a entrada nos quarenta e oito anos. e claro. triste. em agonia absoluta. quase a morrer. os festeiros acendem as velas do bolo de aniversário para cantar os parabéns. alegrar-me um pouco. e é nesse preciso instante da combustão do fósforo. que consigo perceber que os números nas velas me indicavam menos um ano – foi quando me informaram. não fazes quarenta e oito. mas sim quarenta e sete – foi um grande momento. apoteótico. fiquei eufórico. afinal teria mais trezentos e sessenta e cinco dias com a idade que pensei já ter perdido – foi muito bom. e sim. foi um grande aniversário – há três anos fugi com a maria joão para o exterior do país. desliguei os telefones do mundo. e passei o dia todo deprimido. perdi-me dentro de mim e confesso que não foi fácil encontrar a saída para a realidade – o problema é que no regresso a casa foi levado a audiência familiar pelos filhos. noras e netos. e tal como num tribunal com jurados. não houve misericórdia para a minha disfunção com aniversários. fui considerado culpado por unanimidade. e proibido de reincidir na proeza. isto é. tenho que aguentar o vómito nostálgico do aniversário. e se este assolar à boca. o remédio é engolir. para fora é que não pode passar nada – ninguém me compreende. ninguém teve compaixão pelo meu sofrimento. é a minha cruz – hoje é então o dia do meu aniversário. e pensei. que podes fazer para te alegrar? não acredito que possa fazer grande coisa. mas comecei a pensar em como teria sido o dia da minha família quando nasci – a minha mãe deve ter pensado: estou metida num grande sarilho. pelo jeito que eu berrava de mau feitio. nasci com fome de tudo. não prometia nada de bom – e  renovou o pensamento: acabou de chegar e já protesta. mau feitio. não vai ser fácil aguentá-lo – o meu pai. que não via problema em nada. tudo se resolvia com dois dedos de conversa. deve ter-se interrogado pela primeira vez: este não vai com palratório. pelo ar enfunado que chegou creio que vamos ter problemas. talvez o melhor seja entregá-lo à caridade – não o fez. tramou-se. levou com a minha irreverência a vida toda. para não falar na vontade de ser dono de mim mesmo vivendo aos seus custos –era um jovem muito à frente para a época. só hoje é que surgem jovens com a mesma tara. protestar por tudo e por nada enquanto vivem na casa dos pais – os meus irmãos acredito que passaram o dia todo a agoniar. principalmente a minha irmã. que já tinha treze anos. e percebeu rapidamente que eu seria o seu maior problema. a sua adolescência seria preenchida a dar o biberão e mudar as fraldas – já o meu irmão. com onze anos. deve ter entrado em pânico e pensado: acabou o sossego. acabou o gira-discos. acabou o chá-chá-chá. acabaram os beatles. esta casa vai virar convento. tolerância zero para o barulho. nem um espirrozinho. não se pode acordar o menino – restou-me a lurdes. esta foi a única que me recebeu com um sorriso. percebeu rapidamente que enquanto tomasse conta de mim não cozinhava. não passava a ferro. muito menos lhe berravam. tinham medo de acordar o mau feitio – foi assim que cheguei ao mundo dos humanos com consciência. já era humano na barriga da minha mãe. mas não tinha consciência do que me estava reservado – então. essa minha irmã que quando nasci tinha mais treze anos. hoje. continua a garantir essa diferença de idade. o que é fantástico e faz muito feliz – mas o grave é que me ligou a dar os parabéns. o que me pôs logo o corpo a contorcer-se com dores de aniversário – atendi. e perguntei-lhe se estava a ligar por causa do meu aniversário. disse-me que sim. o que fui obrigado a responder-lhe: é preciso muita lata estares a ligar para dar os parabéns. sabes bem que não gosto. nunca gostei – mas é a minha irmã mais velha. e como já não sou irreverente. quer dizer. sou ainda um bocadinho. mas nada como antigamente. disse-lhe obrigado. mas escusavas de te maçar. e mais uma vez tentei explicar o porquê de não gostar de aniversários: o motivo é simples. mesmo sabendo que os sintomas têm vindo a piorar: sinto um gajo todo físico. com aqueles músculos que parecem inchados. como se tivessem sido picados por abelhas asiáticas. ou então enchidos com bomba de ar. como se fosse um pneu prestes a rebentar. em que os gajos ao sair de casa passam pela estação de serviço. dirigem-se à máquina de ar. enfiam o tubo na válvula e metem 40 bares de pressão. é quando olhas e vês aqueles gajos todos encurvados dos braços. com os músculos esgaçados à força nas mangas da t-shirt. em agonia – muito braço para pouca manga – mas voltando à história com a minha irmã. dizia-lhe que sinto um gajo todo musculado atrás de mim a empurrar-me para o precipício. e se no passado o energúmeno empurrava e eu não via perigo. sabia do precipício. mas não o via. agora é diferente. eu já consigo vê-lo. e por perceber que mais tarde ou mais cedo vou ter problemas com o tombo. quero adiá-lo o mais possível – bem enterro os pés no chão. mas mesmo assim o brutamontes insiste em empurrar-me. e se fosse só o empurrão. ainda goza comigo. está sempre ao meu ouvido a dizer: vais-te foder – e sim. um dia isso vai acabar por acontecer. mas talvez tenha uma surpresa… mando-o foder. e atiro-me eu de livre vontade à minha liberdade – quero ver com que cara é que ele vai ficar – e assim chego ao fim do meu aniversário. com a certeza de que nada seria sem a família e amigos – os amigos são cada vez mais importantes. estou na fase de os escolher bem. os melhores. serão aqueles que estarão mais próximos das fragilidades que o corpo irá acolher – já o escrevi. mas nunca é demais dizê-lo. não quero perder mais amigos. os que estão por perto que continuem por louvação. mas se tiverem que partir. que mo informem. ainda acredito que só não há solução para os defuntos – mas também tenho cada vez mais certezas: os erros em mim são persistentes. alguns irreparáveis. mas o que me torna um homem bom justifica que continuem por perto entretanto e enquanto a viagem dura o que entendo ser verdadeiramente importante. é manter ainda mais perto aqueles de quem gosto e me fazem ser o que sou: a família. filhos. noras e netos. estes num círculo apertadíssimo mais a minha MJ e a lurdes – num segundo anel circular a restante família. estes. são para mim uma honra enorme tê-los na linhagem – a minha vida é como escalar o monte everest – tal como a vida não é possível chegar ao cume de uma só viagem. tem que ser como etapas. um pouco como os aniversários. a família e os amigos não chegam todos de uma vez. é necessário esperar. conquistá-los. e instalá-los dentro de nós até eles se sentirem acolhidos – a penúltima base antes de atingir o cume do monte everest é o campo 4. também conhecido como south col – este acampamento situa-se a cerca de 7.920 metros de altitude e marca o início da chamada “zona da morte” – é aquela em que estou agora. a olhar para cima e perceber que estou cada vez mais perto do céu. onde o ar rarefeito e as condições extremas tornam a permanência prolongada perigosa – a família é o meu oxigénio. é por ela que teimo em chegar ao topo do meu mundo. e quando lá chegar. perceber que  deixei para trás tudo o que realmente importa. cada um deve trilhar o seu caminho com total liberdade – quando se envelhece um pouco mais a sociedade tem o seu padrão de envelhecimento. não se deixem ficar reféns dessa teia de hábitos e expectativas. envelheçam com ousadia. sejam corajosos para serem cada dia mais vocês. e menos os outros – tenho um amigo que me ensinou a mandar o mundo para o topo do mastro. ao princípio não foi fácil compreendê-lo. mas aos poucos a ideia foi cada vez mais aceite pela minha consciência verdadeira e livre. o que sempre ambicionei ser.  e agora já mando muita gente para o… topo do mastro – de mim quero apenas que fique uma memória serena de quem tentou ser inteiro – agora vou descansar deste aniversário. já só tenho trezentos e sessenta e quatro dias. e se passarem tão rápido como este. o drama repete-se em breve. abril é já ali – espero que o universo se alinhe e me castigue com mais crueldade – até 2026

 


08/04/2025

onde a luz não chega

 



é noite. tão profunda como o buraco negro que vive em mim – sofro. importuno a alma. treslado-a para um escuro que é só meu. cerrado. denso. de meter medo. e as escadas em caracol alumiadas por séculos de gente com o meu nome – sombras que nunca conheci. sobra-me um avô. e os meus pais – estes. resistem na memória – o que me leva ao abismo do medo. onde me interrogo: porque não sou um pouco mais digno desta herança? no escuro não se vive. sobrevive-se. alimentámo-nos de tortura. de um fel que se torna insuportável. e ali fico a perguntar-me: o que me falta nas mãos para ser merecedor na consciência? mas a escuridão impiedosa esmaga-me. arranca-me a carne dos ossos. e os gritos silenciosos ecoam como lâminas. retalhando-me o pouco que sobra de fé. humilhando-me. obrigando-me a suplicar por finamento. por alívio. por consolo. por compreensão. por aceitação para a sua última vontade – com o nascer do dia guardo a dor. sei que preciso dela para a próxima noite. sem ela não existiria. seria vazio. imbecil. um tolo. perdido na ausência de sentido – seria algo pior? tenho a certeza que sim – o que sei é que um homem com dor ainda não faleceu – por isso. como leminski escreveu. repito: não me toquem nessa dor. ela é tudo o que me sobra. sofrer vai ser a minha última morada – sei que sou feito de dor. mas também de resiliência. as duas juntas. fazem a história da minha vida – esta. é a herança que irei deixar para me perpetuar no tempo dos meus filhos – desistir… nunca



19/03/2025

um dia. um pai. para sempre






1.

hoje. dia do pai. faz vinte e sete anos que o meu pai desceu ao ventre da terra – é dia de recordá-lo – nenhuma homenagem é suficiente para um pai – mas eu dei o meu melhor para que os meus filhos o recordem. digo. para que nunca o esqueçam. porque era um homem bom – e como fazem falta homens bons neste mundo

2.

o algodão doce dissolve-se aos poucos. e nas mãos resta apenas um pauzinho despido de açúcar – os olhos percorrem a romaria. os carrosséis giram. e eu de mão dada com o açúcar. sem saber ainda que por cada balão solto no céu. partia um dia de infância – e os lábios sugando vida. e o céu ainda azul. e os olhos a girar como os carrosséis. e os sonhos presos ao destino: um dia quero ser grande e ter um carrossel só meu – o açúcar na mão. efémero como as nuvens no céu. e a boca a sorrir. as mãos a pedir primavera. o corpo deitado para o dia seguinte. imaginando que tudo é eterno. que o que é dos olhos fica guardado para sempre. porque cada dia parece apenas um dia – os lábios presos ao algodão. e eu preso à mão que julgava eterna – até o açúcar azeda. até a doçura se esgota nas mãos que fogem para um destino que não controlamos. e o que era para sempre são agora memórias que me recuso a perder – hoje é o dia do pai e os carrosséis continuam a girar dentro de mim. e eu a girar em torno do algodão doce. sou o filho pedindo ao pai de hoje que não esqueça o pai das romarias. sou o pai pedindo aos filhos de hoje que não esqueçam o avô do algodão doce – eu cresci em festa – quando somos crianças. não sabemos que o açúcar. tal como os balões. sobe ao céu e nunca mais volta – tudo gira. os carrosséis. os romeiros. o homem dos balões. e a criançada garante à candura que o açúcar sem balão não chega ao céu – e as palavras a girarem de boca em boca enquanto os altifalantes gritam música que ninguém sabe quando termina – não há festa sem ruído. e não há ruído que o silêncio não acabe por engolir – ninguém quer saber de que árvore nasceu aquele pauzinho. ninguém quer saber que fruto deu. ninguém quer saber quem foi o lenhador que a cortou. ninguém quer saber da clorofila. ninguém quer saber de nada. mas aquele pauzinho é mais do que madeira. é mais do que um resto. são todos os filhos que recordam o seu pai. cada um tem a sua árvore. e cada árvore com o seu pedaço de terra sagrado – o meu pai escondeu-se de mim há vinte e sete anos. era dia do pai. hoje continua a sê-lo. porque todos os dias são dele. e a memória já não tem a certeza de quanto pesa um dia perdido no vazio do universo – quero acreditar que o tempo só conta para os que resistem. só vale para os que sobrevivem à dor – um dia. noutra dimensão. os anos serão apenas um sopro. o instante de uma chama acesa. e a luz iluminará para sempre o dia em que os carrosséis giravam sem pressa. sem rumo. porque. por mais voltas que dessem. o ponto de partida e chegada era sempre o mesmo – ali. naquele instante onde um filho se torna estrela aos olhos de um pai – esta luz que trago não é minha. é a dele. iluminando o caminho que ainda me falta percorrer para voltar ao seu lado – porque o caminho em falta é o nosso caminho – e assim continuará a ser: a família é uma âncora que nos prende à terra e à memória – feliz dia do pai!


01/03/2025

pratos rachados

 



no passado. há muito. muito tempo. quando os pobres eram realmente pobres e miseráveis. se um prato ou travessa se partia. colavam-no com resina. e de seguida. fixavam-lhes alguns agrafos para garantir que não voltaria a quebrar – cada prato era um bem precioso. faltava dinheiro para comprar comida. quanto mais para loiça – os tempos mudaram. e com eles. as nossas prioridades. hoje. qualquer pessoa pode comprar um prato. ninguém cola nada. o que se estraga vai para o RSU – é tudo descartável. a comida sobra vai para o lixo. o tempo sobra vai para as redes sociais. as amizades valem tanto quanto um like. os melhores amigos transformam-se em produto tóxico de um dia para o outro. os pais zangam-se com filhos. irmãos com irmãos. e a família a desmoronar-se como a torre de babel – os casais modernos evitam sacrifícios. trocam sentimento por aparências. compram amores descartáveis. como se fossem pacotes de dados móveis. só para impressionar os amigos. os colegas de trabalho ou a família. e quando a conexão se esgota. trocam por outro plano. com mais minutos e menos compromisso – tudo isto para vos dizer que as relações são como pratos rachados. podem ser coladas. mas a cicatriz do rompimento nunca desaparece. atenua-se com o passar do tempo. sem nunca desaparecer por completo – e a rachadela está ali para sempre. aos poucos. esmaece. escurece. só quem olha com atenção percebe que a imperfeição nunca desaparece. e acabamos acreditando que. talvez. essa fragilidade sempre estivesse ali. desde a fabricação – hoje. já ninguém aproveita nada. não há gratidão. nem honra. e o perdão é coisa dos livros sagrados – vemos casamentos a terminar ao fim de um par de anos. mulheres e homens cada vez mais preocupados apenas com o seu sucesso profissional. relegando para segundo plano os seus conjugues. os seus filhos. a família. e os seus amigos – e. neste ritmo acelerado e superficial. acabamos por esquecer aqueles que mais precisam de nós – vivemos todos para um sucesso aparente. trocado por uma felicidade mentirosa e frágil – é assim. e nada mais do que assim. os pais esquecidos. os filhos esquecidos e a sobreviverem de casa em casa. e a promessa de os proteger de todos os males resolve-se com silêncio e ausência – os amigos  partem sem deixar um adeus. olham para trás sem saber contar pelos dedos o valor de cada palavra. cada momento. cada ano. e a volatilidade é agora mais instantânea do que éter. acorrentada ao egocentrismo. e à falta de empatia – mas a maior doença da humanidade é a manipulação pela mentira. a indiferença pelo sofrimento. o perdão pelo erro. e a total ausência de gratidão e respeito pelos outros – passamos todos rapidamente ao tal produto tóxico – ainda há pouco tempo. eu escrevia sobre a necessidade de não querer perder mais nada. principalmente amigos. mas o tempo pode ser também uma traição. temos que estar preparados para tudo. principalmente para a ingratidão e perdão – hoje. percebo que tudo que surge sem tempo de amadurecimento. respeito pelas diferenças. e compromisso com a verdade. desaparece rapidamente – os ditos amigos raramente buscam a verdade; querem distração e absolvição. como num confessionário. rezam três pai-nossos e duas ave marias – saem em paz e regressam para pecar – o pior é que ainda acreditam que com um sorriso curam qualquer mal. ou então meia dúzia de palavras sem sentido. usadas pelos nossos antepassados. num arcaísmo obsoleto. e em desuso nos nossos dias. e que na sua ignorância saloia. manuseiam para tentar enganar o que resta do mundo ingénuo – mas percebo que ser autêntico de nada vale quando os outros se ocultam em passados nebulosos. muito menos vale dizer a verdade. se a maioria deseja apenas bajulação – querem ser enaltecidos pelo que não são. carregados de virtudes que não têm. e respeitados pelo que julgam valer. mas raramente valem o que imaginam – um homem honrado. na maior parte das vezes. é obrigado a sacrifícios. a muita humildade e gratidão. a bater com a mão no peito e dizer: por minha culpa. tão grande culpa. a sofrer pelo erro. a pedir perdão a si mesmo e aos outros. e mesmo com os novos propósitos do mundo moderno. estas virtudes devem ser valorizadas. cultivadas e respeitadas. mas não são – esta malta que aparece do nada vive o momento. e à primeira dificuldade esquece tudo. como se o que valesse fosse aquele ar de quem não carrega o mundo às costas. com sorrisos mal adornados. numa felicidade tão grande que. se fosse verdade. deixaria qualquer ser humano invejoso e a perguntar: por que raio não tenho eu uma felicidade assim? eu aprendi que o amor e as amizades necessitam de alicerces fortes. baseados na verdade. na comunicação. e no perdão. é nossa obrigação também ouvir. colocar-se no lugar de quem nos fala. e perceber que nada pode ruir por uma palavra perdida – viver também é seguir em frente. a não ser que o seu íntimo se estruture na falsidade e se esconda no passado – todos precisamos de um amor que nos trate com afeição. respeito e atenção. de uma família que nos ame. e de um amigo que nos ouça e nos socorra quando a brisa vira ventania. todos precisamos de nos sentirmos humanos e visíveis – o amor com a minha companheira é feito de tempo. de um abraço. de um olhar. de rir muito das palermices que só os dois conhecem e valorizam. de chorar juntos para a dor ser menor. ou apenas dizer: hoje estás bonita. ou estar no sofá e num impulso olhá-la e sentir uma palpitação. sentir o corpo todo a ser preenchido de uma sensação boa. sem que o seu amor imagine como aquele microssegundo preenche quarenta anos de mão dada – para se amar. é preciso ter capacidade de sacrifício. optar pelo que está certo. não hoje. mas daqui a um dia. a dez. ou vinte anos. perceber como bate o coração de medo só de pensar que a podemos perder. e rogar ao destino que seja o próprio a deixar saudade – é preciso amar a nossa companheira. compreender e aceitar que todos os dias o amor vai exigir compromisso. pois só assim o belo se torna mais belo. mesmo nos dias de silêncio – eu tenho o meu belo. a minha companheira tem o dela. difícil é fundir um ao outro. felizmente para nós basta apenas uns retoques e temos a obra tão perfeita como a pietà de michelangelo – lealdade. perdão. compromisso. verdade. comunicação. bondade. e companheirismo é a receita para tudo. também para as amizades. e quando assim é. os casamentos são para sempre. a família é para sempre. e os amigos são para sempre – e sim. é melhor aceitar as perdas inevitáveis do que viver alimentando ilusões sobre o que nunca foi real – no fim. aceitamos essas perdas. como pratos que nunca mais colamos. porque. mesmo que tentemos. sabemos que certas rachaduras estarão sempre lá – talvez seja isso que nos torna humanos. a busca constante por remendar o que já foi quebrado. mesmo sabendo que nunca voltará a ser como antes – nunca irei desistir da minha companheira. da família. dos amigos. encontrarei sempre um pouco de resina para colar o que a vida quebrou – é assim. e nada mais do que assim

 

11/02/2025

é urgente o amor





 


preciso de te amar

sem demora

sem que uma palavra tua me faça parar

sem que uma mão tua me possa amarrar

sem que os teus olhos me digam

já é tarde

 

o amor é urgente

mas não pede pressa

nem loucura

nem um corpo que se perca

no fogo do desejo

 

tudo isto é um poema de amor

para ser lido sem demora

porque o amor é urgente

e nunca espera

 


07/01/2025

carta a uma amiga

 




espero que a cada dia que passe a solidão se torne num chocolate quente. revigorante e reconfortante – hoje comecei a ver uma série na netflix – renascer – passa-se em florença onde uma jovem procura renascer para um novo desafio. estudar arte – acabei por me lembrar de ti. do teu gosto pela história. pela arte. pelo belo. bastou isso para me levar de volta a veneza. onde a beleza de séculos resiste à modernidade. entre canais silenciosos e pontes que guardam histórias. permitindo que nós quatro fôssemos felizes – nunca tive um amigo que gostasse de arte. o que. hoje. acredito. foi a minha tragédia grega – a maior parte dos meus amigos sempre procuraram o belo nas mulheres. nos carros. e no futebol. eram outros tempos – o que se pode fazer quando somos novos e procuramos aceitação e sucesso? nada. a não ser. ser um deles. mesmo que muitas vezes num silêncio-crítico – florença é uma cidade belíssima. onde fruto do meu trabalho me levou dezenas de vezes. todos os anos. e foram vinte – vinte anos é muito tempo. mas eu não sabia – o mais engraçado é que. durante a visualização dos episódios. teletransportei-me para florença: passei a revisitar alguns daqueles lugares mágicos. e senti uma nostalgia que era quase dor – queria mesmo estar lá. no berço do renascimento. sorver toda aquela magia da família medici. de leonardo da vinci. de michelangelo. do campanário de giotto. da cúpula de brunelleschi. da ponte vecchioe. e o inesquecível pôr do sol na piazzale michelangelo com o céu a adquirir as tonalidades de laranja. rosa e paz – mas o mais engraçado. ou talvez não tão engraçado assim. é que percebi que daquele miúdo não resta nada. digo. quase nada. cresci e fiz as pazes com o tempo e com o novo homem que despertou em mim – hoje. nesta série que é um romance entre dois jovens. compreendi que vi mais de florença sentado no meu sofá do que em todas aquelas viagens idiotas – sempre procurei o belo. mesmo quando trabalhava a confecção das peles. mas infelizmente não sabia nada de arte. talvez me faltasse uma amiga para me apontar o belo dos artistas. das sombras e da luz – dizem que o meio onde crescemos acaba por determinar o que somos – acredito que seja essa a minha verdade. nasci numa fábrica. filho de patrão. mas nunca me senti patrão de coisa alguma. nem de mim. mas era o meu meio. a família sempre foi o único lugar onde me senti perfeito – mas é o que é. e com o desenrolar do filme. dei comigo a magoar-me por cada ano estragado. e a interrogar-me: quanto tempo me sobra para ser o que quero ser – não sei. como ninguém sabe. mas sei que não devemos estragar o que a vida nos oferece. e no meu caso. não foi pouco. mesmo sentindo que não foi totalmente justa – lá terá as suas razões – e. agora. cheguei a uma idade que já não aceita renascimentos. o novo homem envelheceu. cresceu em demasia – a memória é a única fonte de conhecimento. eu tenho a minha. e esta leva-me ao arrependimento. tardio bem sei. mas é ao que me apego. descobrir em mim os enganos para que os meus filhos os contornem sem sobressaltos – mas se não fosse este caminho. duro. e eu sofri imenso. ainda sofro. mesmo já se tornando um hábito que aparece todas as noites. e se cura com o amanhecer. ou com uma aspirina de fé. como teria conhecido tanta gente boa que passou por mim e vive em mim – é a isso a que me agarro. às pessoas que me chegaram por bem. aos amigos que me aceitam como sou. à maria joão. minha companheira de riso e sofrimento. aos filhos que são uma bênção. às noras que adoro. e agora aos netos. que me tornam pai duas vezes – é o que me sobra para ser feliz. e não é pouca coisa – e quando te escrevo este pequeníssimo desabafo estou a ser feliz – tu e o teu companheiro fazem parte das minhas boas memórias – foi pena não vos ter conhecido trinta anos antes. talvez me procurasse melhor. quem sabe. florença tivesse sido a cidade que encontrei hoje – amarremo-nos então ao que sobra. às vezes acho que é pouco. mas talvez esteja a ser mal-agradecido – falta de gratidão seria tão grave como perder a memória. pois ambas são fontes de conhecimento que devemos preservar – é na memória que guardamos todos aqueles de quem gostamos – saber que existiram na minha vida é fazerem parte do meu belo



30/12/2024

o que ficou para trás. lá trás permanecerá – bem-vindo 2025

 




estamos às portas de mais um ano. o que significa que também ficaremos um ano mais velhos. para mim. cada aniversário é um desafio emocional. mas sei que faz parte da caminhada. a sorte é que todos envelhecemos juntos. ninguém fica para trás – 2024 foi um bom ano. considero-o um ponto de partida. se fosse uma corrida de fórmula 1. diria que fui às boxes para trocar de pneus. agora. quero chegar o mais rápido possível a um lugar que não sei onde fica. mas sei que preciso de continuar a corrida – o fim de um ano permite-nos fazer reset: apagar o que foi de menos bom. reabastecer a alma de esperança.  e acreditar de que o próximo ano será ainda melhor. dar aquele passo que sempre tememos. dizer finalmente aquela palavra guardada para momentos especiais. concretizar o negócio que sempre ansiamos. ou então dar muitos abraços a quem merece. e quem sabe. encontrar aquela pontinha de sorte que tantas vezes sentimos faltar ao longo da vida – quem sabe. em 2025 eu seja agraciado com um momento de sorte memorável. mantenho a fé – todos na minha família tiveram saúde. que é sempre a base essencial para a felicidade e sucesso. por isso. sinto-me sempre um pouco ingrato quando me lamento de algo mais penoso. é necessário lembrar que a gratidão harmoniza todas as dificuldades – eu e a maria joão seguimos na nossa caminhada. envelhecemos juntos. acreditando que assim será até ao último dia – no trabalho. essa coisa maldita que nos tira os sorrisos. continuamos os dois com a nossa luta. teimando para que o nosso sonho continue a ser o aditivo que nos sustenta. com força. empenho e resiliência – não tem sido uma caminhada fácil. mas também já não temos idade para ter medos. viver é isto: sofrer. rir. sonhar. chorar e recomeçar tudo de novo quando o nosso castelo desaba – com a chegada do réveillon. chega sempre o natal. e como sempre. especial. vivemos o ano à espera desse dia. há algo transcendental em juntar a família numa comunhão de amor cristã. mesmo que a minha fé já se tenha perdido – o natal também é importante para recordar os que já não estão entre nós. e há tanta gente que gostaria de ter a meu lado – revê-los é sempre uma saudade açucarada – por isso recordo a minha cunhada zeza com aquele sorriso feito de leveza. inocência e vaidade. ainda deve andar por aí a ver as montras – o meu sogro. nunca mais tivemos na família um silêncio-doce como o dele. que nos permitia perguntar: será preciso tanta palavra para demonstrar o quanto nos amamos? lembro-me também do tio joão. já passaram tantos anos desde o seu desaparecimento. mas sempre que preciso de um exemplo de tolerância e conhecimento. é ele que me vem à memória. que privilégio foi herdar este legado invisível. mas ainda hoje tão presente – por último os meus pais. tenho tantas saudades deles. mas tenho a certeza de que o pai antónio lopes e a mãe carolina lopes. onde quer que estejam. estão orgulhosos do seu legado. de nós todos – eu também estou muito orgulhoso da nossa família. principalmente desta que construí com tanto amor e sacrifício. confesso que não foi fácil. mas só foi possível graças aos filhos. noras e netos. únicos e que tornam a nossa história memorável – é a única obra de que me orgulho. sempre que os vejo. reluzem como as estrelas na noite. como diamantes polidos pelo tempo. sei que são as minhas sementes. e também sei que irão dar vida a outras sementes. e assim a nossa história continuará a florescer no tempo – 2024 permitiu que o meu filho luís. o primogênito. realizasse mais um bonito sonho. bem sei que é fruto do seu talento e esforço. e também da parceria com a sua esposa. minha nora andreia. que é uma filha para nós. gostamos imenso dela. trata-nos com muito carinho. se pudesse escrever como isso nos deixa felizes e tranquilos. mas não tenho essa arte. o nosso filho não poderia ter encontrado melhor companheira – o meu filho do meio. pedro. está de vento em popa com o seu negócio. ele também é especial. um trabalhador incansável. lembro-me de dizer à mãe: no estudo pode não ser um aluno de vinte. mas vai muito além disso pela sua dedicação e esforço. só não se deve lamentar. mas antes agradecer a vida que conquistou – é apenas um pouco nervoso. juro que não sei a quem sai. ou talvez saiba. por isso espero que o novo ano lhe traga mais tranquilidade. a vida não pode ser apenas uma correria desenfreada. onde obrigamos aqueles de quem gostamos a correr a nosso lado. às veze é preciso parar. respirar. que é o mesmo que dizer refletir. e aprender a caminhar juntos. ao mesmo ritmo com que amamos. e perceber que quando vamos juntos podemos não ir tão depressa. mas vamos com toda a certeza mais longe – mas na nossa família a gratidão é permanente. e. finalmente. o meu filho encontrou um ombro onde pode descansar. a sua companheira. isabel. para nós bela. que para além de ser divertida. trouxe a nossa casa algo que nos faltava: diversão. alegria nas coisas fáceis. leveza. olhos a sorrir. e uma paciência enorme de fazer do seu marido um homem mais tolerante e calmo – estamos muito gratos por ter escolhido a nossa família – o meu filho. joão. o mais novo. depois de muitos anos de dedicação e esforço ao estudo. doutorou-se neste belíssimo ano. nós pais realizamos mais um desejo. e quanto orgulho. eu e a mãe estamos felicíssimos. e com casamento marcado para setembro. tenho a certeza de que 2025 será o ano de um novo recomeço para ele. a minha futura nora. sofia. nora. já posso chamar nora. é agora parte da nossa família. é nela que confiamos para fazer do nosso filho um homem feliz – a nossa nora é determinada. desenhou o seu percurso profissional a régua e esquadro. mas também com muito sacrifício. e tem demonstrado uma força admirável para alcançar todos os seus objetivos: querer ser todos os dias um pouco melhor – adoramos essa ambição – a excelência é uma roda que nunca para de girar. nessa rotação. há momentos que nos esmaga contra o solo. mas o importante é aproveitar o restante da roda para completar a circunferência junto das pessoas que gostam de nós – estamos todos impacientes por essa boda. que será um marco inesquecível para as duas famílias – esperamos que seja para sempre. na nossa família todas as uniões têm sido para sempre. mesmo sabendo que. a partir desse dia. ficaremos novamente sozinhos. ao fim de 40 anos. seremos novamente dois numa casa – mas. para o fim. está reservada a melhor notícia: vou ser avô mais uma vez. e logo de uma carolina. nome da minha mãe. pedro e bela. quando essa princesa nascer. a vossa vida vai mudar para sempre. mas saibam que essa mudança será repleta de sentido e alegria. se souberem acompanhá-la de perto com resiliência. muito amor e também muitos sacrifícios. quando chegarem à minha idade irão perceber que nada no passado mudariam. vê-la feliz será o vosso maior desafio. e também o vosso maior legado: a única obra que nunca acabará enquanto forem vivos – e agora a lurdes. que com 85 anos  mantém uma memória vívida de juventude. só as pernas é que a traíram. mas ela mesmo diz: é a vontade de deus. ele lá sabe o que faz. e está em todo o lado – 2025 será um ano muito bom para ela – a lourdes não teve filhos para levar ao altar. mas terá o privilégio de ser a madrinha do meu filho. e irá levá-lo até o cimo da igreja. quanta honra para ela. mas também para nós – a lourdes é da nossa família e do nosso sangue. todos a amamos profundamente. e ela sabe o quanto é essencial para nós – a lourdes foi sempre uma luz de proteção para a minha família. sempre se deu muito bem com o seu deus. são unha e carne. mas para mim. foi muito mais de que uma luz protetora e divina. foi a minha segunda mãe. nunca me desamparou quando o mundo desabava à minha volta. e hoje é a “vó” dos meus netos – para nós. o que espero de 2025 é o mesmo que pedi em 2024. muita saúde para todos. e se puder ser. se não for pedir muito. um pouquinho mais de sorte e tranquilidade. nós precisamos. começamos a estar um pouco cansados – por último. não posso esquecer os amigos. são também eles que nos dão colorido à vida. e para eles. o mesmo desejo. saúde e dinheiro até não aguentarem mais –  muito já foi dito. mas vale a pena reforçar por ordem de chegada. e para que fique registado para a eternidade. aqui ficam os seus nomes: o meu amigo paulo. estou-lhe imensamente grato. aturar-me durante quarenta anos não é para qualquer um. mas é uma honra ser seu amigo – miguel e cristina. a velhice é um posto. já lá vão mais de doze anos. a amizade é feita de tempo e partilha. serão sempre especiais – luís e mariana. o meu amigo é especial. mostrou-me outro lado da vida e de mim. e como se costuma dizer. o saber não ocupa espaço. a mariana acabou de chegar ao pé dos “cotas”. mas traz com ela uma luz de mudança. acredito que irá acrescentar positividade a todos os que partilham a sua amizade – manu e mónica. passamos até aqui bons momentos. divertimo-nos imenso. mas também falamos de coisas sérias. a nossa amizade irá continuar. tenho a certeza. todos em nossa casa gostam de vocês. só espero que o telemóvel e as mensagens não avariem tantas vezes. talvez o melhor seja mudar de operadora. publicidade à parte. foi o que fiz ao mudar para a vodafone – joão e carol. talvez a amizade mais improvável. mas os astros alinharam-se. é por isso que gosto de viver. como sabem sou surpreendido várias vezes. mas adiante. vou usar as tuas palavras: vocês são confiáveis. e como uma amizade para durar precisa de confiança. foi muito bom aparecerem e conhecerem a nossa família – todos me acrescentaram alguma coisa. todos me fizeram bem. e com todos aprendi. serão mais uma luz em 2025. estou muito grato. principalmente por me aceitarem como sou. valorizarem o que tenho de melhor. e esquecerem o que há de pior. fica a promessa de continuarmos juntos o caminho em falta – este ano. vou juntar à lista mais dois amigos: pedro e inês. foi também muito bom terem aparecido na nossa vida. logo que seja oportuno. conhecerão a minha família. tenho a certeza de que irão adorar. quero o melhor para vocês. e que a vossa alegria transborde para quem partilha o vosso afeto. e. quando tiverem excesso de alegria. chamem por nós – e agora. o que resta dos meus primeiros vínculos: a minha irmã e o meu irmão. para eles e suas famílias. só posso pedir que tenham muita saúde. vocês são muito importantes para mim. para nós – são a única extensão que nos liga aos nossos pais. e como temos muito orgulho neles. fizeram a estrada. nós apenas caminhamos nela – este ano. também fica a recordação dos cem anos da mamã. se fosse viva. e. saber que. por iniciativa da minha irmã. teremos para sempre um dia por ano para juntar toda a família. é algo que me enche de orgulho – não podemos perder a essência dos nossos pais: família e bondade – aos meus amigos da praça. este ano. juntamos mais dois à mesa. e como é bom perceber que também eles envelheceram. e estão muito mais bonitos. talvez apenas menos elegantes. ao vosso lado regresso à adolescência. e volto a ser muito feliz – tiago. arménio. lúcio. pimenta. fontes. espero que o novo ano vos traga muita saúde. na nossa idade de que precisamos mais. e também que triplique os nossos encontros – para terminar. mas de forma propositalmente especial. quero falar sobre a minha companheira. para ti. amor. só posso pedir que continues a meu lado. com muita saúde. pois. se tiveres saúde. eu também tenho. nós estamos ligados um ao outro para sempre – mas também desejo que sejas mais feliz. que te sintas reconhecida por todos os que te rodeiam. e pelos amigos mais próximos. tu és a razão pelo qual este nosso castelo existe. só eu sei o quanto foste importante para tornar os nossos filhos homens de bem. mas também mais doces. és incrivelmente boa pessoa. boa mãe. esposa. filha. tu és o sol que alimenta de amor e esperança a nossa família. e o único porto seguro para os dias tempestuosos – a teu lado. sou. e sempre serei um homem realizado. não tens culpa de eu querer chegar a 2026 sem passar por 2025. é a minha forma de viver. sempre foi – a meta para este ano será sempre o lugar onde nascemos: a família. os amigos. e aqueles que nos aceitam como somos – por fim. lembrar quem nos deixou em 2024: infelizmente. perdi um amigo. sei que temos todos de partir. é a dita lei da vida. mas a saudade e as memórias permanecerão connosco. de alguma forma. é bom saber que ficou entre nós a sua companheira. que nos fará recordar todos os bons momentos de amizade que construímos – feliz ano 2025