na maior parte das vezes. os homens íntegros revelam-se apenas num gesto. numa palavra. num momento que. de tão especial. marca todos os anos da nossa existência. por mais longínquos que se tornem - é para eles que dirijo o meu último pensamento deste ano de 2015 - abraço a todos – feliz 2016 – grato
31/12/2014
29/12/2014
há-de vir um natal - david mourão ferreira
Há de vir um Natal e será o primeiro
em que se veja à mesa o meu lugar vazio
Há de vir um Natal e será o primeiro
em que hão de me lembrar de modo menos nítido
Há de vir um Natal e será o primeiro
em que só uma voz me evoque a sós consigo
Há de vir um Natal e será o primeiro
em que não viva já ninguém meu conhecido
Há de vir um Natal e será o primeiro
em que nem vivo esteja um verso deste livro
Há de vir um Natal e será o primeiro
em que terei de novo o Nada a sós comigo
Há de vir um Natal e será o primeiro
em que nem o Natal terá qualquer sentido
Há de vir um Natal e será o primeiro
em que o Nada retome a cor do Infinito
David Mourão-Ferreira, in 'Cancioneiro de
30/11/2014
a certeza das minhas incertezas
alex andreyev
bem que gostaria de ter certezas sobre
algumas incertezas – não sou homem de certezas. nunca as tive e creio que nunca
as terei – não sou talhado para certezas. ponto final – quando estou perto de
uma certeza fico nervoso. fico com pele de galinha. os olhos turvam. os
músculos começam a dar de si deixando cair a cabeça para o lado da fuga. as mãos
armam-se de suor. e num ápice. como se o cérebro se enchesse de pensamentos
inflamáveis. dá-se a rotura. a combustão é inevitável – tudo agora é fogueira
em dança de guerra. com um menino a pular à sua volta – tudo arde menos a
incerteza – ali fico a olhar para tudo que jamais será certo – nem sei se
triste ou perdido. sei que os olhos aflitos procuram o negro – procuro conforto.
imagino-me sem incerteza nenhuma – escondo-me atrás de feições que fingem rir
enquanto os lábios falam baixinho: um dia isto vai ter que terminar – não basta
puxar o cabelo para o lado ou tirar selfies ao pôr-do-sol. enquanto os pássaros
esvoaçam certezas num vento tão incerto como eu – sou assim. não podia ser
diferente. nasci avesso às certezas – não respondo por não ter a certeza. às
vezes é dia e dentro de mim há noite mais escura que breu – pergunto-me: será
noite ou dia? não respondo por não ter a certeza – já não falo nas palavras que
não escrevo por não ter a certeza de dizerem o que realmente quero dizer –
estou sempre a interrogar-me se o que digo é mesmo o que quero dizer – falo
demais. escrevo demais. e quem assim é… nunca terá a certeza de nada – se
tivesse a certeza de que este texto vos diria como lido mal com as certezas.
estou certo de que seria outro escritor – não gosto de certezas porque não
gosto que ninguém me diga: vês como tinha razão. tens a mania que sabes tudo –
que raio de injustiça. logo eu que nada sei – sei o que vos digo por convicção.
por honestidade. por vos querer dar o que de melhor há em mim: a minha verdade
– raio de mundo. ninguém me quer compreender – talvez não o mereça – antes que
possa dizer o que quer que seja das minhas temporárias raras certezas já tenho
como certo uma pedrada no ego – arrependido retiro-me para dentro de todas as
incertezas – finalmente feliz – as incertezas nunca são injustas. impróprias. inconvenientes.
agarram-te na procura das certezas. e como não as encontras. confortam-te
dizendo: amanhã consegues uma certezinha pequenina – as incertezas forram-me o
estômago. mantêm-me vivo pela esperança – como se de um soldo de um soldado se
tratasse. a subsistência está garantida para mais uns dias – sou feliz assim –
será que sou? não sei – mas que posso eu fazer. nada – tenho a certeza absoluta
que nada posso fazer contra as minhas incertezas. certas
28/10/2014
o momento de parar
há momentos em que um homem precisa saber parar – às
vezes. parar de ver pessoas. de fazer corridas. de procurar lutas contra os
moinhos do dom quixote. de escrever o que não serve para nada. de fazer
projetos baseados em boa fé. de tentar ver os filhos chegarem à minha idade e.
por último. parar para agarrar a honra que sobra – esta vida. feita de corridas.
é um rosário que nos vai passando pela mão. até que. um dia. não temos mais a
quem orar – envelhecemos por dentro. e a escuridão torna-se o único silêncio
que já não provoca dor – a mão para – amanhece. e em breve. tudo volta ao que
era ontem – é preciso sobreviver
16/10/2014
à espera do tempo
sou feito de tempo
espero
espero como relógio
às vezes
espero um abraço
ou um beijo
outras vezes
faço da espera
um poema
que desespera
pela espera
num cigarro que não fumo
espero
espero atento
ao balão de brandy
aquecido ao calor da espera
espero pelos pés
cada vez mais parados
pela veia que corre
para um mar
que espera
como adão aguardou
pelo pecado
de eva
bendita maçã
esperou a fecundidade da terra
e eu
e na luxúria
de uma palavra enrolada
num anseio
infernal
espero
que os beijos
caiam
a tempo de matar
a espera
24/09/2014
ponto vernal
22/09/2014
espírito totémico
nunca
sei de onde me chega esta coragem para vos dizer como sou – loucura – retalho-me
pelo que sinto – se soubesse não era insano. não me retalhava. não me temia – insano
pode ser um qualquer. talvez não – por uma coisa pessoal. quiçá não – pelo
demónio. possivelmente não – ou. unicamente. uma porta emperrada. ou talvez
outra razão – quem sabe. talvez o mais certo. é esta loucura acontecer como luta
contra o destino – uma questão de sobrevivência. algo da alma – mas o cérebro sabe
que a morte é inevitável – é necessário ser louco quanto antes – a morte é
silêncio apenas para quem parte – quando partimos. levamos tudo. tudo? apenas as
palavras que ficam por dizer – gosto de me dar. depois. dizem que sou louco – que
culpa tenho eu? nasci assim – a morte só não cala a escrita
20/09/2014
17/09/2014
14/09/2014
procuro uma palavra que queira falar...
12/09/2014
ressacado
quase
louco
estou muitas vezes assim – o presente amarrado a um dente do siso que sempre senti a abanar – agora. com raiva. enrolei-lhe uma guita em volta. a outra extremidade atada a uma porta que separa o presente do futuro – um dia. lançarei a porta contra o destino
ou
fechá-la-ei para sempre
09/09/2014
05/09/2014
não corre peta de vento
estou semimorto – não tenho papel. nem esferográfica.
nem palavras. nem leitores – estou um caco – desprovido completamente de tudo.
quer dizer. sinto-me um perfeito mentecapto dentro de um corpo que não serve
para coisa nenhuma – nada na minha cabeça além do desejo de possuir um
abecedário – nem uma mísera palavra. um antónimo de oco – mendigo-me – só quero
uma palavra para anunciar a felicidade de quem se escreve – expectativa – não
corre peta de vento – estou fodido
01/09/2014
[também] somos o que fazemos com as palavras
[também] somos o que fazemos com
as palavras
vânia!
o
celular - na minha
terra. telemóvel - é uma modernice do novo homem tecnológico – este homem. ligado
a um futuro que não para de surpreender. faz-me existir com o número 00 351
XXXXXXXXX – esta é a minha conexão ao satélite que liga o continente europeu com
aquele que abriga o brasil. américa. onde reside a minha amiga vânia lopez – escreve
a vânia:
-- um dia. não distante.
prometo-te surpreender
diz
que vai usar o seu celular. marcando o número que me faz existir para o mundo –
acredito. mas. pelo sim e pelo não. espero sentado para não cansar as pernas – quando
concluíres a “call”. cara colega. um sujeito antigo. subjugado agora ao valor
das memórias. vai responder a “você” assim:
- - sim. boa tarde. quem
fala?
e
vossemecê do outro lado. responde em bicos de pés que não param de elevar o
sorriso ao patamar das deusas mitológicas
- - oi meu qu(i)rido. qu(i) legal falar com você. qu(i) surpresa boa. valeu.
estou tão feliz – nem acredito que foi
capaz de ligar. qu(i) legal
dois mundos ligados por fios
invisíveis giram amarrados a um fuso desgovernado pela emoção – tudo agora é
enviesado: o eixo do mundo. as palavras permutadas. os corpos que cruzam
palavras com sentimento. os braços descaídos para bolsos com medo de não
saberem o que dizer. e os olhos. em órbitas desconhecidas. percorrem uma nova
trajetória emocional sob influência de uma nova lei do universo: escrever cria
afetos – ligam as palavras o que o mar teima em separar – para o mundo
literário. chegou uma nova descoberta: um novo enviesamento tecnológico
emocional – tudo sorri dentro de uns fios imaginados que ainda ninguém
conseguiu ver – neste mundo. os olhos são cegos. descansam para outros encantos
que as palavras juram existir de verdade –
as cabeças não param de imaginar o que vem da voz. doidas pela
descoberta. ajardinadas pelo aroma. enfeitadas pela alegria. tombam para a
emoção cruel da distância aprisionada a um fio-algema – seguram o céu ao
imaginário de duas crianças escondidas em corpos feitos à palavra-papel. tantas
vezes incompreendida. tantas vezes ignorada. tantas vezes manipulada. tantas vezes
a teimar a verdade. escrevem-se numa vida censurada em solidão – comoção.
agitação. perturbação. emoção e tudo oblíquo desde o dia em que o criador engendrou
um homem de pó e uma mulher da sua costela. enviesámos para sempre em palavras –
só ele sabe o porquê de nos colocar a rodar de lado para o universo – bem que podíamos
estar verticais. olhos nos olhos. a tocar com as mãos numa perpendicular ao
corpo. a dizer: estou aqui porque neste momento não poderia estar em mais lado
nenhum. estou aqui porque descobrimos muito mais do que palavras escritas.
descobrimos afeição – não é assim. mas a culpa também não é nossa. nós fazemos
a nossa parte. gostamo-nos – quem manda.
pode – palavra. a palavra. vamos eletrizando o espaço com um perfume alfabético
guardado em boiões de uma prosa universal – bem nos queremos. escrevendo ou
falando – ninguém arquitetava um mundo assim. cada vez mais global. cada vez mais informal. nunca
bell imaginaria que a sua descoberta um dia habitaria tão perto das estrelas – se
ele pudesse. afigurar que um simples par de números estivesse ligado a um país.
a uma operadora e a um nome que. por sua vez. com a voz. faz com que a ida e a
vinda de todas as palavras acabem por informar em grandes parangonas:
-- a lua está cada vez mais perto do mar
estamos os dois na lua – longe
vai o tempo daqueles telefones enormes. operados por senhoras de blusa branca.
esguias. sempre a sorrir. cabelo apanhado. lábios pintados de um vermelho a
trazer alquimia à voz: alô! quem fala?... tem uma chamada em linha da senhora vânia
lopez aceita atender? o que era longe fez-se perto.. o que era solidão fez-se
saudade. o que era tempo fez-se presente. falamo-nos com abraços feitos de voz –
mas o mundo não parou num telefone de manivela. e agora as palavras acontecem velozmente
– inesperadamente. chega uma nova vaga
de afetos tecnológicos:
--qu(i) saudade tinha de ouvir você. legal mesmo
verdade. verdade mesmo. digo eu
que já o sentia sem celular – este “legal” que pode ser também bestial. brutal ou
boçal se as palavras não afagassem – ainda agora vi um golfinho a saltar para
dentro de uma cratera lunar e um homem verde a ficar cor-de-rosa. talvez azul.
cor do mar que separa a idealidade da nossa escrita – estou certo que um dia
este mar será o nosso “mare nostrum” – mergulham as palavras que escrevo no
avental de quem me quer bem. procuram conforto. proteção. talvez um comentário
carinhoso escrito em verso livre. ou um like de polegar virado para o céu – são
rosas senhora. são rosas. e no regaço a mágoa de quem não sabe escrever a raiva
dos continentes cercados de água por todos os lados menos pela escrita – são rosas
com espinhos. ou são espinhos com rosas – a lua presa a um mar que teima em
dividir o que as palavras querem unir numa nova estrada metafórica – as mãos pedem
cada vez mais acerto. ritmo e harmonia na escolha das palavras que atapetam
oceanos em cores de amizade – há flores que teimam em nascer nesta encruzilhada
de mãos amarradas aos pés – é afinal esta coisa de escrever que me faz pintar
um quadro para ti: traço acanhado. suave. harmonioso. silencioso. pacato e a decair
para o tom verde-esperança. o mar sem ondas. parado entre marés onde o futuro é
ilegível e se pode ver um golfinho sentado na orla crescente da nossa lua sorrindo
à beleza de um pensamento cristalino – a lua que canta fado no beiral da minha
janela é a mesma que dança samba na avenida do marquês de sapucaí – é a tela
que tenho para te oferecer minha amiga. uma tela feita do meu mundo. do meu
sentir. do meu eu por inteiro onde a água engole as palavras de um mar ainda insuperável
– sobrevive esta pequena luz de palavras em confronto com uma triste nostalgia
de quem espera pelo tocar das vozes – só as sombras sabem o que existe do outro
lado escuro da lua – um dia derrubarei com palavras que ainda não escrevi todas
as sombras do mundo e a água será para sempre engolida pela terra –
escreveremos então um novo poema a duas mãos – [também] somos o que fazemos com
as palavras
o celular. na minha terra. telemóvel. coisa da era
dos homens do futuro e com o número 00 351 XXXXXXXXX - esta é a minha ligação
ao satélite que liga o continente europeu com aquele que suporta o brasil -
deste lado um homem vai responder - sim. quem fala? e do outro lado do celular
a voz. a voz caçadora de emoções. vânia. ui meu qu(i)rido. qu(i) bom falar com
você - e o mundo sempre a girar. e o eixo que suporta os nossos pés a dizer: a
lua está cada vez mais perto do mar. ainda agora vi um golfinho a saltar para
dentro de uma cratera e um homem verde a ficar cor-de-rosa. talvez vermelho.
talvez azul. cor do mar que separa a terra que mergulha nas palavras que
escrevo - são rosas senhora. são rosas. e no regaço a dor de nunca escrever a
ira do coração. são rosas com espinhos. são espinhos com rosas - e a lua à distância
de uma mão e o A.E.I.O.U. a pedir outras letras um V. um n e as flores a nascer
nesta encruzilhada de mãos amarradas aos pés - é afinal esta coisa de escrever
que me faz pintar um quadro para ti. traço pequeno. irrequieto. em tons verdes
e o mar sem ondas. parado entre marés. e o golfinho sentado ao tempo de um
pensamento - é tela. senhora. é uma tela senhora dos mundos pincelados de
brilho. contrastes de luz que só as sombras compreendem
30/08/2014
agustina bessa-luís
28/08/2014
27/08/2014
interrogações: entre a reflexão e o desespero
bígamas.
colhem no seu leito a reflexão e o desespero.
25/08/2014
quadras ao despiciendo
18/08/2014
12/08/2014
macho man poético
11/08/2014
28 – aceito. até que o caminho se gaste
o caminho nem parecia ser longo – caminhei
tantas vezes sem saber que caminhar era só falar. e de cada vez que falava.
mais caminho se abria – falava muito. no início sozinho. convencido que ninguém
me queria ouvir – depois. descobri que é muito melhor falar para quem realmente
escuta – dei então a mão e falei – falei. por cada dia de caminho. gastei o
dobro em palavras. e de tanto falar. deixei de olhar para o caminho – descobri
que falar era o segredo para tornar o caminho partilhado. o tempo foi passando
sem que me desse conta do caminho feito – quando se começa a falar. é quase
impossível voltar ao silêncio. as palavras guardadas na privacidade do corpo emergem
aflitas. como se precisassem de respirar. de luz. de companhia. ou simplesmente
de existir – falo. falo porque as mãos nunca me impediram de tapar a boca. os
lábios enchem-se de um vermelho de alegria e esperança. enquanto os olhos alargam
o sorriso ao corpo por inteiro – e assim. fico mais jovem. quase gaiato. adolescente.
namoradeiro – falar é bom. falar é companheirismo. é cumplicidade. é amizade – falo.
falo sem parar. falo com o corpo. com as mãos. com o toque. com os olhos. e no
intervalo das pernas. o tempo a escapar com verdade. com lealdade. com saudade.
com estima – no caminho que fizemos falei. sempre muito. sem parar. falei o que
era só meu. nunca pensei abdicar do meu silêncio íntimo. mas sacrifiquei – nunca
mais te perdi a mão – sou assim. quase nada sem ti. e quase tudo por te ter ao
meu lado – acredito que estas palavras não serão as últimas que te escrevo. bem
que poderiam ser. sempre quis partir a sorrir. mas ainda não chegou o tempo-adeus
– sinto. sinto que ainda tenho ainda tantas coisas para te dizer. coisas que só
tu és capaz de compreender. sei – falo-te. falo-te com estas palavras que
escrevo. escrevo-as por ti. contigo. a vida faz sentido em ti – no timbre da
voz o fervor lê-se em desejo: quero-te agora e para sempre – estamos a falar há
tantos anos – são tantos os relógios a marcar tempo. tantas palavras-momentos.
palavras-data. palavras-mel. algodão. algodão-doce
a derreter no recanto dos teus lábios e eu sempre a falar-te mais. sempre mais.
falar do destino que escolhi – não
merecias tão pouco do destino – para trás ficou tanta coisa nossa. tantas lutas. renúncias. coragem. apreensões. ilusões.
e tu a dizer que tudo irá dar certo e eu sempre a prometer um mundo azul só
para ti – nem sempre temos o mundo da cor que idealizamos – acredito que aquela
nuvem além. um dia. silenciosamente. chegará ao pé do que somos hoje – somos agora
tão diferentes – talvez comece então a chover e as palavras comecem a cair dos
olhos. e nós sem saber o que fazer para as parar – os corpos embranquecem. já não
entendem o desencanto das palavras. teimam em cair quando as árvores continuam
a florir pássaros-em-primavera – não sei. companheira. não sei nada de pássaros.
acredita que não sei. juro-te que não tenho culpa de não saber – gostava de
saber tudo de pássaros e primaveras. gostava muito. por mim e por ti.
principalmente por ti. mas não fui competente para saber – talvez temam esta minha
forma de falar ou tenham visto algo que eu nunca vi – os pássaros não têm
estradas. seguem apenas o que os sonhos lhes ditam – mas. companheira. eu
também estou onde quero estar: quero estar ao pé de ti. – tu és a árvore onde descanso.
onde conto alvoradas. talvez até gaivotas. tu sabes que amo gaivotas. gaivota é
liberdade. mar. paz. esperança. verdade. vento. é o teu nome. e tu és tudo o
que preciso para continuar a teimar a vida – vivo para te falar. vivo para
nunca te largar as mãos – falo-te. falo-te sem parar. não sei dizer amo-te numa
única palavra – gosto dos teus abraços. dos teus beijos. dos teus gestos. do
teu cheiro. dos teus olhos quando encontram os meus. gosto do teu cabelo quando
o enrodilho nos dedos. gosto de me deitar no teu colo e ouvir o mar a chamar o
vento norte enquanto as gaivotas gritam o teu nome a sul – é por lá que o sol
se esconde de todas as injustiças do amor – já não falta muito para que a noite
se abeire com tudo que é arrependimento. pesarosa. negra. sombria. escura. só
não a quero muito negra. não suportaria deixar de te ver. preciso – enquanto
viveres nos meus olhos sou imortal – o tempo passa e não me canso de te falar. como
se fosse a primeira vez – nunca esquecerei a nossa primeira vez. nunca. jamais.
para sempre – tudo agora faz sentido – para trás não olho. não quero. ainda
ouço as palavras que nos trouxeram até aqui: aceito.
sim aceito. até que o caminho se gaste – parece que ainda foi ontem. e já lá
vão vinte e oito anos – guardo-te no coração
10/08/2014
antónio lobo antunes – livro de crónicas o campeão
o campeão
"...o merceeiro ao somar-lhe as compras em voz alta com um resto de lápis anunciava respeitosamente
- Quatro e cinco nove e três doze e vai um, mas com é para Vossa Excelência vão dois, dois e sete nove e nove dezoito e sete vinte e cinco e vão dois, mas como é para Vossa Excelência vão três
e a avó Gui pagava com orgulhosa pompa o peso da sua importância. ... "
07/08/2014
parce sepultis
também se faz luto em vida – mergulhado em chuva e papéis. projeto o futuro – avalio-me – é essencial escrever o que não consigo explicar. a margem de erro é um desvio na compreensão – quem lê procura conhecimento ou prazer – não sou uma coisa nem outra. sou amargura. desgosto. maçada. tristeza. erro. apenas erro. onde a prova dos nove dá sempre um resto qualquer coisa – transcrevo para o papel uma visão antes de a ver. premonição – só assim poderei dar-me ao respeito. antecipando-me – somo-me então a um resultado incerto. numa balança aferida a olhos visionários [e magoados também] – ninguém pode garantir o incerto. sempre ouvi dizer que o futuro a deus pertence – se eu tivesse um deus. a alma não temeria nem gemeria – o contrapeso é a alma perdoada de todo o erro venial – onde há balança. há peso – todos carregamos um fardo indesejado. mortal – o descanso eterno acontece após a missa de sétimo dia – o peso é agora uma memória presa entre duas datas: aqui descansa [finalmente] sicrano. pecador. nasceu a tantos do tanto de mil novecentos e tantos. e morreu a tantos do tanto de dois mil e tantos – que a sua alma descanse em paz
*
parce sepultis – enterrado. perdoado
05/08/2014
vinicius de moraes - soneto de aniversário
04/08/2014
01/08/2014
retalhos – número de série 01082014s(r)ego21
noites de verão são também:
a imersão do sossego embalado nesse movimento quase não-movimento da praia-mar