29/09/2025

6. eu no boom – sei que vou voltar

 





e assim continuaram os dias. o boom é exatamente como as grandes metrópoles. noite e dia as pessoas revezam-se. umas dormem. outras seguram os astros sob o sol – quando escurece há nova romaria. chegam os festeiros com energia renovada. acendem estrelas e cometas. a lua incha de luz e a música corre pela imaginação de todos. os corações batem ao ritmo de cada vida. alegre ou melancólica – quando cansados os corpos estendem-se pela relva enquanto as almas continuam a saltar nas tendas: trance psicadélica. música eletrónica. até música dos anos sessenta. um espaço em forma de ovo. onde a única entrada é feita curvado. de gatas. entra-se e encontra-se um espaço com uma bola de cristal no teto – batida de discoteca. completamente insonorizada do exterior. e a surpresa é que quando te consegues endireitar dás contigo no meio de trinta ou quarenta pessoas num outro ritmo. outro mundo. que tu jamais esperavas encontrar ali – mas que em jovem conheceste e habitaste – o boom foi uma experiência transformadora. num espaço onde a liberdade  reúne as pessoas. toda a expressão é individual. e quando ligadas cria uma conexão humana incapaz de ser descrita. direi que se cria um núcleo de gente muito diversa. mas toda se sente una. livre. sem julgamentos – há pessoas de todo o mundo. e isso cria um movimento heterogéneo de culturas em partilha – música. arte. ligação à terra. à natureza. bem-estar. vive-se um estilo de vida minimalista. que bem aproveitado mostra que o mundo está inundado de coisas supérfluas. abrindo espaço à renovação interior. à limpeza da alma e do corpo. permitindo à mente descobrir novos eus. e expandir-se para lá do que a circunda – estar no boom significa também fazer parte de uma nova geração que se preocupa com os valores ecológicos. se entras no boom sem essa consciência. à saída já sentes que fazes parte dessa comunidade – sei que vou voltar. não por nostalgia. mas porque há lugares que se tornam espelho – e no boom vi o reflexo do que quero que continue a acontecer na minha vida: reconheci-me livre. inteiro e vivo – o boom não termina quando as luzes se apagam. fica em cada batimento. como já escrevi. senti e vivi. basta fechar os olhos. e nos meus silêncios. posso sempre preenchê-los com as suas batidas – estas batidas nunca se calam. e a água continua a ondular – por isso sei que vou voltar – há viagens que não se encerram. apenas recomeçam – voltar ao boom é voltar a uma aldeia sem fronteiras. o que faz de mim um homem também sem fronteiras. sem medo. sem guerras. e sem fome. onde cada rosto é diferente. mas todos se sentem parte da mesma tribo – eu encontrei esse mundo aberto – por isso sei que vou voltar


26/09/2025

5. eu no boom - 2ºdia

 




 

a felicidade é o presente. não é o regresso ao passado nem fuga para o futuro – não está num interruptor nem numa cartola mágica. pelo contrário. é superação das dificuldades. dos traumas. das noites sem dormir. dos objetivos cumpridos. e dos que ficaram por cumprir. dos amigos que perdemos. dos que chegaram. a felicidade é perda. mas também caminho – e é no caminho empedrado que muitas vezes nos encontramos despidos de ilusões – nesse instante deixamos cair as camadas que nos escondem – e sentimos o alívio de reconhecer quem somos – precisamos de soltar essas camadas. para que se dissolva a matéria que nos prende à forma – a felicidade acontece apenas porque caminhamos. porque tivemos coragem para procurar. às vezes não sabemos o que. como um tabuleiro de xadrez que pode ter todas as peças. mas se faltar um peão… já não há jogo –  o dia de hoje é o mais importante da nossa vida. porque fomos capazes de refazer o que somos quando o mais fácil era desistir – a sociedade exige muito de nós. é preciso fabricar homens de um sucesso global. para que possamos ser aceites: carro. casa. relógios. doutoramentos sem conhecimento. a lista seria interminável – levantar e caminhar é felicidade. isso é a única verdade. depois. estar onde queremos estar. respirar a divindade que entra em nós. e partilhar do vento que mantém as gaivotas no ar: liberdade – é obrigatório dar-nos ao agora. no boom não podemos estar noutro lugar – ali sentimos a consciência a saltar connosco. estamos todos interligados. um emaranhado de cordas. e essa interligação. talvez cósmica. faz de nós um pouco de cada ser. ligados pela consciência. vibrantes e cintilantes. e o planeta que se chama terra. um mero condutor. a esticar-nos pela gravidade. e pelo sim. sim. é esta gente o dínamo da terra – ligados por essa energia comum. percebemos que o mesmo magnetismo que nos une também nos desafia – a física diz que polos iguais repelem-se. mas nós ligámo-nos. existe dentro de nós uma porta que se abre ao desconhecido. ou é a própria energia do planeta que a abre. e as suas pessoas empurram-nos porta fora – mesmo que não compreendamos o mundo físico. é a nossa consciência. com os seus mecanismos ainda desconhecidos. que nos diz: este é o teu momento. despe-te de preconceito e vai. liberta o teu espírito. cumpre-te pelo chamamento. edifica-te nos desaires. liberta-te dos sucessos. recupera a estrada que deixaste marcada – dostoievski dizia: torna-te consciente de ti mesmo. mesmo que tenhas de enfrentar a tua verdade interior. mesmo que sofras – eu acredito que o gerador da felicidade é a dor. a desilusão. a perda. o medo. o fracasso. o trauma. a dúvida. o terror de não podermos voltar atrás e emendar o erro. é também a decisão de percorrer caminho. do movimento. e tal como um astro rodamos. e criamos o nosso próprio campo magnético. atraímos o que em nossa volta roda. num outro campo magnético. e sem que o corpo saiba trazemos para dentro de nós a consciência de alguém. a sua vontade de nos inundar com o que é seu – e quando superamos essas debilidades. somos felizes – bem sei que por pouco tempo. os desaires ficam para toda a vida. a felicidade é efémera – porque será que a felicidade é passageira? porque enquanto os desaires se contraem no corpo. e a nossa capacidade de armazenamento é quase ilimitada. a felicidade expande-se. não a conseguimos reter. esvai-se. como água com consciência – o corpo serve apenas para nos diferenciar uns dos outros. as pernas para saberem que chegamos. os braços para saberem que abraçamos. os olhos para saberem que reconhecemos. e a boca para gritar ao universo que nos devolva a luz – e vamos à procura de mais felicidade. e depois ainda mais. precisamos dela para sobreviver. e quando não a encontramos. na maior parte das vezes por nossa culpa. o trabalho cega-nos. as distrações dos amigos. a família consome-nos. e sem dar conta estamos perdidos no tempo. não do universo. esse não se perde. está em nós desde o nosso primeiro dia. mas de nós. passamos a ser o que na verdade não somos. vestimos a armadura de aço e resistimos. morremos de olhos abertos – e a felicidade logo ali. tão perto. tão simples. tudo se resolve com uma equação de três simples: despoja-te. liberta o peso. entrega-te ao desconhecido. acredita no invisível. entrega-te a ti. e vive inteiro – foi assim que cheguei ao boom – a minha consciência fundiu-se com outra. e com mais cem mil que tiveram o mesmo desejo que eu: ter uma nova experiência de vida. iluminar-me por conta dos seus astros. da estrela a que cada um pertence – com a minha idade pensei: vais sofrer. aquela malta vai-te trucidar – mas não. fui eu que me trucidei. abri a porta e as cordas partiram em debandada. interligaram-se. teletransportei-me para cada uma daquelas consciências. e todas. me entregaram o melhor de si – tornei-me o núcleo do universo. porque só quando somos muitos temos força suficiente para nos tornamos um núcleo. ligamo-nos como se juntam os átomos. talvez da água. e balançamos – depois subimos como bolinhas de sabão ao universo… e por ali ficamos. a ver-nos como somos. e na verdade. somos muito menos do que uma bolinha de sabão. inexplicavelmente perdida entre estrelas sem nome – e talvez bóreas. sentado numa galáxia distante. tenha percebido. quanto pode ser importante uma pequenina bolinha de sabão. e levantou um ventinho fininho. que me levou para o infinito de mim. e percebi que ainda hoje não sei onde termino. sou muito mais do que pensava. e muito menos do que uma bolinha de sabão – tirou-me a pele. e senti o frio de viver livre. dancei como os meus ancestrais dançavam. e tornei-me no peão que faltava no tabuleiro de xadrez. e o jogo começou. e compreendi que sem mim. sem peão. não haveria boom. mesmo invisível as cordas deram-me forma. tornei-me espírito. e saí do meu corpo sem medo de não voltar – isto é liberdade. isto é consciência. isto é dar a mão ao mundo. e tal como paulo de carvalho. cantor português. fiz uma fogueira dentro de mim. e dancei numa consciência coletiva – e fiquei com a certeza de que pelo menos uma estrela daquele céu era minha – eu estava no único lugar onde poderia estar e com as pessoas que deveria estar. a minha conexão era total. percorri mil vezes cada uma daquelas pessoas. e todas me visitaram mais de mil vezes. dei e recebi. e nenhuma teoria física seria capaz de resolver esta equação. só a consciência tem a fórmula – neste segundo dia vagueei pelo espaço – era tudo tão novo – às vezes parecia que durante o sono as fadas tinham mudado tudo. as pessoas tão diferentes e tão iguais. famílias com crianças. pais jovens. amigos em bando. solitários. velhos que pareciam novos. namorados apaixonados. todos a girar. como se fossem planetas. talvez caminhassem por si. ou pelo chamamento da consciência. talvez coletivo. ninguém levava mapas. não havia guias no chão. nem setas: olha ali uma tenda gigante. uma escultura. uma árvore. estas formas simbólicas. relembrando uma conexão profunda com o sagrado e o ritual. luminosas. às vezes abstratas. mas tão parecidas comigo. identificámo-nos com tudo. porque tudo é o que somos – para onde quer que se olhe os olhos giram. a consciência gira. e as luzes a cores pintam a nossa tela interior: era como se dissesse em silêncio: não me levem daqui. quero aqui ficar para sempre – a massa do corpo não altera com o lugar. mas aqui eu não me peso. a alma não pesa. a consciência não pesa. vive. sonha. ri. sossega. é feliz. sem dores e sem medo. afinal. talvez sejamos imortais. talvez só a carne apodreça. apenas viajamos. talvez o tempo seja relativo. talvez só aqui todos nós estejamos certos com o que somos – e assim andei. até deparar com uma projeção de imagens em vapor de água – no lago um repuxo enorme lançava água a dezenas de metros de altura. que no seu processo descendente. já em gotículas pequeníssimas. recebia a projeção de frames de várias imagens. que com a gravidade se deformavam aos poucos. até desaparecerem no espaço dos olhos. enquanto outra imagem se sobrepunha. e assim sucessivamente – sentei-me na relva com a minha maria joão. os meus amigos e desconhecidos – todos absorvidos. todos sugados para dentro da viagem animada de um preto e branco nostálgico – silêncio absoluto – apenas a água e a música de fundo – estávamos suspensos. entre vida e silêncio – deixei-me embalar pela magnificência daquele cinema em tela de água. e quando dei por mim chorava copiosamente. não sei quanto tempo chorei. sei que foi o suficiente para voltar ao passado e encerrar um momento da minha vida que sempre imaginei estar fechado – este é o único retalho da minha vida que partilho aqui. haveria muitos. mas cada um deve viver as suas viagens em solidão. ou então encontrar as pessoas certas para partilhar – há vinte e sete anos o meu pai faleceu. e a minha família. como uma outra qualquer. estava em pranto absoluto. devastados. eu era o mais novo. mas velho o suficiente para ser forte. tinha trinta e oito anos – eu sabia que era o mais resistente. quando somos novos pensamos ser sempre o que em verdade não somos – não deitei uma lágrima à frente da minha mãe. irmãos. esposa. e filhos – foram três dias de superação interior – pela noite. descia para a rua e entrava no carro. punha a cassete a tocar. charlie haden & pat metheny – spiritual. e chorava copiosamente. berrava até que os ouvidos serem só ruído. a dor era tão forte que dilacerava-me o corpo. a alma em pasta. retorcida. e assim estava horas aos murros ao volante. a insultar deus e o universo de tudo o que pudesse magoar. a água escorria-me dos olhos – corpo ensopado de mim – de raiva. de ira. de revolta e jurava nunca mais lhes perdoar – pois bem. naquele espaço mágico chorei as mesmas lágrimas. senti as mesmas dores. exatamente a mesma dor. a mesma raiva. tudo era tão real. tão daquele dia. o corpo sentiu a mesma vontade de morrer. de destruir o mundo. o mesmo sentimento de perda. o meu pai ali deitado. e eu de pé. sem que a dor pudesse mexer em mim um músculo. uma lágrima – quando acabei tinha enterrado definitivamente o meu pai. tinha cicatrizado uma ferida que não sabia que estava aberta. por fim. depois de tanto tempo. fiz as pazes desse dia – quando me levantei disse aos meus amigos que tinha que me recolher. estava cansado. estava completamente vazio. oco. não sentia nem o corpo. nem a mente. mas senti paz. senti que estava no meio do universo. sem peso. sem nada a reclamar de mim e do mundo – se tinha dúvidas foram todas dissipadas. se não fosse por mais nada a minha ida ao boom tinha sido recompensado com algo que nunca imaginei que fosse possível – fiz as pazes desse dia – é preciso acreditar na evolução do mundo. das pessoas. e da sua consciência – é preciso compreender a física – há cem anos a física explicava menos do que hoje. se não acreditarmos. só nos resta a teologia – foi isso que a física quântica nos trouxe. a oportunidade de trazer para dentro de si a consciência – nós somos alma. energia revestida por um corpo – estamos emaranhados num universo de energia – assim podemos sentir-nos ao mesmo tempo em vários lugares. dentro ou fora do corpo. as batidas marcam o ritmo das viagens. e os lugares ligam-se pela velocidade das vibrações – podemos viajar por vários lugares ao mesmo tempo. mas no boom aprendi a ficar onde estava feliz. se viajei. isso foi apenas porque as forças do universo me levaram. cintilante fiz-me estrela. iluminei os que comigo preferiram ficar ali. e todos nos ligamos ao universo por cordas que vibram em nós – e assim fechei mais um dia no boom – e abri mais uma estrada em mim – envelhecer tem a sua vantagem. o corpo mirra. mas a mente já não me trai – voa em viagens de reconhecimento. para um dia saber. qual a estrela que me pertence desde o nascimento

 


22/09/2025

4. eu no boom – 1ª dia

 





pois bem. depois de cerca de trezentos quilómetros de caravana e de muitas horas de expectativa para entrar na quinta da herdade – uma noite de espera e parte do dia – lá chegamos – eu. maria joão. minha companheira há quarenta e quatro anos. os amigos luís e mariana ainda a começar a contar os anos de ligação.  e maddy. minha amiga há quase vinte anos – uma vistoria rápida na entrada para garantir que cumpríamos as regras. zero tolerância para vidro. álcool e drogas. e lá nos indicaram o local onde estacionar. no topo do monte que protege a norte o espaço do boom – já era noite. e à nossa volta apenas eucaliptos. pó e o desconhecido pela frente – de noite todos os gatos são pardos – uma refeição rápida. um banho e toca a descer para a festa. a expectativa era imensa. perder a primeira noite não era opção – lá fomos. e seguimos a regra de quem viaja sem mapa. seguir quem já caminha com sentido – uma descida íngreme de quase dois quilómetros. e a meio já se ouviam as batidas. e ao longe uma constelação de luzes mágicas – com a aproximação ao recinto começamos a sentir a grandeza do espaço – o primeiro olhar colado ao rosto – o espanto na alma – a intuição instantânea de que ia ser feliz – confesso. a minha escrita não alcança. não chega. não toca o que me foi oferecido. era muita luz a invadir-me os sentidos. com cores e projeções que nunca tinha imaginado – diria que é a disney dos adultos –  era luz. era música. era cor. era tudo a acontecer de uma só vez – era tudo a acontecer em mim – para ser verdadeiramente feliz basta perder o preconceito e lançarmo-nos sem medo para cada apelo da alma – e havia muitos apelos. o problema era saber para onde olhar e caminhar – pela primeira vez senti-me verdadeiramente livre. ligado às pessoas. ligado à natureza. ligado às galáxias. fazia parte de um organismo uno que me recebia inteiro no ser. como se renascesse ali naquele instante – o corpo e a mente deixaram de magoar. e partimos à deriva para cada bolha artística. um oceano de luz. um oceano de música. um oceano de vibração. um oceano de vida. um oceano sem fim. ligado às pessoas. ligado à natureza. ligado às galáxias. ligado a tudo. e eu a navegar à bolina – preso e solto ao mesmo tempo – como se o ar fosse água. como se eu já não tivesse corpo. como se fosse apenas alma. apenas vibração – e as ninfas do lago em chamamentos para sair de onde estava. porque o outro lugar chamava mais forte – senti-me mágico. também eu tinha mordido a maçã do encantamento – a questão era quanto tempo ia durar o efeito – para minha surpresa dura. dura até hoje – revisitar o boom é apenas necessário fechar os olhos – em cada esquina um misto de estruturas iluminadas. algumas do tamanho do adamastor. talvez maiores – nenhuma cabia inteira na cabeça. nenhuma cabia inteira no peito. olhar para uma parte era deixar outra de fora – e eu a mergulhar nas luzes de cada escultura. algumas abstratas. cintilantes. que nos lançavam para o espaço sem nunca tirar os pés do sagrado – figuras antropomórficas que nos prendiam. nos sacudiam de todas as maldades do mundo – e em cada passo a sensação de já não caminhar. mas voar preso a cada feixe de luz – talvez peter pan. talvez um duende – uma alma transfigurada por um sentimento de felicidade que nunca tinha conhecido – e ainda hoje vibra – de seguida entramos nas tendas gigantes. eram três. separadas por um manto sagrado. apesar dos decibéis. nenhuma batida fugia para outra tenda. como se houvesse um muro invisível. uma mão que separasse as notas de música. e dentro delas milhares de jovens e não jovens a baloiçar os corpos. iguais aos de beach party by nova era. o corpo para um lado. e o cardume inteiro em movimento. todos em transe. e a cada batida uma perna para a frente. logo outra para trás. ninguém sai do sítio. e todos caminham pela imensidão do espaço sideral – e eu ali. a caminhar com eles. primeiro a medo. depois já no cardume. deixei-me apanhar pela música. deixei que ela me levasse para onde o meu espírito se encontrasse com o que sou verdadeiramente. sem medo. sem preconceitos. nunca deixei de ser quem sou. mas passei a ser mais. mais do que sabia. mais do que pensava. mais do que sonhava ser. e completei-me. trouxe dos outros o que pude. e em vez de me sentir cheio. senti-me vazio do que pensava ser essencial. e passei eu mesmo a ser um ser tribal. feito de batidas e sentimentos que desconhecia – as gavetas abriram-se. as janelas abriram-se. as portas abriram-se. tudo se abriu. eu também me abri. e fiquei apenas água. a ondular. a amar tudo o que me rodeava. e a certeza mais uma vez de que havia escolhido a mulher certa para a vida – estávamos felizes. estávamos os dois livres. e livres. nunca nos conseguimos separar. voamos para o luar. iluminamos o caminho que escolhemos. e brilhamos como dois pirilampos. como duas centelhas no escuro. como dois sóis a nascer – beijamo-nos como adolescentes. e dissemos: os nossos filhos deveriam um dia experimentar esta liberdade – por fim. cansados. já depois das cinco da manhã partimos à procura do descanso. subimos em direção ao céu. e dormimos como anjos – tínhamos a certeza de que tínhamos feito a opção certa. estar no boom fez-nos bem. aproximou-nos. e fez-nos recordar o que de melhor trouxe a nossa união: os filhos. nossos deuses. nossa glória. nossa virtude. nossa eternidade. nossa razão de ser. nosso infinito. nosso além-túmulo dentro de nós



20/09/2025

3. o que é o festival boom

 




esta terceira parte será preenchida com uma das maiores experiências da minha vida. o festival boom. bienal. em idanha-a-nova. herdade da granja – não será fácil descrever esta minha participação no boom. para ser honesto nem sei bem por onde começar. mas vou com coragem. vou com tudo – o que é o boom? bem. o boom é muito mais do que música. arte e cultura: é uma experiência internacional. um evento de carácter único e transformador. celebrado como um dos maiores e mais originais da europa – centrado na trance psicadélica goa. acabou por evoluir para um festival multidisciplinar que abraça música eletrónica. artes visuais. performances. workshops. conferências. cinema. manifestações culturais diversas. meditação e práticas espirituais. oferecendo uma experiência holística e sensorial – a organização do boom não aceita patrocínios. talvez por isso seja tão pouco divulgado nos nossos canais de informação – todos sabemos que as companhias de telecomunicações. todas juntas. faturaram no último verão mais de sessenta milhões de euros. estamos a falar de um negócio muito lucrativo. e obviamente. com o seu ramo poderosíssimo junto das estações de TV. tudo fazem para não ser divulgado. e quando é. acaba quase sempre por ser por motivos pouco nobres – o boom promove a consciência ambiental. a sustentabilidade. a multiculturalidade. a espiritualidade. a liberdade. e a diversidade artística – eu. no meu trabalho estou ligado ao ambiente. e sinceramente. fiquei muito satisfeito com o seu compromisso ecológico: energia solar. energia eólica. sanitas ecológicas. reciclagem. tratamento de águas. tudo está pensado em favor da natureza – o boom reuniu participantes de 220 países. sendo os festivaleiros estrangeiros a grande maioria. cerca de 85%. com diferentes faixas etárias. famílias. crianças. todos em harmonia. como se o tempo nestes oito dias parasse de existir – junta mais de cem mil pessoas. os bilhetes esgotam rapidamente. mas podia ter o dobro ou o triplo de participantes. não o permitem apenas porque. no seu entender. o espaço. 225 hectares de terra deserta. apenas ocupada pela natureza. seria seriamente afetada pelo excesso de gente – pode chegar ao boom apenas com um cobertor. acampar. ou se preferir estar mais cómodo chegar de caravana. e não se preocupe com comida. há tendas com todo o tipo de pratos. de todas as partes do mundo. e se for vegan ou vegetariano. também encontra – se entender criar as suas próprias refeições. há também um supermercado para o ajudar e locais próprios para cozinhar – vidro e fogões de campismo a gás são proibidos – há um hospital de campanha. com primeiros socorros em permanência. médicos e enfermeiros vinte e quatro horas por dia. e uma tenda especial para testar drogas. a prioridade é a sua segurança. saber o que consome é fundamental para que a sua experiência seja uma boa recordação – o boom é um universo vivo de cultura e partilha. onde cada experiência abre caminhos de transformação interior. no qual os laços humanos se entrelaçam e a terra é celebrada com consciência – o boom acontece sempre no final de julho ou início de agosto. durante a lua cheia. com o luar a servir de holofote. junto a um lago refletido no deserto da beira baixa. a dar brilho aos corpos em transe. como se o céu descesse para dançar – os bilhetes geralmente são postos à venda no fim do ano que precede o festival. e a sugestão que deixo. é se quiser participar neste grande evento. incluído entre os dez melhores festivais do mundo. e considerado o melhor da europa. esteja atento. e corra. pode mesmo assim não chegar a tempo – o boom não é apenas um festival a que se vai. é um lugar dentro de nós a que se regressa sempre – mas por mais que se fale do boom. nada se compara a estar lá – e é isso que vou partilhar a seguir. mostrar-vos que o boom é uma arca de noé erguida sob a lua cheia. onde as pessoas se encontram consigo mesmas: para dançar. meditar e contemplar a diversidade do mundo e. por fim. para acolher cada uma dessas partes como sua. sem preconceito. sem temor. sem medo do amanhã e das suas diferenças

 


16/09/2025

2. – a preparação do corpo e da alma

 




há pouco mais de um ano. mais propriamente em 28 de junho de 2024. um amigo. luís silva. convidou-me para ir a um festival de música eletrónica. beach party by nova era. em leça da palmeira. na praia do aterro. a sua empresa hoteleira era um dos patrocinadores. e deste modo. tínhamos acesso aos lugares VIP – não era o meu tipo de música. muito longe disso. mas quando um amigo convida. é nossa obrigação dizer presente – uma coisa é certa. não o acompanhava pela música. mas sim pela companhia. ainda para mais sou avesso a multidões – em local privilegiado. pensava eu. em cima de um palanque com vista direta para DJs. e ali ficamos um pouco a beber uma cerveja – algo de que também não morro de amores – sem perceber muito bem a ligação daquela juventude. ligada a ritmos sincronizados das batidas. entreguei-me em consciência – e interroguei-me. o que faz esta malta vibrar com estes graves barulhentos? de um momento para o outro. o meu amigo sugere que fossemos para o meio dos festivaleiros. e assim fizemos. descemos as escadas. o medo também. e misturámo-nos na multidão – eu nas massas sinto-me sempre despido. prensado. e fico sem saber o que fazer comigo – ao princípio estranhei. depois entranhei. estava preocupado com a minha presença. pensei: vou desarrumar esta malta. todos tão jovens. e eu. sénior. ali metido no meio deles – aos poucos fui-me sentido mais tranquilo. e comecei a dar a minha atenção à música. mais especialmente ao movimento dos jovens. aos seus comportamentos. à forma como se agitavam. particularmente tentar perceber se os seus movimentos estavam ligados de alguma forma ao ritmo das batidas – ali fiquei em busca da razão destes juvenis. deixei cair o preconceito e pensei: se esta massa humana está toda a vibrar e são milhares. tem que haver uma razão sólida e válida para esta agitação. e  para que mundialmente haja cada vez mais adeptos deste tipo de música. não pode ser apenas a juventude a influenciar este movimento – e no meio daquelas batidas loucas. com as luzes psicadélicas a fermentarem a minha íris. como se os olhos fossem depósitos de cores em agitação. senti os graves. ligados entre si por uma cadência ritmada. envolvente. ao ponto de criar uma ondulação. também ela com ritmo. dentro do corpo. que como todos sabem é setenta e cinco por cento água – ao fim de algum tempo percebi que os festivaleiros moviam-se todos eles de uma forma sincronizada. quando tombavam para a direita. todos tombavam. se atiravam o corpo para a esquerda. mais uma vez todos tombavam para esquerda. e a cabeça em oposição sempre a contrariar o corpo. como se quisessem deixar os pensamentos fora do desequilíbrio. talvez o que tivessem em mente não pudesse ser abanado. talvez tivessem medo de perder a felicidade. talvez com medo de voltarem para as azafamas do mundo – ser jovem nem sempre é fácil – no meu tempo era mais fácil – ao fim de algum tempo criei uma analogia. eram cardumes invisíveis. ondas de carne e respiração em geometria perfeita. possivelmente para enganarem os predadores. moviam-se como se todos fizessem parte de um bailado de rudolf nureyev. talvez marguerite and armand criando um movimento sincronizado. belo. que no seu limite. criava ilusão de segurança. ou de fuga para um outro planeta – talvez estes jovens. com os seus movimentos ordenados. criem esse tipo cardume. todos fazem parte de um todo. um organismo uno celular. e assim capaz de se defenderem deste mundo desengonçado. um mundo onde todos somos desconhecidos uns dos outros – foi uma grande experiência. e durante muito tempo deixou-me a pensar: porque não fui eu capaz de entender esta malta radical? a resposta é simples. por preconceito. por ter envelhecido. e por achar que esta música era para os jovens. e que eu. adulto envelhecido. já não tinha direito a invadir o seu espaço – o que aprendi. e hoje sei o bem que me fez. é que música é música. tal como um livro é um livro. não podemos dizer que não se gosta sem pelo menos tentar compreendê-la. sem lhe dar uma oportunidade de nos ocupar – o mundo só é perfeito pela sua diversidade. de outra forma não haveria evolução. ainda estaríamos  a fazer fogo com duas pedras – este festival viria mais tarde a proporcionar-me um dos momentos mais fantásticos da vida – eu mereci-o. derrubei os meus próprios muros. e encontrei um novo mundo. encontrei a liberdade inteira. sem preconceito. a baloiçar o meu corpo de água – e por fim. estou grato ao meu amigo por me oferecer uma parte do seu conhecimento. da sua vida – é essa coragem que todos nós precisamos em algum momento da nossa existência. nada mais fantástico do que chegar por alguém que me conhece bem – é nesse transe de palavras que vou contar como a música me encontrou. e como me levou ao boom. festival em idanha-a-nova


13/09/2025

eu no festival boom – antes de leres. sente

 




nota introdutória

 

nos próximos dias vou partilhar convosco seis capítulos de um mesmo texto – eu no boom festival – não é apenas o relato de um evento de música – é a história de uma viagem interior – onde cada batida. cada encontro. cada silêncio. se transformaram numa das experiências mais marcantes da minha vida – escrevi para que se leia como quem ouve música – no ritmo das palavras. no compasso das pausas. no fluxo das emoções – espero que encontrem nestas páginas não só a descrição de um festival único. mas também ecos de liberdade. de pertença. e de descoberta – convido-vos a acompanhar esta aventura comigo – que a leitura vos seja tão intensa quanto foi a vivência – e que de algum modo vos inspire a procurar os vossos próprios caminhos de vibração e consciência 

 

 

1.   1. ler é sentir

não uso vírgulas – os pontos tomam-lhes o lugar e seguem o compasso do que escrevo – também não uso pontos finais – são os travessões que me servem de pausa – algumas mais longas outras mais breves. mas sempre abertas como o tempo – deixo ao leitor a liberdade do ritmo – é ele quem dita a cadência da leitura – como numa peça de música clássica onde as notas se soltam conforme a emoção de quem ouve – e de quem sente – escrevo para que me leiam como se ouvissem uma balada – se será triste ou luminosa não me diz respeito – a escolha é de quem lê – o meu papel é oferecer-lhe o caminho – um caminho feito de palavras que vibram. assim partiram de mim – não uso maiúsculas – essas guardo para os nobel e para os que precisam de gritar para serem ouvidos – prefiro o sussurro – o sussurro que entra pelos olhos e acorda a água que vive dentro de nós – escrevo para essa água. os 75% do nosso corpo. para que se mova e liberte serotonina. e devolva ao leitor aquilo que o corpo mais pede: bem-estar – também não separo os parágrafos. porque a vida não se separa em blocos – a vida é fluxo. contínuo – mesmo quando estamos parados ela avança. e o texto deve acompanhar esse fluxo – como um rio onde não se repete margem – apenas corrente – escrevo com essa corrente – ora mais prosa ora mais poesia – sem lhe dar nome – apenas som – a minha escrita nasce do mesmo lugar onde nasceu a música dos nossos ancestrais. quando ainda não havia letra nem palavra – só ritmo – só pancadas – só batimentos – uma música psicadélica-transe tribal – feita de pulsações constantes – de movimentos hipnóticos – de vibração que se ouve com o corpo antes da mente – é essa música que procuro recriar com as palavras – um transe silencioso que se lê – e que ecoa no interior de quem ousa escutá-lo – e porque tudo o que escrevo nasce do ritmo. todos os textos são acompanhados de áudio – é no som que se completa o que ofereço – por isso sugiro sempre que se ouça pelo menos uma criação – para que quem lê compreenda não só o que lê. mas o que sente – para que a nossa água ondule. vibre. e leve ao cérebro outra parte do invisível que vive connosco – para que entenda o gesto que lhe é dado. um gesto de escuta – um abraço invisível feito de palavras em vibração

 

 

06/09/2025

recomeço

 



ao fim de quarenta e um anos voltaremos a ser novamente dois. eu e maria joão – este sábado. o meu filho mais novo. joão antónio. vai desposar a minha nora sofia direito – será um dia perfeito para eles e para nós – nunca pensei. nem desejei que os filhos fossem pertença dos seus progenitores. sempre sonhei em filhos livres e independentes dos seus pais – a nossa tarefa essencial era dar-lhes condições para que. um dia. pudessem abandonar a casa sem medo do futuro – nunca. eu ou a mãe interferimos no seu percurso de vida – sempre o vimos como algo sagrado – o seu caminho foi e será sempre o que escolhem – a nossa interferência resumia-se apenas aos seus estudos – foi a única preocupação. terem um percurso de aprendizagem dedicado ao conhecimento. não lhes pedia estudo pela obrigação. mas conhecimento pela vida – porque o conhecimento já carrega dentro de si estudo. dedicação. e afirmação da sua personalidade – outro ponto em que nos focámos na sua educação. para além dos seus estudos. era prepará-los para também. um dia. serem pais – ser pai é a função que mais enobrece um homem – a felicidade não está em possuir. mas em libertar – assim foi com os meus três filhos. e também nós pusemos de parte a nossa vida para que nada lhes faltasse. vivemos a escolaridade deles com muito sacrifício. mas também com muito orgulho pelo que alcançaram – merecemos a nossa família. honrámo-la tanto quanto nos foi possível. e hoje. vivemos este último matrimónio com a sensação de dever cumprido – cedo percebi que o meu desígnio nesta minha passagem terrena era ser pai. adoro ser pai. e tenho a certeza de que será a minha única obra que permanecerá para além do túmulo – hoje já quase não os consigo recordá-los. primeiro como recém-nascidos. depois crianças e adolescentes – a memória controla-nos os desejos. e se o meu foi que eles nunca dependessem de nós. ela castigou-me. resumiu tudo a duas linhas. e o que guarda agora são os homens que criei: bons. honrados. trabalhadores. e para dois filhos. excelentes pais e maridos – assim se cumprirá com o joão antónio – durante este último ano fartei-me de brincar com o meu filho dizendo-lhe que já faltava pouco para sair de casa. ou para que finalmente voltássemos a ter sossego. paz – mas a verdade. é que é este casamento que mais me está a custar viver. não será fácil entrar em casa e saber que ninguém nos espera. que não haverá mais ninguém a fazer-nos companhia no descanso. ou mesmo poder chamar pelo seu nome e ouvir: dá-me cinco minutos – eu e a mãe estamos um pouco perdidos. agachados um no outro. sabendo agora que só nos teremos a nós os dois – bem sei que os filhos são para toda a vida. e os medos que aprendemos a silenciar. continuarão silenciados. mas presentes. estão encrostados na carne. saber que está tudo bem é e será sempre a nossa paz – por isso estamos felizes com a sua felicidade. pois apenas assim faz sentido. sem a sua felicidade. dos três filhos. a nossa vida não faria sentido – três irmãos que se adoram. respeitam as diferenças. amigos. cúmplices. com três noras que os completam. e tudo isto numa harmonia celestial. quando juntos a nossa casa parece um conto de fadas – construímos este lar com muito sacrifício. com muitas noites sem dormir. em terror e em lágrimas. que eu e a mãe segurámos um ao outro. mas se voltássemos atrás. se o mundo tivesse marcha-atrás. faríamos tudo na mesma. colocaríamos cada pedra no mesmo lugar – nós estaremos sempre aqui. no lugar onde os críamos. viveremos as suas alegrias. e pediremos ao universo que lhes dê tudo o que merecem – essa será a nossa maior recompensa – nós recomeçaremos de novo. viveremos agora um para outro. sabendo que as noites encontrarão silêncio mais cedo. e que as únicas falas serão as nossas – também não será difícil. os meus filhos sabem que amo a sua mãe. desde os seus quinze anos. eles não poderiam ter uma mãe mais bonita. que sempre foi a deusa encantada dos filhos e. agora. dos netos – não há forma de não gostarem da minha maria joão – mérito meu que soube escolher. talvez o meu maior feito – foi assim que começou a minha epopeia – o que peço ao meu filho é que ame a sua mulher até a exaustão. e que nos dias mais encobertos que nunca desista da sua companheira. que fale sem nunca se calar. que nunca durma uma única noite ofendido sem a perdoar. ou sem se perdoar. que adormeça de mão dada. e mesmo quando dormir. que lhe diga ao ouvido que é o amor da sua vida – o casamento é uma estrada. e só o casal a pode construir. colocar todos os dias uma pedra. pequena ou grande. mesmo sem sentir no momento que cresce. um dia. quando olhar para trás. não verá o princípio. mas saberá que é a sua estrada. e em cada pedra verá um ato de amor. de partilha. de comunhão. de companheirismo. e poderá também ele dizer. esta é a minha única obra. a que me honrará. a que permanecerá para além do túmulo – espero que o dia seja abençoado. sagrado. para sempre. nós somos homens de uma única mulher. assim foi com os vossos avós. assim foi com os vossos pais. e sei. que assim continuará – gostava muito que o avô e a avó estivessem presentes. quem sabe os desígnios do universo – de alguma forma estarão. levaremos dentro de nós o estandarte da família. que agora será apenas vosso

 

bênção

filho meu – hoje deixas a nossa casa para construir a tua – não partimos contigo mas caminhamos ao teu lado – o teu caminho é sagrado e só a ti e à tua companheira pertence – ser pai foi a minha maior obra – e agora a minha herança é ver-te marido – peço-te apenas que ames a tua mulher até à exaustão – que nunca te deites ofendido sem perdoar ou ser perdoado – que adormeças de mão dada – que mesmo dormindo lhe digas ao ouvido: és o amor da minha vida – o casamento é uma estrada – pedra a pedra se constrói – cada gesto pequeno é amor – cada partilha é comunhão – quando olhares para trás não verás o princípio – mas reconhecerás a vossa obra – e ela será eterna – somos homens de uma única mulher – assim foram os teus avós – assim fomos nós – assim serás tu – que o universo vos abençoe – hoje e sempre