.................................................................................não tirem o vento às gaivotas

27/06/2010

domingo










domingo. o dia está envergonhado. o sol não é sol. as nuvens não são nuvens. e o vento. não sendo vento incomoda o suficiente para me fazer retirar para espaços mais resguardados – no entanto. deixo a minha imaginação à cata dos ventos perdidos. plantei-a no meio de um campo que mais tarde será de milho. vesti-a de espantalho. tem uma boina que um dia encontrei num sem abrigo de ideias – dizia-se morto há muito tempo. para além do meu tempo dos relógios. já só se lembrava da palmada que levou no dia em que nasceu – guardei-lhe a boina. como quem guarda o saber impresso por dedos marginais. dedos que romperam as noites frias das palavras que nunca tiveram abrigo nos heróis das cidades frias – hoje. de casaco roto. virado do avesso. faz conjunto com umas calças aos quadrados azuis. cor dum céu que não é o meu – pareço-me bonito, sinto-me catalisador de todas as palavras daquele campo que para mim é o mundo – faltam-me apenas os sapatos. mas também sempre me faltaram. apenas me lembro de ter umas sapatilhas brancas. diziam-me que era para saltar por cima de palavras maldosas. mas nunca as encontrei. são todas tão bonitas. tão singelas. mesmo aquelas que me aleijam deixo-as ficar aqui num pedaço de um corpo que não é meu – agasalho-as aqui. num bolso de ideias boas. até partirem saradas de uma maldade que não mereceram – sem elas não teríamos a funda capaz de matar gigantes com palavras como: amo-te vida – sou espantalho. umas vezes feliz outras. viro-me para norte. é deste lado que ouço o comboio apitar. diz que vem chuva – é domingo. não enxergo. tenho nos olhos duas tâmaras pretas, trazidas por um árabe que vende cobras dançarinas – são lindas. negras. enormes. diamantes de árvore que alimenta todos aqueles que viajam amarrados às palavras em desertos de areia que nunca têm a mesma forma – as lágrimas são rios submersos de águas tresmalhadas pela cor da criação e que com o tempo se torna em amarelo terra – estas águas formam os oásis. libertação para um qualquer espantalho – ao ouvido. um corvo diz-me o que vê com olhos verdadeiros. teima em ver o que eu nunca consigo ver – reclamo pela verdade dos meus olhos. mas ele zomba de mim. diz-me que eu já estou cego há muito tempo.



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